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A chave para o sucesso na Líbia é manter as expectativas baixas

Anne Applebaum

25/03/2011 01h16

Eu não sei por que, exatamente, Barack Obama hesitou tanto para intervir na Líbia, ou por que ele tem se mostrado tão relutante a falar muito sobre a Líbia em público. Talvez, conforme dizem os seus críticos, isso se deva ao fato de ele não ser decidido, ou de ter uma relutância instintiva em usar o poder militar dos Estados Unidos. Talvez seja porque ele ache que duas guerras já são suficientes, e que em um momento de maciços cortes orçamentários nós não podemos suportar um terceiro – e opcional – conflito. Mas isso não importa: quando os aviões franceses e os mísseis norte-americanos começaram a bombardear a Líbia no sábado passado, a sua relutância e o seu silêncio transformaram-se subitamente na mais importante vantagem tática de Obama.


Caso você acredite em mim, imagine o cenário oposto. Imagine que o presidente Barack Obama tivesse passado as últimas semanas denunciando Muammar Gaddafi, usando a retórica altaneira à qual recorreu anteriormente. Imagine que ele tivesse comparado Gaddafi a Adolf Hitler – o que não seria uma impossibilidade, ao consideramos que os últimos presidentes norte-americanos compararam Saddam Hussein e Slobodan Milosevic a Hitler – ou que ele tivesse falado de maneira sombria a respeito da ameaça que o regime líbio representa para o mundo livre. Imagine que ele tivesse evocado a linguagem da constituição dos Estados Unidos e tivesse exigido também nada menos do que a democracia para a Líbia.

Se ele tivesse feito isso, certamente haveria menos membros europeus na atual “coalizão voluntária” que se formou, espontaneamente, para impedir que as forças de Gaddafi tomassem Benghazi. Eu não consigo enxergar os franceses ou os espanhóis apoiando uma campanha norte-americana estridentemente agressiva. Provavelmente não haveria também membros árabes na coalizão. De fato, quase que no momento exato em que os aviões norte-americanos surgiram nos céus do norte da África (e as fotografias dos estragos resultantes começaram a aparecer na Al Jazeera), a Liga Árabe anunciou que poderia retirar o seu apoio à zona de interdição aérea. De forma impressionante, o secretário-geral da organização pareceu ficar chocado ao saber que as operações de bombardeio aéreo provocaram mortes de civis. O entusiasmo e a retórica estridente teriam também feito com que os Estados Unidos e os seus aliados se vissem presos a uma série de promessa implícitas. Se tivéssemos comparado Gaddafi a Hitler, nós teríamos que eliminá-lo. Se a democracia fosse a única solução para a Líbia, nós teríamos que permanecer naquele país até que ele se tornasse democrático. Se o presidente Barack Obama não tivesse falado sobre outra coisa nas últimas três semanas, a sua presidência estaria agora correndo perigo. A retirada de apoio da Liga Árabe poderia, em tais circunstâncias, ser interpretada apenas como uma afronta pessoal a Obama.

Como o bombardeio da Líbia teve início, e a zona de interdição aérea está em vigor, não faz sentido agora defender ou atacar a intervenção. Nós interviemos, e, bem ou mal, seremos agora parcialmente responsáveis pelo resultado. E uma das formas de promovermos um melhor resultado é garantir que manteremos as nossas expectativas baixas.


De fato, podemos estar prestes a nos deparar com uma situação que um oficial militar dos Estados Unidos de alta patente descreveu recentemente como o problema do “e agora?”. Se nós tivermos sorte, as forças de Gaddafi entrarão em colapso alguns dias após o bombardeio aéreo, assim como ocorreu com o Taleban. Mas, e se isso não ocorrer? Nós prometemos que no enviaríamos tropas terrestres à Líbia. Mas se o poder aéreo se mostrar insuficiente para deter Gaddafi, o que faremos? Nós estamos envolvidos na Líbia para “proteger civis”, algo que será muito difícil de fazer se, digamos, Gaddafi decidir começar a massacrar o seu povo naquelas partes do país que ele já ocupa. E então, o que faremos?

Caso o pior dos cenários se concretize, o presidente dos Estados Unidos não deve oferecer falsas promessas ou assumir compromissos que ele não terá como cumprir. Algumas pessoas o criticaram por ele ter feito a sua viagem que já estava agendada à América do Sul, mas elas cometem um erro ao fazerem tal coisa. Seja de forma acidental ou planejada, cínica ou covarde, o presidente Obama deve manter o seu silêncio, dar continuidade à sua viagem, e não oferecer encorajamento a quem quer que espere que nós entremos na Líbia, incentivemos a democracia naquele país e vençamos a guerra.