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French twist: Dominique Strauss-Kahn x Nicolas Sarkozy

Dominique Strauss-Kahn, diretor do FMI, e o presidente francês Nicolas Sarkozy - Eric Feferberg/Reuters
Dominique Strauss-Kahn, diretor do FMI, e o presidente francês Nicolas Sarkozy Imagem: Eric Feferberg/Reuters

Anne Applebaum

18/05/2011 00h03

Quando eu soube que Dominique Strauss-Kahn – presidente do Fundo Monetário Internacional, político socialista francês proeminente e potencial candidato à presidência da França em 2012 – teria saído totalmente nu de um banheiro de hotel em Nova York, atacado sexualmente uma camareira, fugido do hotel e sido preso ao embarcar no próximo voo para Paris, a primeira coisa que me veio à mente foi: Sarkozy deve estar por trás disso.

Eu sei que não sou a única a pensar tal coisa porque muita gente me mandou mensagens de e-mail expondo essa mesma ideia – e somente a metade dessas pessoas estava brincando. Nicolas Sarkozy, o presidente da França, é tão maluco, tão imprevisível, está tão atrás nas pesquisas de popularidade e anda tão desesperado para ser reeleito que ele faria qualquer coisa para reverter a sua má sorte. É claro que a ideia de que Sarkozy teria armado um esquema envolvendo a camareira é bizarra – mas é bom lembrar que há quem acredite na história igualmente bizarra de que a mulher dele, Carla Bruni, está falando sobre gravidez a fim de torná-lo mais popular.

De fato, o simples fato de tanta gente ter se apressado a concluir que Sarkozy montou uma armadilha para Strauss-Kahn é bastante esclarecedor. Desde que foi eleito, Sarkozy passou de errático a excêntrico. Às vezes ele dá a impressão de ser um defensor do livre mercado, um admirador ferrenho do capitalismo. Em outras ocasiões, ele promete verbas estatais e apoio irrestrito à indústria francesa. A sua presidência tem sido dominada por uma série de escândalos, e embora ele não seja responsável por todos esses casos, eles tampouco contribuíram para melhorar a sua imagem.

Ele conduz à distração todos os que se encontram à sua volta. Nas reuniões, ele se levanta, senta-se e sai da sala quando se sente entediado. Um ex-subordinado de Sarkozy me disse alguns meses atrás que o presidente francês nunca lê nada, supostamente porque o seu período máximo de concentração, que é anormalmente curto, o impede de fazer tal atividade. No entanto, ele assiste bastante à televisão. Com um desdém intelectual francês apropriado, o meu conhecido me disse que assistir à televisão coloca Sarkozy “em contato próximo com o povo francês”.

Mas Sarkozy tem sido um desapontamento para o cidadão francês comum, ao se levar em conta que ele foi eleito para encontrar uma solução para aquela que foi eufemisticamente chamada de “questão da imigração” francesa – ou, para sermos mais precisos, o problema dos indivíduos oriundos do norte da África que moram permanentemente na França. Só que ele não encontrou solução alguma. Ele também foi eleito para fazer com que os franceses se sentissem economicamente mais seguros, mas quanto a isso, igualmente, Sarkozy não fez nada.

E isso nos faz retornar a Strauss-Kahn: ao contrário de Sarkozy, Strauss-Kahn tinha a reputação de ser um adulto responsável e dotado de um vasto conhecimento sobre economia – pelo menos até esta semana. Ao contrário de Sarkozy, ele estava em uma curva ascendente: o seu Partido Socialista deveria escolhê-lo em algumas semanas para disputar a presidência. Mas o momento é tudo. Se Strauss-Kahn de fato se comportou tão mal quanto estão dizendo, ele desacreditará não só a si próprio, mas também o processo de escolha de candidatos do seu partido – e também o partido como um todo. Pelo menos uma outra mulher está agora mencionando um incidente similar. Teriam havido outros? E será que os colegas socialistas de Strauss-Kahn sabiam disso?

Strauss-Kahn corre também o risco de desacreditar, mais uma vez, toda a classe política francesa. Alguns dos membros do círculo interno de poder de Sarkozy não estariam nem um pouco insatisfeitos com a prisão de Strauss-Kahn. Um ministro do governo declarou ao jornal “Le Monde”: “Existe uma espécie de júbilo com este fato porque esses tipos socialistas há anos vivem nos dando sermões sobre moral e virtude”.

Mas eis aqui uma previsão: Sarkozy não irá se beneficiar da implosão grotesca de Strauss-Kahn. O principal beneficiário será a política que é dona do eleitorado que cresce mais rapidamente na França neste momento: Marine Le Pen, filha de Jean-Marie Le Pen, e atualmente a líder da Frente Nacional, o partido ultranacionalista, inimigo da União Europeia e da imigração.

Bem mais apresentável do que o pai, Marine Le Pen passou a apresentar números mais altos do que Sarkozy nas pesquisas de popularidade em março, até porque ela oferece uma plataforma econômica populista e promete impedir que aumente o número de imigrantes oriundos do norte da África. E ela tem bons motivos para acreditar nas suas chances: em uma ocasião anterior, em 2002, o pai de Marine Le Pen disputou inesperadamente um segundo turno contra o então presidente, Jacques Chirac. Chirac venceu com uma ampla margem de votos, mas o establishment francês ficou apavorado.

Mas talvez eles não tenham ficado suficientemente assustados: a França parece estar sendo consumida pelo mesmo tipo de escândalos, pela mesmo mau humor em relação aos estrangeiros, e pela mesma sensação de que a classe política está tão desvinculada da realidade quanto estava dez anos atrás. Os políticos franceses continuam a habitar um mundo distante daquele em que vive o povo que eles dizem representar. A prisão de Strauss-Kahn certamente não tornará nenhum dos partidos tradicionais mais populares do que eles eram na semana passada. Mas quantos eleitores desejarão uma alternativa radical?