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E se Bill Clinton fosse presidente?

O ex-presidente dos EUA Bill Clinton e o jornalista Jorge Ramos tiram um "selfie" após entrevista - Twitter Jorge Ramos
O ex-presidente dos EUA Bill Clinton e o jornalista Jorge Ramos tiram um 'selfie' após entrevista Imagem: Twitter Jorge Ramos

Em Chappaqua, Nova York (EUA)

16/12/2013 00h01

Bill Clinton tem um problema: todo mundo quer lhe falar sobre sua mulher. E a pergunta é a mesma: Hillary se candidatará à presidência dos EUA em 2016? Mas ele tem a mesma resposta para todos: "Não sei".

Bill Clinton não é um homem de poucas palavras. Acrescentou: "Ela acredita, assim como eu, que fazer uma campanha eleitoral durante quatro anos é um grave erro. Há até jornais que têm repórteres destinados a cobrir uma campanha que não existe e, portanto, inventam coisas".

Seria fácil acabar com todos esses rumores. Bastaria que ela dissesse que não quer ser a primeira presidente mulher dos EUA. Mas a realidade é que não o disse. Além disso, assim como fizeram Barack Obama e John F. Kennedy durante suas candidaturas presidenciais, Hillary está terminando um livro que será publicado antes das eleições.

A realidade é que Hillary não está falando, mas Bill sim. Na manhã em que o entrevistei em sua casa ao norte de Nova York, o ex-presidente estava de bom humor e com vontade de conversar. Não tinha mais as enormes olheiras que vi em uma tarde na Casa Branca, e corrigiu seu velho costume de chegar alguns minutos atrasado. Tornou-se vegetariano desde 2010, o que é possível notar: perdeu vários quilos e ganhou energia. Olha nos olhos, cumprimenta com mão forte e quase sempre tem algo inteligente ou engenhoso a dizer. "Essa águia de madeira na porta de entrada eu trouxe do Haiti", comentou antes de chegar ao escritório.

Mostrou-me a sala onde escreveu a maioria de seus livros, o banheiro cujas paredes estão repletas de fotos de líderes mundiais e os planos de sua fundação (Clinton Global Initiative) para a América Latina. Em alguns dias viajaria para uma reunião no Brasil, onde a presidente Dilma Rousseff --assim como o presidente do México, Enrique Peña Nieto-- se queixaria de que seus telefonemas foram espionados por agentes americanos.

"Creio que os informes sobre espionagem tiveram um efeito negativo não só na América Latina, mas também na Europa e na Ásia", disse-me. "Tenho sérias dúvidas [sobre a prática de escutar conversas ou ler mensagens eletrônicas de outros líderes mundiais]."

Como ex-presidente, Clinton sente-se com muito mais liberdade para opinar sobre o que vê de errado no planeta. Perguntei-lhe se o caminho do Uruguai --legalizar a venda e o consumo de maconha-- deveria ser seguido por outros países. Ele não está convencido. "É muito complicado dizer que se legalizarmos as drogas não teremos todos os cartéis controlando nossas comunidades", afirmou.

Clinton disse um dia que, quando era estudante, tinha provado maconha, mas que "não havia tragado". E, já que estávamos falando do assunto, lhe perguntei se hoje teria respondido a essa pergunta de maneira diferente. Depois de tudo, até o próprio presidente Obama escreveu em um livro que havia experimentado maconha e cocaína. "Nunca neguei que o fiz", esclareceu Clinton. "Nunca neguei que usei maconha. Disse a verdade." Eu nunca o havia escutado dizer algo parecido.

A primeira coisa que me veio à mente é que, se um presidente e um ex-presidente americanos reconhecem publicamente que usaram drogas, o problema é muito mais sério do que se supõe; é algo que está arraigado na cultura dos EUA. Como se vai ganhar assim a guerra contra o narcotráfico? Enquanto milhões de americanos (e seus líderes) consumirem drogas, o narcotráfico continuará de sul a norte e não cessará a matança de milhares de latino-americanos na guerra entre os cartéis.

Com seu tom pausado e as mãos entre os joelhos, às vezes pareceria que Bill Clinton, com seus 67 anos, pensou em quase tudo. Está "decepcionado" de que Nicolás Maduro tenha assumido poderes especiais na Venezuela e não, durante sua presidência não chegou a qualquer acordo com Fidel Castro porque o regime cubano derrubou um pequeno avião do grupo Irmãos ao Resgate.

Os 20 minutos da entrevista voaram, mas Bill Clinton queria continuar conversando. As câmeras pararam de rodar, retiraram seu microfone, e o ex-presidente já tinha passado ao tema seguinte. Não entendia por que os republicanos se negavam a aprovar uma reforma migratória. Mas isso teria de esperar. Acabara-se meu tempo no mundo de Bill Clinton. Um assistente olhava preocupado seu relógio.

Antes de me despedir tiramos um "selfie" [autorretrato], publiquei-o no Twitter e saí pela porta protegida pela águia haitiana. Inevitável imaginar: e se Bill Clinton fosse presidente?