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César Chávez na Casa Branca

Em Nova York (EUA)

27/03/2014 00h01

César Chávez, o líder histórico da comunidade latina, nunca foi convidado à Casa Branca. Pelo menos oito presidentes poderiam tê-lo convidado, mas não o fizeram.

Talvez porque Chávez fazia os poderosos se sentirem muito incomodados. Ou talvez porque tivessem medo de alguém que havia chamado seus cachorros de Boicote e Greve.

Uma das melhores coisas dos EUA é essa vontade de se desculpar publicamente e de corrigir erros.

Por exemplo, tenho certeza de que cedo ou tarde este país retificará o gravíssimo erro de ter deportado dois milhões de pessoas em seis anos e de ter esperado quase três décadas para legalizar a maioria dos 11 milhões de imigrantes sem documentos. Isso virá. Mas o que já ocorreu foi o convite de César Chávez à Casa Branca.

Há alguns dias, o presidente Barack Obama convidou os atores do novo filme “César Chávez” - Michael Peña, América Ferrera e Rosario Dawson - e a seu diretor, Diego Luna, para visitarem a Casa Branca.

Juntos com eles estavam Dolores Huerta, a principal aliada de Chávez no sindicato de agricultores United Farm Workers, Paul Chávez, o sexto dos oito filhos do líder, e uma dezena de parentes. Eu estava de testemunha, e aquilo foi uma festa.

César Chávez, finalmente (e embora de maneira simbólica, em um filme), havia chegado à Casa Branca.

Este é, curiosamente, o primeiro filme feito sobre esse herói hispânico. Alguma vez, nos anos 1970, Robert Redford se aproximou de Chávez para falar de um possível projeto, mas nada se concretizou. Que bom; essa poderia ter sido uma caricatura de Hollywood.

O Chávez de carne e osso - pragmático, inspirador, mas cheio de defeitos, estudioso do poder, quase um Gandhi, obstinado, inquieto e visionário - que Luna nos apresenta é o verdadeiro.

Foi o que Huerta disse a Dawson; e a esposa de César, Helen Chávez, o disse a Ferrera, a Paul Chávez e a mim. Paul quase chorou enquanto o repetia para mim. Deve ser muito duro ver seu pai em uma tela e não poder tocá-lo e abraçá-lo.

A magia de Chávez está em ter defendido e organizado os mais discriminados e vulneráveis dos EUA: os agricultores. Ele os chamava de “os menos”. E, ao fazê-lo, abriu caminho para a crescente comunidade latina que terá 150 milhões de habitantes em 2050. “Vimos o futuro”, disse César Chávez em um discurso em 1984, “e o futuro é nosso.”

Não recomendo muitas coisas, mas é preciso ver o filme sobre César Chávez e ler a extraordinária de detalhada biografia que Miriam Pawel acaba de publicar, “The Crusades of Cesar Chavez”. São dois maravilhosos olhares para trás, mas também um mapa do caminho.

Creio que nosso atual fascínio por César Chávez se deve ao fato de que os latinos somos cada vez mais numerosos e temos problemas urgentes para resolver, mas não existem líderes suficientes que falem por nós. Por exemplo, só há três senadores hispânicos.

Mas mesmo sem César Chávez, pode-se lutar como ele. O “Sim, podemos” dele e Huerta - e que depois Barack Obama usou em sua campanha eleitoral - é, em três palavras, uma filosofia para o sucesso. É o sonho americano condensado em sua expressão mínima.

“O que faria hoje César Chávez?”, muitos se perguntam, se não tivesse morrido prematuramente aos 66.

Bom, magicamente se multiplicou em milhares. Esse Chávez e seu movimento são a inspiração para os Sonhadores de hoje, para os hispânicos que rompem as barreiras e têm êxito em política, abrindo empresas e destacando-se na arte, e também para quem logo será o primeiro ou a primeira presidente de origem latina.

Algo curioso aconteceu com César Chávez. Nos fez tanta falta por tanto tempo que, de alguma maneira, hoje já faz parte de todos nós.