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A nova vaga jihadista ameaça (e preocupa) toda a Europa

Josep Lago/AFP
Imagem: Josep Lago/AFP

10/01/2015 06h00

Além de constituírem os maiores atentados realizados na França desde 1961, época da guerra da Argélia, os crimes terroristas cometidos nesta semana na região parisiense têm outras características importantes. A principal delas se refere ao movimento difuso de jihadistas isolados, geralmente treinados em técnicas de combate nos conflitos do Oriente Médio, que vivem ou se instalam na França ou em outros países europeus.

Diferentemente da operação de grande envergadura perpetrada em 2001 pela Al Qaeda no atentado das Torres Gêmeas, o ataque ao semanário "Charlie Hebdo" e os assassinatos da semana passada misturaram destreza militar e improvisação. Eficazes em sua investida letal que massacrou a redação do jornal, os irmãos Kouachi, decididos a matar e morrer, fugiram ao acaso até serem cercados e mortos. Tanto eles, como seu aliado Amedy Coulibaly, autor dos assassinatos de clientes da mercearia judaica e de uma policial parisiense, são homens de mais de trinta anos que reivindicam filiações jihadistas díspares.

Já fichados ou condenados pela polícia, os irmãos Kouachi aderiram ao radicalismo islâmico no começo dos anos 2000. Um deles, Saïd, esteve nos campos de treinamento jihadista no Iêmen em 2011. Coulibaly, cujos pais são oriundos da África subsaariana, provavelmente do Mali, se radicalizou mais tarde. Condenado por ter participado de um complô terrorista em 2010, ele havia saído da cadeia em novembro do ano passado. 

Como os três assassinos desta semana, Mehdi Nemmouche, francês de origem argelina e ex-jihadista na Síria, agia também meio sozinho e foi preso por acaso na rodoviária de Marselha depois de chacinar quatro pessoas no Museu judeu de Bruxelas, em maio de 2014. Antes deles, Mohammed Merah, que matou sete pessoas e feriu seis outras no sul da França em março de 2012, correspondia ao mesmo perfil de assassino solitário afiliado à nebulosa rede jihadista.

Trata-se, portanto, de ataques eficazes, mas largamente imprevisíveis e improvisados, mesmo que seus autores tenham sido vigiados pelas redes de segurança ocidentais. Sabe-se agora, de fato, que os irmãos Kouachi, fichados pelas autoridades americanas, estavam na lista dos indivíduos proibidos de entrar nos Estados Unidos.

Numa declaração dada nesta sexta-feira (9) a um canal de TV, o primeiro-ministro Manuel Valls informou que existem cerca de 1.500 jihadistas franceses combatendo no Iraque e, sobretudo, na Síria, país francófono, ocupado entre 1920 e 1946 pela França. No último mês de setembro, as autoridades do Reino Unido informaram que cerca de 500 britânicos estavam combatendo junto com os radicais islâmicos na Síria e no Iraque.

Segundo o "New York Times", havia ainda na mesma época na região, 400 combatentes alemães e 300 belgas, sem contar os jihadistas oriundos da Itália, Holanda, Espanha, Suécia, Noruega e Dinamarca.

Mais jovem que os irmãos Kouachi e que Coulibaly, mas tão aguerrida quanto eles, parte destes indivíduos poderá voltar à sua terra natal para continuar, na França ou nos países vizinhos, o combate jihadista.

Anunciada no desfile contra os atentados que ocorrerá neste domingo em Paris, a presença dos chefes de governo do Reino Unido, da Alemanha, da Espanha e da Itália marca a vontade dos europeus de defender a liberdade de imprensa e os valores fundamentais de sua civilização. Mas ao acompanhar François Hollande nas ruas de Paris, David Cameron, Angela Merkel, Mariano Rajoy e Matteo Renzi demonstram também que os dirigentes europeus consideram a nova vaga do radicalismo islâmico como uma ameaça direta a todos os cidadãos do continente, sejam eles crentes ou incréus.