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A guerra do milho e outros conflitos agrícolas

21/08/2015 19h06

Numa operação pouco usual, o FBI apreendeu em 2012 no aeroporto de Chicago sementes geneticamente modificadas de milho, desenvolvidas pelas firmas Monsanto e DuPont, que estavam sendo contrabandeadas para a China. Revelado há alguns dias pela revista americana New Republic, o caso desembocou no desmantelamento de uma rede de agrônomos e negociantes chineses cujo chefe será julgado no estado de Iowa em setembro. Intitulada "A Guerra do Milho", a reportagem ilustra a importância da agrobusiness na espionagem intelectual e econômica das grandes potências.

Outras pesquisas agrícolas seguidas com muita atenção por vários países concernem as halófitas, plantas terrestres adaptadas para viver no mar ou na sua margem. Por causa do aquecimento global, os especialistas calculam que o nível dos oceanos subirá um metro ao longo deste século, inundando perto de 4 milhões de hectares de terras cultiváveis. Países com forte população rural, como o Egito, a Índia e o Bangladesh, mas também todo o sudoeste asiático, serão os primeiros atingidos por este desastre climático e humanitário. Na Índia, estão sendo experimentadas variedades de arroz que crescem na água salobra. Plantas halófitas selecionadas podem também ser utilizadas para fabricar ração de animais, biocombustível, azeite de cozinha e suplemento nutricional. Descobertas e registro de patentes neste setor certamente suscitarão –como no caso do milho evocado acima– roubos e clonagens de sementes geneticamente modificadas.

No plano global, há também uma rivalidade entre vários países que desejam exportar sua tecnologia agrícola para a África, onde ocorrerá o mais forte crescimento demográfico do século 21. Comentado pelo Guardian, um relatório da Universidade de Sussex, analisa a disputa entre o Brasil e a China na cooperação agrícola com a África. Citando o caso da empresa brasileira Constran, que constrói uma fábrica etanol no Gana para exportar o produto para a Suécia, contornando assim as tarifas europeias elevadas sobre o etanol brasileiro, o Guardian nota a dupla política agrícola brasileira. A do Ministério da Agricultura, focada no agrobusiness, e a do Ministério do Desenvolvimento Agrário, dirigida para a agricultura familiar. Segundo os especialistas citados pelo jornal londrino, esta dupla função da política agrícola adapta-se melhor às estruturas econômicas e sociais das zonas rurais africanas. Embora a China esteja atuando há quase meio século no intercâmbio agrícola com a África, seu modelo de desenvolvimento é pesadamente tecnocrático, repousando sobre grandes investimentos em infraestruturas de insumos, silos e barragens.

Um ponto a ser considerado, não evocado pelo Guardian, é que o prestígio internacional da atividade brasileira neste setor pode ter facilitado o apoio dos representantes africanos à eleição de José Graziano à Direção da FAO, em 2011, que também pesou na eleição mais disputada de Roberto Azevedo à direção da OMC, em 2013.