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Encontros e desencontros dos aliados no centenário do fim da 1ª Guerra

Vincent Kessler/Reuters
Imagem: Vincent Kessler/Reuters

11/11/2018 14h22

A Primeira Guerra Mundial é ainda chamada de "Grande Guerra", tal a dimensão do morticínio e dos estragos sem precedentes que ela causou na Europa, na Rússia e no império otomano. Dentre os 74 milhões de soldados mobilizados, 10 milhões morreram em combate. Sem contar os mortos civis e os soldados mutilados pelo resto da vida.

Na Alemanha e na França, a guerra marcou mais uma etapa na série de conflitos (1870, 1914-1918, 1939-1944) que ensanguentaram os dois países durante três gerações.

Nesta perspectiva, a visita de Emmanuel Macron e Angela Merkel ao monumento de Rethondes, na floresta de Compiègne, ganhou um grande destaque. De fato, foi num vagão de trem estacionado neste local que a Alemanha assinou, no dia 11 de novembro de 1918, sua rendição ao marechal Foch, comandante francês das forças aliadas, e que a França se rendeu a Hitler em 22 de junho de 1940.

Reunindo-se neste local ambivalente, marcado por vitórias e derrotas nas guerras entre os dois países, Macron e Merkel reafirmaram o congraçamento franco-alemão. Instituída por De Gaulle e Adenauer em 1962, a reconciliação franco-alemã foi reafirmada por todos os dirigentes dos dois países, e em particular por François Mitterrand e Helmuth Kohl, em 1984, numa cerimônia no ossuário de Douamont, imenso túmulo de 130 mil soldados desconhecidos, franceses e alemães, caídos na Primeira Guerra.

Hoje, dia 11, Emmanuel Macron e Angela Merkel, em companhia de cerca de 60 outros chefes de Estado e de governo, prestaram homenagem ao soldado desconhecido francês, morto na Grande Guerra, que repousa sob o Arco do Triunfo, em Paris.

Entre os chefes de Estado estrangeiros o mais importante é, sem dúvida, Donald Trump, em visita oficial à França desde o dia 9. Cinquenta e três mil soldados americanos tombaram ao lado dos franceses e outras tropas aliadas na Grande Guerra (outros 35 mil morreram nos hospitais militares americanos na epidemia de gripe espanhola, antes de desembarcar na Europa). Sua intervenção foi decisiva para derrotar os alemães em 1918.

As celebrações deste domingo em Paris pareciam destinadas a demonstrar a grande união e vontade de paz dos governantes e dos povos.

No entanto, a tensão que existe entre os líderes europeus e o presidente americano aflorou no mal-entendido ocorrido entre Macron e Trump. Numa entrevista a uma rádio francesa, Macron reafirmou a necessidade de a Europa possuir um "verdadeiro Exército" para "se defender sozinha, sem os Estados Unidos", porque ela devia se proteger da Rússia, da China e "mesmo dos Estados Unidos", se referindo aqui às ameaças cibernéticas, e não ao governo americano. 

Segundo o governo francês e o "New York Times", a transcrição confusa da entrevista suscitou uma resposta dura de Trump. Três minutos depois de seu avião aterrissar em Paris, no dia 9, ele tuitou: "O presidente Macron sugeriu que a Europa construísse sua própria ordem militar para se proteger dos EUA, China e Rússia. Muito insultante..."

Embora amenizado em seguida, o incidente sinalizou a distância progressiva que se criou entre Trump e Macron, depois de uma primeira fase de grande proximidade entre os dois chefes de Estado. O problema é mais sério para Macron do que para Trump. Sem poder contar com o apoio total de Angela Merkel, cuja influência declina na Alemanha e na Europa, Macron encara ainda os governantes pró-americanos da Europa de Leste, e principalmente da Polônia, hostis a toda e qualquer autonomia militar ou diplomática da Europa com relação aos Estados Unidos.