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O problema dos Estados Unidos é o extremismo republicano

Obama durante pronunciamento nesta segunda na Casa Branca, em Washington - Jim Watson/AP/Pool
Obama durante pronunciamento nesta segunda na Casa Branca, em Washington Imagem: Jim Watson/AP/Pool

Paul Krugman

30/07/2011 04h57

Os fatos referentes à crise em torno do teto da dívida não são complicados. Os republicanos, de fato, fizeram os Estados Unidos refém, ameaçando minar a economia e perturbar as tarefas essenciais do governo a menos que obtivessem concessões políticas que eles jamais conseguiriam promover por meio de legislações no parlamento. E os democratas – que estariam certos em rejeitar totalmente essa extorsão – acabaram se inclinando a atender a essas demandas republicanas.

Como eu disse, a questão não é complicada. Mas muita gente na mídia aparentemente não consegue reconhecer essa realidade simples. Os artigos da imprensa retratam os dois partidos como sendo igualmente intransigentes; os analistas tecem fantasias sobre uma espécie de rebelião “centrista”, como se o problema fosse um excesso de intransigência partidária de ambos os lados.

Alguns analistas reclamaram do culto do “equilíbrio”, a insistência em retratar ambos os partidos como igualmente errados e igualmente responsáveis por qualquer problema, não importando quais sejam os fatos. Há muito tempo eu brinquei, dizendo que se um dos partidos declarasse que a Terra é plana, os jornais publicariam manchetes como “Partidos discordam quanto ao formato do planeta”. Mas será que esse culto ainda é preponderante em uma situação tão grave quanto esta, na qual um dos partidos está nitidamente disposto a chantagear o rival, enquanto que este está negociando o preço do resgate?

A resposta é sim. E isso não é nada engraçado: o culto do equilíbrio foi um fator importante para que nós fôssemos empurrados para a beira do desastre. Isso porque, embora a mídia diga que os dois lados são culpados, não existe nenhuma punição para o extremismo. Os eleitores não punirão os políticos por terem um comportamento ultrajante se tudo o que eles escutam é que ambos os lados são igualmente culpados.

Eu darei um exemplo daquilo de que estou falando. Conforme todos já devem saber, o presidente Barak Obama tentou inicialmente fazer um “Grande Acordo” com os republicanos sobre impostos e gastos. Para fazer isso, ele não só decidiu não reagir à extorsão do Partido Republicano, mas também ofereceu concessões extraordinárias que iam de encontro às prioridades democratas: um aumento da idade de qualificação para o Medicare, cortes drásticos dos gastos e apenas pequenos aumentos da arrecadação. Conforme observou Nate Silver, do “New York Times”, Obama efetivamente assumiu uma posição que não está apenas bem mais à direita do que as preferências da média do eleitorado, mas também à direita das preferências do eleitorado médio republicano.

Mas os republicanos rejeitaram o acordo. Sendo assim, qual foi o título da análise do fracasso das negociações feita pela agência de notícias “Associated Press”? “Obama e os republicanos estão presos a uma retórica inflexível”. Um presidente democrata que se inclina para trás para atender às exigências do outro lado – ou, se preferirmos, que se inclinou tanto para a direita que corre o risco de cair – é tratado como se tivesse sido tão intransigente quanto os oponentes. Equilíbrio!

E isso me faz pensar nas fantasias “centristas”.

Muitos analistas acreditam que assumir uma posição na faixa central do espectro político se constitui em uma virtude por si só. Mas a sabedoria não reside necessariamente na faixa central da estrada, e eu gostaria que os líderes fizessem o que é correto, e não que adotassem uma postura centrista.

Mas para aqueles que insistem que sempre se deve ficar no centro, eu tenha uma informação importante: nós já temos um presidente centrista. De fato, Bruce Barlett, que foi analista de políticas do governo Reagan, argumenta que Obama é, na prática, um conservador moderado.

O argumento de Bartlett tem substância. O presidente, conforme nós vimos, estava desejoso, ou até mesmo ansioso, por chegar a um acordo em relação ao orçamento que favorecesse fortemente as prioridades conservadoras. A sua reforma do sistema de saúde foi bastante similar à reforma que Mitt Romney implementou em Massachusetts. O projeto de Romney, por sua vez, seguiu as linhas de um plano que foi originalmente proposto pela direitista Fundação Heritage. E fazer com que as alíquotas de impostos dos norte-americanos de alta renda voltem ao patamar em que se encontravam nos anos noventa está longe de ser uma proposta socialista.

É verdade que os republicanos insistem em dizer que Obama é um esquerdista que deseja que o governo assuma o controle sobre a economia, mas eles próprios não fariam tal coisa, certo? Os fatos, se alguém se der ao trabalho de publicá-los, indicam o contrário.

Sendo assim, que burburinho é este sobre uma rebelião centrista? Eu acredito que esse ruído vem de pessoas que reconhecem a natureza não funcional da política norte-americana moderna, mas que se recusam, por algum motivo, a reconhecer o papel tendencioso exercido pelos extremistas republicanos no sentido de tornar o sistema não funcional. E não é difícil descobrir qual é a motivação dessas pessoas. Afinal, quem aponta para a verdade óbvia é rotulado de apparatchik estridente, mas não pela direita, e sim pelos quadros dos autoproclamados centristas.

Mas fazer apelos nebulosos pela adoção do centrismo, assim como escrever matérias que sempre atribuam uma culpa igual aos dois partidos, é uma grande manobra evasiva – uma manobra evasiva que só encoraja mais episódios de mau comportamento. Atualmente, o problema da política norte-americana é o extremismo republicano, e quem não estiver disposto a dizer isto estará contribuindo para que o problema se agrave.