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Sucesso da Califórnia mostra que extremismo ainda domina a política nos EUA

26/07/2014 00h01

Os Estados são os laboratórios da democracia, foi a declaração famosa do juiz Louis Brandeis, que ainda é verdadeira. Por exemplo, uma das razões pelas quais nós sabíamos ou deveríamos saber que o Obamacare era viável foi o sucesso pós-2006 do Romneycare em Massachusetts. Mais recentemente, o Kansas mergulhou fundo na economia movida pela oferta, reduzindo os impostos sobre os ricos, na crença de que isso iria desencadear um enorme boom; o boom não aconteceu, mas o déficit orçamentário explodiu, oferecendo uma lição para quem estiver disposto a aprender com a experiência.

E há uma experiência maior ainda em curso, apesar de menos drástica, na direção oposta. A Califórnia há muito sofria de paralisia política, com regras orçamentárias que permitiam uma minoria republicana cada vez mais extremada a paralisar a maioria democrata; quando estourou a bolha imobiliária do Estado, ele mergulhou em uma crise fiscal. Em 2012, no entanto, o domínio democrata finalmente tornou-se forte o suficiente para superar a paralisia, e o governador Jerry Brown foi capaz de avançar com uma agenda liberal modesta de impostos mais altos, aumento de gastos e um aumento do salário mínimo. A Califórnia também implementou com entusiasmo o Obamacare.

Acho que não estamos mais no Kansas. (Desculpe, não consegui evitar.)

Não é nem preciso dizer que os conservadores fizeram previsões sombrias. Uma reação típica foi de Daniel J. Mitchell, do Instituto Cato, que declarou que, ao votarem a favor da Proposição 30, que autorizou esses aumentos de impostos, “os saqueadores e aproveitadores do Estado Dourado” (sim, eles realmente acham que estão vivendo em um romance de Ayn Rand) estavam cometendo um “suicídio econômico”. Enquanto isso, Avik Roy, do Instituto Manhattan e da Forbes afirmou que os residentes da Califórnia estavam prestes a enfrentar um “choque de tarifas”, que mais do que dobraria os custos dos seguros de saúde.

O que realmente aconteceu? Sinto em dizer que não há sinal algum da catástrofe prometida.

Se os aumentos de impostos estão causando uma grande fuga de postos de trabalho da Califórnia, isso não aparece nas estatísticas. O emprego subiu 3,6% nos últimos 18 meses, em comparação com a média nacional de 2,8%; neste momento, a participação do Estado no índice de emprego nacional, que foi duramente atingida pela explosão da enorme bolha imobiliária da Califórnia, está de volta aos níveis anteriores à recessão.

Quanto à saúde, algumas pessoas -basicamente homens jovens saudáveis que tinham seguro barato no mercado individual e eram muito ricos para receber subsídios- de fato enfrentaram aumentos em suas tarifas, o que nós sempre soubemos que iria acontecer. No geral, porém, os custos da reforma na saúde foram abaixo das expectativas, enquanto o número de segurados subiu muito além do esperado -mais do que o triplo das previsões iniciais na área de San Francisco. Uma pesquisa recente da Commonwealth Fund sugere que a Califórnia já reduziu à metade o percentual de seus moradores sem seguro de saúde. Além do mais, todos os indicadores apontam para novos progressos em curso, com mais empresas de seguro entrando no mercado no próximo ano. 

E, sim, o orçamento voltou ao superávit.

Houve algum exame de consciência entre os profetas da desgraça da Califórnia, perguntando-se por que eles estavam tão errados? Não que eu saiba. Em vez disso, tenho visto muitas tentativas de desvalorizar a boa notícia da Califórnia, com pessoas salientando que o crescimento do emprego do Estado ainda fica atrás do Texas, o que é verdade, e afirmando que esta diferença é impulsionada pelos impostos diferenciados, o que não é.

A grande diferença entre os dois Estados, além do tamanho do setor de petróleo e gás, não são os impostos. São os preços da habitação. Apesar do estouro da bolha, os valores dos imóveis na Califórnia ainda custam o dobro da média nacional, enquanto no Texas são 30% abaixo da média. Assim, mais pessoas estão se mudando para o Texas, embora os salários e a produtividade sejam mais baixos do que na Califórnia.

E, enquanto parte dessa diferença de preços da habitação reflete a geografia e a densidade populacional -Houston ainda está se espalhando, enquanto Los Angeles, cercada por montanhas, atingiu os seus limites naturais- ela também reflete as políticas de uso da terra altamente restritivas da Califórnia, principalmente impostas pelos governos municipais e não pelo estadual. Como apontou Edward Glaeser de Harvard, há alguma verdade na afirmação que Estados como o Texas estão crescendo rapidamente graças à sua atitude anti-regulação, “mas em geral, as pessoas se referem aos regulamentos errados”. Os impostos não têm essa importância.

Então, o que podemos aprender com a recuperação da Califórnia? Principalmente, que você deve ingerir a propaganda anti-governo com grandes pitadas de sal. Os aumentos de impostos não são um suicídio econômico; às vezes, eles são uma maneira útil de pagar pelas coisas que precisamos. Os programas governamentais, como o Obamacare, podem funcionar, se as pessoas que os executam quiserem que eles funcionem, e se eles não forem sabotados pela direita. Em outras palavras, o sucesso da Califórnia é uma demonstração de que a ideologia extremista que ainda domina grande parte da política americana é um disparate.