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Próxima geração conservadora dos EUA pode aderir ao 'vodu econômico'

Paul Krugman

08/10/2014 00h01

Mesmo que os republicanos conquistem o Senado este ano, adquirindo o controle das duas câmaras do Congresso, não ganharão muito em termos convencionais: eles já são capazes de bloquear a legislação e ainda não serão capazes de aprovar nada sobre o veto do presidente. Uma coisa que eles poderão fazer, porém, é impor sua vontade ao Escritório de Orçamento do Congresso, até agora um árbitro apartidário sobre propostas políticas.
Em consequência, em breve poderemos nos encontrar em um profundo vodu.

Durante sua candidatura fracassada à indicação presidencial republicana em 1980, George H. W. Bush descreveu a doutrina do "lado da oferta" de Ronald Reagan --a tese de que cortar os impostos sobre as altas rendas levaria a um crescimento econômico espetacular, de modo que os cortes de impostos pagariam por si mesmos-- como "política econômica vodu". Bush tinha razão. Até a rápida recuperação da recessão de 1981-82 foi conduzida por cortes nas taxas de juros, e não cortes de impostos. Ainda assim, durante algum tempo, os fiéis do vodu se consideraram vingados.

Os anos 1990, porém, foram má notícia para o vodu. Os conservadores previram confiantemente um desastre econômico depois do aumento de impostos de Bill Clinton em 1993. Em vez disso, o que aconteceu foi um boom que superou a expansão de Reagan em todas as dimensões: PIB, empregos, salários e renda familiar.

E embora nunca tenha havido qualquer admissão pelos suspeitos de sempre de que seu deus havia falhado, é digno de nota que o governo Bush 2, nunca tímido ao vender suas políticas sob falsas alegações, não tentou justificar seus cortes de impostos com afirmações extravagantes sobre sua compensação econômica. Os economistas de George W. Bush não acreditavam na moda do lado da oferta e, mais importante, seus assessores políticos acreditavam que essa moda teria má repercussão entre o público. Também devemos notar que o Escritório de Orçamento do Congresso da era Bush se comportou bem, mantendo sua missão apartidária.

Mas, hoje parece que o vodu está voltando. No nível estadual, os governadores republicanos, em particular Sam Brownback, do Kansas, têm aderido aos cortes fiscais, apesar dos orçamentos problemáticos, com afirmações confiantes de que o crescimento resolverá todos os problemas. Isso não está acontecendo, e no Kansas uma rebelião de moderados poderá entregar o Estado aos democratas. Mas os verdadeiros fiéis não deram sinal de hesitação.

Enquanto isso, no Congresso, Paul Ryan, o presidente da Comissão de Orçamento da Câmara, dá amplas sugestões de que, depois da eleição, ele e seus colegas farão o que os Bush nunca fizeram: tentar forçar o Escritório de Orçamento a adotar "notas dinâmicas", isto é, supor uma grande compensação econômica dos cortes fiscais.

E por que isso está acontecendo agora? Não é porque a economia vodu se tornou mais verossímil. É verdade, a recuperação da recessão de 2007-09 foi lenta, mas de fato foi um pouco mais rápida que a típica recuperação de crises financeiras, apesar dos cortes sem precedentes nos gastos do governo e no emprego. Na verdade, a recuperação no emprego no setor privado foi mais rápida do que durante a última década do "boom Bush". Ao mesmo tempo, pesquisadores do Fundo Monetário Internacional que observam evidências em vários países, descobriram que a redistribuição da renda dos ricos para os pobres, que os conservadores insistem que mata o crescimento, na verdade parece reforçar as economias.

Mas os fatos não vão deter a volta do vodu, por dois motivos principais.

Primeiro, a economia do vodu dominou o movimento conservador por tanto tempo que se tornou um culto voltado para dentro, cujos membros sabem o que sabem e são imunes a evidências em contrário. Quinze anos atrás, os líderes republicanos talvez tivessem consciência de que o boom Clinton representava um problema para sua ideologia. Hoje, alguns como o senador Rand Paul podem dizer: "Quando foi a última vez que nosso país gerou milhões de empregos? Foi sob Ronald Reagan". Clinton quem?

Segundo, a natureza do debate orçamentário significa que os líderes republicanos precisam acreditar em magia. Durante anos pessoas como Ryan posaram de defensores da disciplina fiscal enquanto propunham enormes cortes de impostos para indivíduos ricos e corporações. Eles também pediram cortes selvagens na ajuda aos pobres, mas estes nunca foram grandes o suficiente para compensar a perda de receita. Então, como eles podem fazer as coisas darem certo?

Bem, durante anos eles confiaram em asteriscos mágicos: afirmações de que compensarão a receita perdida fechando brechas fiscais e cortando os gastos; detalhes a seguir. Mas esse esquema vem perdendo eficácia com o passar dos anos e as especificidades continuam não aparecendo.

Inevitavelmente, portanto, eles estão sentindo a atração daquela velha magia, e se tomarem o Senado poderão infundir vodu em análises supostamente neutras.

Será que o farão realmente? Isso destruiria a credibilidade de uma instituição muito importante, que tem servido muito bem ao país. Mas vocês viram alguma evidência de que o movimento conservador moderno se importa com essas coisas?