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Pelo amor ao carbono

13/01/2015 00h01

Não deveria ser surpresa que o primeiro movimento do novo Senado republicano seja uma tentativa de pressionar o presidente Barack Obama a aprovar o oleoduto Keystone XL, que traria o petróleo das areias betuminosas do Canadá. Afinal de contas, as dívidas devem ser pagas, e a indústria de petróleo e gás --que doou 87% de suas contribuições para a campanha do Partido Republicano em 2014-- espera ser recompensada por seu apoio.

Mas porque que este projeto ambientalmente preocupante é uma prioridade urgente em um momento de queda dos preços mundiais do petróleo? Bem, a linha de defesa da posição do partido, de pessoas como Mitch McConnell, o novo líder da maioria no Senado, é que o projeto gera empregos. E é verdade: a construção de Keystone XL poderia aumentar ligeiramente o emprego nos EUA. Na verdade, pode substituir quase 5% dos postos de trabalho que os EUA perderam por causa dos cortes destrutivos em gastos federais, que por sua vez foram o resultado direto da chantagem Republicana sobre o teto da dívida.

Ah, e não me diga que os casos são completamente diferentes. Você não pode alegar de forma consistente que os gastos com o gasoduto geram empregos enquanto os gastos do governo não.

Vamos pausar um minuto e discutir os princípios econômicos.

Por mais de sete anos --desde que as bolhas da habitação e da dívida da era Bush estouraram-- a economia dos EUA sofre com uma demanda inadequada. A despesa total não foi o suficiente para empregar plenamente os recursos da nação. Em tal ambiente, qualquer coisa que aumente os gastos cria empregos. E se os gastos privados estão deprimidos, um aumento temporário nos gastos públicos poda e deve tomar o seu lugar. É por isso que a grande maioria dos economistas acredita que o estímulo de Obama, na verdade, reduziu a taxa de desemprego em comparação com o que teria acontecido sem esse estímulo.

Desde o início, no entanto, os líderes republicanos têm mantido o ponto de vista oposto, insistindo que devemos cortar os gastos públicos em face da elevada taxa de desemprego. E eles conseguiram o que queriam: os anos que vieram depois de 2010, quando os republicanos assumiram o controle da Câmara, foram marcados por um declínio sem precedentes nos gastos do governo per capita, que só se nivelaram em 2014.

As evidências indicam esmagadoramente que este tipo de austeridade fiscal em uma economia deprimida é destrutivo; se o noticiário econômico tem sido melhor ultimamente, em parte provavelmente se deve ao fato de que os governos federal, estaduais e municipais finalmente pararam de fazer cortes. E os cortes de gastos, em particular, custaram muitos empregos. Quando questionaram o Escritório de Orçamento do Congresso sobre quantos empregos seriam perdidos por causa do sequestro --os grandes cortes nos gastos federais que os republicanos extraíram em 2011, sob a ameaça de levar os EUA ao calote-- sua estimativa mais conservadora foi de 900 mil. E isso é apenas uma parte da perda total.

Nem é preciso dizer que os culpados nunca vão admitir que estavam errados. Mas se você observar seu comportamento de perto, você verá sinais claros de que eles realmente não acreditam em sua própria doutrina.

Considere, por exemplo, o caso dos gastos militares. Quando se trata de possíveis cortes em contratos de defesa, os políticos que proclamam que cada dólar que o governo gasta vem em detrimento do setor privado, de repente começam a lembrar de todos os empregos que serão perdidos. Eles até mesmo começam a falar sobre o efeito multiplicador, sobre como a redução de gastos por parte dos trabalhadores de defesa leva à uma perda de empregos em outras indústrias. Este é o fenômeno que o ex-Republicano Barney Frank apelidou de “keynesianismo armado”.

E a defesa de Keystone XL é muito semelhante; podemos chamá-la de “keynesianismo carbonizado”. Sim, a aprovação do gasoduto mobilizaria algum dinheiro que de outra forma estaria parado e, ao fazê-lo, criaria alguns postos de trabalho --42 mil durante a fase de construção, de acordo com a estimativa mais citada. (Uma vez concluído, o gasoduto iria empregar apenas algumas dezenas de trabalhadores.) Mas os gastos do governo com estradas, pontes e escolas fariam a mesma coisa.

E os ganhos em vagas de trabalho com o gasoduto, como eu disse, seriam apenas uma pequena fração --menos de 5%-- das perdas de emprego advindas do sequestro, o que por sua vez são apenas uma parte dos danos causados pelos cortes de gastos em geral. Se McConnell e companhia realmente acreditam que precisamos de mais gastos para criar postos de trabalho, por que não apoiar um esforço para melhorar a infraestrutura norte-americana em ruínas?

Então, o que deve ser feito em relação ao Keystone XL? Se você acredita que seria prejudicial para o meio ambiente --como eu-- então você deve ser contra o projeto e deve ignorar as reivindicações de criação de empregos. Os números sugeridos são minúsculos em comparação com a força de trabalho total do país. E, de qualquer forma, o argumento da criação de empregos pelo gasoduto é basicamente uma piada de mau gosto vindo de pessoas que fizeram todo o possível para destruir as vagas de trabalho norte-americanas --e agora estão utilizando os mesmos argumentos que costumavam empunhar para ridicularizar os programas de emprego do governo para justificar uma grande doação para seus amigos na indústria de combustíveis fósseis.