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Vamos deixar os bons tempos continuarem rolando e evitar aumentos de taxas

Paul Krugman

10/03/2015 00h03

Há seis anos, Paul Ryan, que de lá para cá se tornou o presidente do Comitê de Recursos da Câmara e a principal voz do Partido Republicano em assuntos econômicos, teve um artigo de opinião publicado no "The New York Times". Com o título "Trinta Anos Depois, o Retorno da Estagflação", ele alertava que os esforços do governo Obama e do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) de combater os efeitos da crise financeira trariam de volta os problemas dos anos 70, com tanto inflação quanto desemprego elevados.

É verdade que nem todos os republicanos concordaram com sua avaliação. Muitos afirmavam que estávamos na verdade caminhando para uma hiperinflação ao estilo Weimar.

Não é preciso dizer, esses alertas provaram ser totalmente errados. A inflação elevada nunca se materializou. A criação de empregos deixou a desejar no início, porém, mais recentemente, acelerou de forma dramática. Longe de assistir a uma reprise daquela série dos anos 70, o que estamos vendo agora é uma economia que, em aspectos importantes, lembra a dos anos 90.

Certamente há grandes diferenças entre os Estados Unidos em 2015 e nos anos 90. A TV é muito melhor agora, a situação dos trabalhadores é muito pior. Apesar das ações estarem em alta e muito se falar em uma nova bolha de tecnologia, ela não se compara à antiga euforia. Também não há, infelizmente, nenhum sinal de que o grande aumento de produtividade de 1995-2005, provocado enquanto as empresas adotavam a tecnologia da informação, voltará.

Mesmo assim, agora estamos gerando novas vagas de trabalho em um ritmo não visto desde os anos Clinton. E não é preciso dizer que inflação baixa combinada com rápido crescimento do emprego transforma em tolice todas aquelas previsões de que a reforma da saúde de Obama, ou talvez apenas a atitude ruim do presidente, destruiria o setor privado.

Mas apontar de novo o quão errados estavam os suspeitos habituais na direita a respeito de tudo não é o único motivo para notar os paralelos com os anos 90. Também há implicações para a política monetária: os ganhos recentes em empregos deixam o Fed em uma encruzilhada parecida com a situação que enfrentou por volta de 1995. Agora, como na época, o crescimento do emprego reduziu a taxa oficial de desemprego a um nível no qual, segundo o senso comum, a economia deveria estar superaquecida e a inflação deveria estar em alta. Mas agora, como na época, não há nenhum sinal da inflação prevista nos dados de fato.

O Fed tem um duplo mandato –ele deve buscar tanto a estabilidade dos preços quanto o pleno emprego. A esta altura, estabilidade dos preços convencionalmente significa inflação baixa, porém positiva, de cerca de 2% ao ano. E o que significa para obtenção do pleno emprego? Para o Fed, significa chegar à NAIRU –sigla em inglês para taxa de desemprego não aceleradora da inflação, que é consistente com a meta de inflação.

Atualmente o Fed estima a NAIRU entre 5,2% a 5,5%, e o relatório mais recente coloca a taxa de desemprego em 5,5%. Então chegamos lá –hora de elevar as taxas de juros!

Ou talvez não. A NAIRU supostamente é a taxa de desemprego na qual a economia superaquece e uma espiral inflacionária tem início. Mas não há nenhum sinal de pressão inflacionária. Em particular, se o mercado de emprego estivesse realmente firme, os salários estariam subindo rapidamente, enquanto agora não estão indo a lugar nenhum.

O fato é que já estivemos aqui. Entre o início e meados dos anos 90, o Fed estimava a NAIRU entre 5,5% e 6%, e em 1995, o desemprego caiu para esse nível. Mas a inflação não estava subindo. Então as autoridades do Fed tomaram aquela que revelou ser uma decisão muito boa: eles suspenderam fogo, aguardando por sinais claros de pressão inflacionária. E a economia americana acabou provando ser capaz de gerar mais milhões de empregos adicionais, sem inflação, do que teria caso o Fed tivesse freado o boom tão cedo.

Nós estamos em uma situação semelhante agora? Na verdade, eu não sei –mas o Fed também não. A questão é, então, o que fazer diante dessa incerteza, já que não há nenhum problema de inflação em vista.

Para mim, assim como para vários economistas –talvez mais notavelmente Lawrence Summers, o ex-secretário do Tesouro– a resposta parece ser dolorosamente óbvia: não puxe o gatilho até ver o branco dos olhos da inflação. Se for provado que o Fed esperou demais, a inflação poderia disparar para 2% por algum tempo, mas isso não seria uma grande tragédia. Mas se o Fed agir cedo demais, nós poderíamos acabar perdendo milhões de empregos que seriam criados –e, no pior caso, poderíamos mergulhar em uma armadilha deflacionária como a japonesa, que já aconteceu na Suécia e possivelmente na zona do euro.

O que é preocupante é que não está claro se as autoridades do Fed veem dessa forma. Elas precisam prestar atenção nas lições da história –e a história relevante aqui está nos anos 90, não nos anos 70. Vamos festejar como se fosse 1995; vamos deixar os bons tempos, ou ao menos melhores tempos, continuarem rolando, e evitar por ora aumentos de taxas.