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Opinião: Nos EUA, Previdência Social ser expandida, e não sofrer cortes

Paul Krugman

11/04/2015 00h03

Enquanto os presidenciáveis ​​republicanos expõem suas agendas políticas -que sempre envolvem a redução dos impostos sobre os ricos pondo fim aos benefícios para os pobres e a classe média- formas de pensar realmente novas estão acontecendo do outro lado do corredor. De repente, ao que parece, muitos democratas decidiram romper com a ortodoxia do pensamento político norte-americano, que sempre exige cortes nos “direitos”. Em vez disso, eles estão propondo que os benefícios da Previdência Social sejam, de fato, expandidos.

Este é um acontecimento bem-vindo de duas maneiras. Em primeiro lugar, a proposta específica de expansão da Segurança Social é muito boa. Em segundo, e mais importante, os democratas parecem finalmente estar enfrentando a propaganda antigoverno e reconhecendo a realidade de que existem algumas coisas que o governo faz melhor do que o setor privado.

Como todas as nações avançadas, os EUA confiam principalmente nos mercados e na iniciativa privada a tarefa de proporcionar aos seus cidadãos as coisas que querem e precisam, e quase ninguém no nosso discurso político proporia mudar isso. Os tempos em que se acreditava que era uma boa ideia o governo operar diretamente em grandes partes da economia há muito ficaram para trás.

No entanto, sabemos que algumas coisas em parte precisam ser feitas pelo governo. Todo livro didático de economia fala sobre “bens públicos”, como a defesa nacional e o controle de tráfego aéreo, que não podem ser disponibilizados para qualquer pessoa sem que sejam disponibilizados a todas e que, portanto, as empresas com fins lucrativos não têm interesse em fornecer. Mas serão os bens públicos a única área em que o governo supera o setor privado? De maneira alguma.

Um exemplo clássico de onde o governo se sai melhor que a iniciativa privada é a dos seguros de saúde. Sim, os conservadores se agitam constantemente por mais privatizações -em particular, eles querem converter o Medicare em nada mais do que vales para a compra de seguros privados- mas todas as evidências dizem que isso nos levaria exatamente na direção errada. Medicare e Medicaid são substancialmente mais baratos e mais eficientes do que os seguros privados; eles ainda envolvem menos burocracia. A nível internacional, o sistema de saúde americano é único, na medida em que se baseia no setor privado, e também é única em sua incrível ineficiência e custos elevados.

E há outro grande exemplo de superioridade governo: proporcionar segurança na aposentadoria.

Talvez nós não precisássemos da Previdência Social se as pessoas comuns fossem realmente aqueles agentes clarividentes perfeitamente racionais que os economistas gostam de assumir em seus modelos (e os membros da direita gostam de publicar em sua propaganda). Em um mundo idealizado, os trabalhadores de 25 anos de idade baseariam suas decisões sobre quanto poupar em uma avaliação realista do que eles precisarão para viver confortavelmente quando estiverem na casa dos 70 anos. Eles também seriam espertos e sofisticados na hora de investir essas economias, procurando cuidadosamente as melhores soluções de equilíbrio entre risco e retorno.

No mundo real, no entanto, muitos trabalhadores americanos, talvez a maior parte, estão economizando muito pouco para sua aposentadoria. Eles também investem mal essas economias. Por exemplo, um relatório recente da Casa Branca revelou que os americanos estão perdendo bilhões a cada ano, graças a consultores de investimento que tentam maximizar suas próprias taxas em vez do bem-estar de seus clientes.

Talvez você seja tentado a dizer que, se os trabalhadores economizam muito pouco e investem mal, a culpa é deles. Mas as pessoas têm empregos e filhos, e precisam lidar com todas as crises da vida. É injusto esperar que também sejam investidores experientes. De qualquer forma, a economia deve funcionar para as pessoas reais, que levam vidas reais; ela não deve ser uma corrida de obstáculos que só alguns conseguem superar. 

E no mundo real da aposentadoria, a Previdência Social é um exemplo brilhante de um sistema que funciona. É simples e limpo, com baixos custos operacionais e um mínimo de burocracia. Ela fornece aos americanos mais velhos que trabalharam duro a vida toda a chance de viver decentemente na aposentadoria, sem exigir que eles tenham uma capacidade desumana de pensar décadas à frente e serem gênios do investimento. O único problema é que o declínio das pensões privadas e sua substituição por planos inadequados deixou uma lacuna que a Previdência Social atualmente não é grande o suficiente para preencher. Então, por que não expandi-la? 

Não é preciso nem dizer que as sugestões nesse sentido já estão provocando reações quase histéricas, e não apenas por parte da direita, mas também de ditos centristas. Como escrevi há alguns anos, exigir cortes na Previdência Social tem sido visto no meio político como um “símbolo de seriedade, uma maneira de mostrar como você é um verdadeiro estadista e cabeça-dura”. E há apenas uma década o ex-presidente George W. Bush tentou privatizar o programa, com grande apoio centrista.

Mas seriedade de verdade significa ver o que funciona e o que não funciona. As aposentadorias privadas funcionam muito mal; a Previdência Social funciona muito bem. E devemos ampliar esse sucesso.

Tradutora: Deborah Weinberg