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Tecnologia produziu grandes manchetes, mas resultados econômicos modestos

Paul Krugman

26/05/2015 00h01

Lembra-se do livro de Douglas Adams "O Guia do Mochileiro das Galáxias", de 1979? Começava zombando da tecnologia, ao reduzir a Terra a um planeta cujas formas de vida "são tão incrivelmente primitivas que ainda acham que o relógio digital é uma ideia muito bacana". Mas isso foi lá nas fases iniciais da revolução da informática.

Desde então avançamos para coisas muito mais importantes, tanto que a grande ideia tecnológica de 2015 até agora é um relógio digital. Mas este lhe diz para se levantar, se estiver sentado há muito tempo!

Está bem, também estou sendo sarcástico. Mas há uma questão real aqui. Todo mundo sabe que vivemos em uma era de mudança tecnológica incrivelmente rápida, que está modificando tudo. Mas, e se o que todo mundo sabe estiver errado? E não estou sendo terrivelmente do contra. Um número crescente de economistas, examinando dados de produtividade e de renda, se pergunta se a revolução tecnológica foi exageradamente badalada, e alguns tecnólogos compartilham sua preocupação.

Já estivemos aqui antes. "O Guia do Mochileiro" foi publicado durante a era do "paradoxo da produtividade", um período de duas décadas em que a tecnologia pareceu avançar rapidamente --computadores pessoais, telefones celulares, LANs e as primeiras fases da internet--, mas o crescimento econômico era lento e as rendas estavam estagnadas. Muitas hipóteses foram apresentadas para explicar esse paradoxo, sendo talvez a mais popular a de que inventar uma tecnologia e aprender a usá-la com eficácia não são a mesma coisa. Com o tempo, diziam os historiadores econômicos, os computadores acabarão entregando os produtos (e serviços).

Esse otimismo pareceu se justificar quando o crescimento da produtividade finalmente decolou, por volta de 1995. O progresso estava de volta, assim como os EUA, que pareciam se situar na vanguarda da revolução.

Mas aconteceu uma coisa engraçada no caminho da revolução 'techno'. Afinal, não tivemos um retorno sustentado ao rápido progresso econômico. Não, foi mais um surto isolado, que pipocou há cerca de uma década. Desde então vivemos em uma era de iPhones, iPads e iDontKnows, mas, mesmo ajustados aos efeitos da crise financeira, o crescimento e as tendências de renda retornaram à lentidão que caracterizou os anos 1970 e 1980.

Em outras palavras, a esta altura, toda a era digital, abrangendo mais de quatro décadas, parece uma decepção. Novas tecnologias produziram grandes manchetes, mas resultados econômicos modestos. Por quê?

Uma possibilidade é que os números não estejam levando em conta a realidade, especialmente os benefícios dos novos produtos e serviços. Eu tenho muito prazer com a tecnologia que me permite assistir em streaming a apresentações de meus músicos favoritos, mas isso não conta para o PIB. Ainda assim, a nova tecnologia deveria servir tanto às empresas quanto aos consumidores, e deveria reforçar a produção de bens tradicionais, assim como de novos. Os grandes ganhos de produtividade do período de 1995 a 2005 ocorreram principalmente em coisas como controle de estoques, e apareceram tanto, ou mais, em empresas não tecnológicas, como as de comércio, quanto nas próprias indústrias de alta tecnologia. Nada parecido está acontecendo hoje.

Outra possibilidade é que as novas tecnologias sejam mais divertidas do que fundamentais. Peter Thiel, um dos fundadores do PayPal, comentou que queríamos carros voadores, mas em vez disso ganhamos mensagens de 140 caracteres. E ele não é o único a sugerir que a tecnologia da informação que entusiasma as classes tuitantes talvez não seja uma grande coisa para a economia em geral.

Então, o que eu acho que está acontecendo com a tecnologia? A resposta é não sei, mas ninguém sabe. Talvez meus amigos no Google tenham razão, e o Big Data em breve transforme tudo. Talvez a impressão em 3D traga a revolução informática para o mundo material. Ou talvez estejamos no rumo de outro grande 'bah'.

Do que eu tenho quase certeza, porém, é de que deveríamos reduzir o entusiasmo.

Escrever e falar à exaustão sobre como a tecnologia muda tudo pode parecer inofensivo, mas na prática, funciona como uma distração de questões mais mundanas e uma desculpa para cuidar mal dessas questões. Se você voltar aos anos 1930, encontrará muita gente influente dizendo o mesmo tipo de coisas que as pessoas dizem hoje: não se trata realmente do ciclo econômico, apesar dos debates sobre política macroeconômica, trata-se de mudança tecnológica radical e de uma força de trabalho que não está capacitada para lidar com a nova era.

E então, graças à Segunda Guerra Mundial, finalmente tivemos o aumento de demanda de que precisávamos, e todos aqueles trabalhadores supostamente sem qualificação --sem falar em Rosie, a Rebitadora-- vieram a ser muito úteis na economia moderna, quando lhes deram oportunidade.

É claro, lá vou eu, invocando a história. Não compreendo que hoje tudo é diferente? Bem, entendo por que as pessoas gostam de dizer isso. Mas isso não faz com que seja realidade.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves