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Sem muito o que dizer, republicanos deixam de lado críticas à política de Obama

Andrew Harnik/AP
Imagem: Andrew Harnik/AP

Paul Krugman

10/08/2015 10h25

Sobre o que falaram os presidenciáveis republicanos dos EUA no debate em horário nobre na semana passada? Bem, houve 19 referências a Deus, enquanto a economia recebeu apenas dez menções. Os congressistas republicanos votaram dezenas de vezes a rejeição total ou parcial do Obamacare, mas os candidatos só citaram a principal política do presidente Obama nove vezes durante duas horas. E a energia, outro tema que já foi favorito do Partido Republicano, surgiu apenas quatro vezes.

Estranho, não? A premissa compartilhada por todos no lado republicano é que os anos de Obama foram uma época de desastre políticoem todas as frentes. Mas os candidatos naquele palco quase não tinham nada a dizer sobre qualquer das supostas áreas de desastre.

E havia um bom motivo para que estivessem tão calados lá fora, no mundo real, nenhum dos desastres que seu partido previu realmente ocorreu. Obama simplesmente continua fracassando em errar. E esse é um grande problema para o "Grande e Velho Partido" - ainda maior que Donald Trump.

Começando pela reforma da saúde. Fale com o pessoal de direita, e eles inevitavelmente vão afirmar que foi um desastre. Mas pergunte exatamente que forma esse desastre assumiu, e você conseguirá no máximo relatos não confirmados sobre aumentos de cotas e queda de qualidade.

Enquanto isso, os números reais mostram que a Lei de Acesso à Saúde reduziu acentuadamente o número de americanos não segurados - especialmente nos estados democratas que queriam expandir o Medicaid -, enquanto custou substancialmente menos que o esperado. Os novos segurados estão, na grande maioria, satisfeitos com sua cobertura, e a lei claramente melhorou o acesso aos tratamentos.

Desnecessário dizer que os grupos de pensadores de direita ainda estão manipulando "estudos" que pretendem mostrar que a reforma da saúde é um fracasso. Mas é um jogo perdido, e, a julgar pelo debate da semana passada, os políticos republicanos sabem disso.

E os efeitos colaterais? O Obamacare deveria ser um matador de empregos - na verdade, quando Marco Rubio foi perguntado sobre como reforçaria a economia praticamente tudo o que ele pôde sugerir foi revogar as reformas da saúde e financeira. Mas no ano e meio desde que o Obamacare entrou em pleno vigor a economia dos EUA ganhou em média 237 mil empregos no setor privado por mês. Isso é muito bom. Na verdade, é melhor que qualquer coisa que vimos desde os anos 1990.

O que nos leva à economia.

Houve um volumenotavelmente pequeno de discussão econômica no debate, embora Jeb Bush ainda esteja se gabando de seu histórico na Flórida - isto é, sua experiência em presidir uma gigantesca bolha habitacional e providencialmente deixar o cargo antes de a bolha estourar. Por que os outros candidatos não disseram mais? Provavelmente porque nesta altura a economia de Obama não parece muito ruim. Coloque desta maneira: se você comparar os índices de desemprego ao longo da administração Obama com os índices de desemprego sob o presidente Ronald Reagan, Obama acaba parecendo melhor - o desemprego estava mais alto quando ele assumiu o cargo, e hoje está mais baixo do que neste ponto do governo Reagan.

Está bem, há muitos motivos para qualificar essa avaliação, notadamente o fato de que o desemprego medido está baixo em parte por causa do declínio na porcentagem de americanos na força de trabalho. Ainda assim, a economia de Obama falhou totalmente em produzir os desastres - hiperinflação! Queda do dólar! Crise fiscal! - que quase todo mundo na direita previa. E isso evidentemente deixou o campo presidencial republicano com pouco a dizer.

Um último ponto: tradicionalmente, os republicanos adoram falar que os liberais com seu ambientalismo e sua guerra ao carvão atrapalham o futuro da energia nos EUA. Mas houve só um pouco disso na semana passada - talvez porque a produção interna de petróleo disparou e as importações de petróleo despencaram desde que Obama assumiu o cargo.

Qual é o tema comum que liga todos os desastres que os republicanos previam, mas deixaram de se materializar? Se eu tivesse de resumir a atitude republicana sobre política interna, diria que nenhum bom ato fica impune. Tente ajudar os desamparados, apoiar a economia em tempos difíceis ou limitar a poluição, e você enfrentará a ira da mão invisível. O único modo de prosperar, insiste a direita, é ser bom com os ricos e cruel com os pobres, enquanto se deixa as corporações fazerem o que lhes agrade.

Segundo essa visão de mundo, um líder como Obama, que aumenta os impostos para o 1% enquanto subsidia o atendimento de saúde para as famílias de baixa renda, que oferece estímulos em uma recessão, que regula os bancos e expande a proteção ambiental, certamente presidirá o desastre em todos os sentidos.

Mas ele não fez isso. Não estou dizendo que os EUA estejam em ótima forma, porque não estão. A recuperação econômica foi lenta demais e ainda está incompleta. O Obamacare não é o sistema que qualquer um teria criado a partir do zero; e não estamos perto de fazer o suficiente sobre a mudança climática. Mas estamos nos saindo muito melhor do que qualquer um daqueles sujeitos em Cleveland jamais admitirá.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves