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Como conseguir emprego no Google

25/02/2014 00h01

Mountain View, Califórnia --em junho passado, em uma entrevista concedida a Adam Bryant, do jornal "The New York Times", Laszlo Bock, vice-presidente sênior de recursos humanos do Google --ou seja, o cara responsável pela contratação de profissionais para uma das empresas mais bem sucedidas do mundo-- observou que o Google definiu que “os GPAs [ou grade-point average, sistema de notas adotado para medir o desempenho dos estudantes em vários países] são inúteis como critério de seleção para contratação de funcionários e que os resultados dos exames também são inúteis. Nós descobrimos que eles não preveem nada”. Bock também observou que a “proporção de pessoas que trabalham no Google e não têm nenhuma educação universitária vem aumentando com o passar do tempo”. Atualmente, essa proporção está em 14% em algumas áreas da empresa. Numa época em que muitas pessoas têm se perguntado “como é que o meu filho vai conseguir um emprego?”, eu pensei que seria útil visitar o Google e ouvir qual é a resposta de Bock a essa dúvida.

Não me entenda mal, disse Bock ao iniciar sua explicação. “Boas notas certamente não prejudicam ninguém”. Muitos postos de trabalho oferecidos pelo Google exigem que se saiba matemática, computação e programação. Por isso, se suas notas altas refletirem verdadeiramente suas habilidades nessas áreas, elas serão uma vantagem. Mas o Google está de olho em muito mais do que boas notas.

“Na empresa, adotamos cinco atributos para contratar nossos funcionários”, explicou Bock. “Se a vaga for para uma função técnica, nós avaliamos a habilidade do candidato com programação --e metade dos postos de trabalho oferecidos pela empresa são para funções técnicas. Para cada vaga, no entanto, a principal qualidade que buscamos é a capacidade cognitiva geral, e não o QI. Procuramos pessoas que tenham capacidade de aprendizado e capacidade para processar informações em tempo real. Procuramos pessoas com capacidade de conectar e unificar diferentes tipos de informações. E nós avaliamos essas habilidades por meio de entrevistas comportamentais estruturadas, que validamos para nos certificar de que elas são passíveis de prever o desempenho dos futuros funcionários”.

Em segundo lugar, acrescentou ele, buscamos “liderança, em especial o que chamamos de liderança emergente, em oposição à liderança tradicional. Liderança tradicional é: você foi presidente do clube de xadrez? Você foi vice-presidente de vendas? Quanto tempo levou para você chegar lá? Isso não importa para nós. O que importa para nós é saber se você, como membro de uma equipe, intervirá e agirá como líder no momento oportuno quando for confrontado com um problema. E também é muito importante saber se você sabe recuar e abrir mão da liderança em prol de outra pessoa. Isso porque, para ser um líder eficiente nesse ambiente, é fundamental estar disposto a abrir mão do poder”.

O que mais? Humildade e controle.

Segundo ele, “isso tem a ver com o senso de responsabilidade e de domínio sobre si mesmo na hora de agir” para tentar solucionar qualquer problema – e com a humildade para recuar e adotar as melhores ideias dos outros. “Seu objetivo final”, explicou Bock, “é o descobrir que podemos fazer juntos para resolver problemas. Eu dei a minha contribuição e, logo depois, eu recuo”.

E isso não tem a ver apenas com a humildade em abrir espaço para que os outros possam contribuir, diz Bock, mas também com a “humildade intelectual. Sem humildade, você é incapaz de aprender”. É por isso que as pesquisas mostram que muitos estudantes que se formaram em faculdades de administração de ponta não conseguem avançar. “Pessoas brilhantes e que têm sucesso raramente experimentam o fracasso e, por isso, elas não aprendem a aprender com o fracasso”, disse Bock.

“Em vez disso, essas pessoas cometem o seguinte erro fundamental: se algo de bom acontece, é porque eu sou um gênio. Se algo de ruim acontece, é porque alguém é um idiota ou eu não obtive os recursos necessários ou o mercado mudou. ...O que temos visto é que as pessoas que obtêm mais sucesso aqui, as pessoas que nós queremos contratar, mantêm uma posição agressiva. Elas argumentam muito. Elas são fanáticas em relação a seus pontos de vista. Mas, quando você diz a elas: ‘aqui está um fato novo’, elas dizem, ‘ah, bem, isso muda as coisas, você está certo’”. Nós precisamos de gente que tenha, ao mesmo tempo, um grande ego e um pequeno ego.

O atributo menos importante que o Google busca nos candidatos a suas vagas é “expertise ou conhecimento técnico”. De acordo com Bock, “se você pegar alguém com uma elevada capacidade cognitiva, que seja naturalmente curioso, esteja disposto a aprender, tenha habilidades de liderança emergente e você contrate esse alguém para o departamento de RH ou de finanças e ele não tiver conhecimento sobre o conteúdo específico da área e você compará-lo a alguém que esteja fazendo uma coisa só há anos e for um especialista mundial, o especialista vai dizer: ‘já vi isso 100 vezes antes; aqui está o que você deve fazer’”. A maior parte do tempo, a pessoa que não é especialista dará a mesma resposta, acrescentou Bock “porque, na maioria das vezes, a coisa não é tão difícil assim”. É claro que, de vez em quando, quem não é especialista vai errar, disse ele, mas de vez em quando também essa pessoa surgirá com uma resposta totalmente nova. E existe um enorme valor nisso.

Para resumir a abordagem de Bock em relação às contratações: hoje em dia, o talento pode surgir de tantas formas diferentes e ser construído de tantas maneiras não tradicionais que os responsáveis pela contratação de funcionários têm que prestar atenção em todos os candidatos – além de apenas aqueles provenientes de universidades renomadas. Pois, “quando você olha para as pessoas que não fizeram faculdade e conseguem ser bem-sucedidas no mundo, essas pessoas são seres humanos excepcionais. E nós devemos fazer tudo que esteja a nosso alcance para encontrar essas pessoas”. Segundo Bock, um número grande demais de faculdades “não entregam o que prometem. Você se endivida até os ossos e não aprende as coisas mais úteis para a sua vida. Essas faculdades são [apenas] uma adolescência prolongada”.

O Google atrai tantas pessoas talentosas que pode se dar ao luxo de olhar além das métricas tradicionais, como o GPA. Para a maioria dos jovens, no entanto, ir para a faculdade e se sair bem em seu curso ainda é a melhor maneira de dominar as ferramentas necessárias para muitas carreiras. Mas Bock também está dizendo algo importante para essas pessoas: cuidado. Seu diploma não reflete fielmente sua capacidade de desempenhar em qualquer emprego. O mundo só se preocupa com --e recompensa -- o que você é capaz de fazer com o que você sabe (e ele não se importa como você aprendeu suas habilidades). E, numa época em que a inovação é cada vez mais um esforço de grupo, o mundo também se importa muito com as “soft skills” ou as competências transversais-- liderança, humildade, colaboração, adaptabilidade e amor para aprender e reaprender. E isso será verdadeiro independentemente de onde você for trabalhar.