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Tudo depende de 25 de maio na Ucrânia

Thomas Friedman

25/04/2014 00h02

A palavra “maidan” significa “praça” em ucraniano e em árabe. E a “Maidan da Independência” de Kiev, assim como a “Maidan Tahrir” do Cairo, tem sido palco de uma espantosa explosão de aspirações democráticas.

As barricadas de pedras, pneus, vigas de madeira e carros queimados e empilhados, erigidas pelos revolucionários ucranianos ainda estão lá – na verdade, até parece que elas poderiam servir de cenário para uma encenação de “Os Miseráveis” – e as pessoas ainda depositam flores frescas nos santuários improvisados para as mais de 100 pessoas que foram mortas na Maidan pelo antigo, e agora deposto, regime da Ucrânia. Ao andar pela praça, porém, eu tentei explicar ao meu anfitrião local que, apesar de eu estar incrivelmente impressionado, atualmente muitos norte-americanos demonstram sentir uma “overdose de Maidan” – são muitas esperanças democráticas frustradas em praças demais espalhadas pelo mundo – do Afeganistão ao Irã, do Iraque ao Egito, da Síria à Líbia.

Esqueça isso, me dizem os ucranianos. A nossa revolução é diferente. Há verdadeiras raízes democráticas aqui, as instituições da sociedade civil funcionam e também existe o ímã da União Europeia bem do nosso lado. Com um pouco de ajuda, nós poderemos alcançar o sucesso.

Quanto mais eu aprendo sobre as coisas aqui da Ucrânia, mais eu acho que eles estão certos. Algo muito importante aconteceu aqui. Na verdade, eu acredito que o futuro da Ucrânia constitui um dos desafios de política externa mais significativos da presidência de Obama, pois o tema não apenas determinará o futuro da Ucrânia, como também o futuro da Rússia.

Seria bom se pudéssemos ter firmado um compromisso com o presidente Vladimir Putin, da Rússia, para permitir que a Ucrânia entrasse aos poucos para a União Europeia (UE) sem ameaçá-lo. O presidente Barack Obama tentou encontrar essa fórmula ganha-ganha. Mas Putin não está preocupado com ganha-ganha nesse caso. Ele está mais interessado em uma fórmula ganha-perde. Por isso, ele precisa perder – pelo bem da Ucrânia e da própria Rússia.

Mas fazer isso não vai ser moleza. Nós e nossos aliados europeus terão que superar nossa sensação de overdose e os ucranianos terão que se unir mais do que nunca. O primeiro teste virá em 25 de maio, quando a Ucrânia realizará suas eleições presidenciais. Putin está trabalhando para evitar ou desacreditar essas eleições ao bombardear o leste da Ucrânia, que é mais pró-Rússia, com propaganda informando que o movimento da Maidan foi liderado por “fascistas” e ao usar seus agentes e capangas encapuzados locais para manter as turbulências na região para que as pessoas não vão votar.

Nosso trabalho é afastar Putin da Ucrânia para que as eleições possam ocorrer tranquilamente. Isso pode exigir a adoção de mais sanções agora. O trabalho dos ucranianos é garantir a relevância das eleições ao elegerem uma pessoa decente e inclusiva, que irá trabalhar para garantir a unidade da Ucrânia e para eliminar a corrupção do país. Nós podemos deter Putin, mas apenas os ucranianos podem ameaçar a legitimidade do presidente russo. Se a maioria dos ucranianos votarem em uma eleição livre para acelerar seu processo de aproximação da Europa e de distanciamento de Moscou, Putin terá um problema real. Esse seria um enorme revés para a visão distorcida do presidente russo – vindo diretamente de um vizinho.

Daria Marchak, uma jovem repórter que cobre a área de negócios na Ucrânia, me explicou por que os jovens ucranianos estão tão desesperados para que o país entre para a UE. “Até 2011, havia uma sensação de melhora por aqui”, disse ela. Mas o último governo era tão corrupto, corrupto em escala industrial, que as pessoas sentiram como se “nós estivéssemos voltando para trás”. E, então, quando aquele governo antigo disse que estava abandonando a ideia de fazer a Ucrânia entrar para a UE a aderindo à União Eurasiana de araque criada por Putin, foi a gota d'água.

“As pessoas acreditavam que, se nós entrássemos para a união aduaneira de Putin, o sistema corrupto do país seria consolidado para sempre”, disse Marchak, e os jovens não teriam futuro. O desespero deles para aderir à União Europeia está ligado à esperança de que isso levará ao que eu chamo de “globalução” – uma revolução que vem de fora –, que fará com que a UE imponha aos políticos ucranianos padrões de transparência que os jovens daqui simplesmente não são capazes de impor. A UE “será o instrumento da mudança”, disse ela.

Mas para que a Ucrânia se una e entre para a UE será necessário um presidente com uma visão inclusiva para integrar o Leste e o Oeste do país, disse Oleh Levchenko, ativista político da Maidan.

“O maior problema que temos hoje é a ausência da mensagem certa – uma mensagem capaz de unir o Leste e o Oeste”, disse ele. “Portanto, esse não é um problema de Putin. É o nosso fracasso. Ninguém criou uma visão unificadora para o futuro”.

Na verdade, a Ucrânia tem uma espécie de “doença da Praça Tahrir”. Os revolucionários de Kiev foram incrivelmente corajosos. Mas, assim como no Egito, eles ainda não traduziram suas aspirações – relacionadas a um futuro inclusivo, pró-UE e sem corrupção – em seus próprios partidos políticos ou candidatos nacionais que poderão ganhar as eleições e governar. Por isso, os oligarcas antigos estão preenchendo esse vácuo. Alguns deles são decentes, mas a Ucrânia precisa fazer mais e melhor.

Olena Litvishko, da Iniciativa Ucraniana para os Protestos Pacíficos, me disse que o que a revolução da Maidan fez foi elevar “um estrato da sociedade civil e as empresas que demonstraram ter energia para realizar mudanças, mas não possuem os instrumentos para realizar essas mudanças”. Eles não têm partidos políticos verdadeiros baseados em uma ampla agenda compartilhada. “Eles não conhecem seus direitos, e os nossos políticos não querem que eles os conheçam”.

Em resumo: os ucranianos foram muito corajosos ao darem à luz seu próprio movimento por uma democracia limpa, pois estavam fartos do status quo. Mas Putin não é capaz de tolerar uma democracia bem sucedida e voltada para o Ocidente aqui na Ucrânia, e os jovens ucranianos não podem viver sem ela. Dessa maneira, para que essa democracia seja bem sucedida, nós precisamos garantir que Putin não a matará em seu berço. E os ucranianos precisam garantir que seus políticos da velha guarda não a matarão antes que ela aprenda a caminhar com as próprias pernas.