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EUA ficaram sem combustível no tanque

19.set.2014 - Guarda da Casa Branca fica em alerta após um intruso ser avistado por agentes do Serviço Secreto - Evan Vucci/AP
19.set.2014 - Guarda da Casa Branca fica em alerta após um intruso ser avistado por agentes do Serviço Secreto Imagem: Evan Vucci/AP

Thomas L. Friedman

09/10/2014 00h05

Estou certo que há muitas explicações técnicas para as recentes falhas na proteção pelo Serviço Secreto, que permitiram que um intruso armado corresse até a porta da frente da Casa Branca e que um criminoso armado tomasse um elevador com o presidente Barack Obama. Mas eu também atribuiria parte da culpa à classe política da nação.

Basta olhar para Washington atualmente, escutar o que os políticos estão dizendo e observar como passam seu tempo. Não dá para deixar de perguntar: essas pessoas ainda se importam ao menos um pouco com o país? Há alguém aqui em uma busca por excelência, para tornar a América grande?

Sim, sim, eu sei. Eles todos estão aqui para prestar "serviço público". Mas não é o que parece. Na verdade, parece que vieram a Washington para serem eleitos, para assim poderem levantar ainda mais dinheiro para serem reeleitos. Isto é, até não conseguirem ser reeleitos. Então, como o ex-líder da maioria na Câmara, Eric Cantor, eles podem levantar ainda mais dinheiro lucrando com o tempo que passaram no Capitólio e recebendo pagamentos multimilionários de um banco de investimento de Wall Street que antes regulavam.

Ser eleito e levantar dinheiro para ser reeleito –em vez de governar e chegar a acordos de interesse nacional– parece ser tudo em que muitos de nossos políticos nacionais estão interessados. Eles são exceções, é claro, mas parece que muitos não se orgulham de seu trabalho no governo.

Nós estamos em guerra no Oriente Médio, com a vida de militares americanos em jogo, mas o Congresso foi incapaz de voltar de seu recesso pré-eleitoral para debater a validade desta guerra ou dar ao presidente a autorização legal apropriada, muitos menos assumir alguma responsabilidade. Quando todos estão tão ocupados correndo, causa surpresa ninguém estar administrando o governo federal?

Segundo o "PolitFact", o senador republicano por Wyoming, John Barrasso, disse, 'Esta é a pausa mais longa feita pelo Congresso em mais de 50 anos'. (...) O senador democrata pela Virgínia, Tim Kaine, o chamou de 'o segundo recesso mais longo desde as eleições de 1960'. Ambos os senadores estão certos. Para Barrasso, 'mais de 50 anos' nos leva a qualquer ano até 1963, ou 51 anos atrás. O histórico mostra que desde 1963, o Congresso costuma fazer pausas breves em setembro, dando aos legisladores várias semanas em outubro para fazer campanha em anos eleitorais, e até mesmo suspende as atividades do ano em outubro. Mas uma pausa prolongada de meados de setembro até meados de novembro nunca ocorreu. A observação de Kaine é precisa".


O que isso tem a ver com os lapsos do Serviço Secreto? Certamente não lhe serve como desculpa, mas se você é um funcionário federal hoje e olhar para os "adultos", que deveriam estar lhe supervisionando, o que você vê? Você vê muitos políticos excessivamente indulgentes com eles mesmos, voltados aos seus próprios interesses, que estão ali apenas para atrair aplausos, dedicando grande parte do tempo deles para arrecadar dinheiro para vencer eleições e então, quando você, como funcionário federal, comete um erro, serem os primeiros a correr aos microfones com falsa preocupação para investigar sua competência –desde que as câmeras estejam registrando.

Isso acaba afetando todos os departamentos, incluindo o Serviço Secreto. Quando tantas pessoas acima de você estão apenas preocupadas cinicamente apenas consigo mesmas, isso mina o moral, o foco e a disciplina. Quando tantos acima de você estão aproveitando, ora, porque então os agentes do Serviço Secreto, que faziam os preparativos para a viagem do presidente à Colômbia em abril de 2012, não poderiam também levar prostitutas para seus quartos e se divertirem um pouco com a conta paga por Washington?

Não é de se estranhar que uma pesquisa do Gallup tenha apontado em 8 de setembro que "apenas 8% do um terço de todos os americanos que acompanha 'atentamente' a política nacional aprovam a forma como o Congresso realiza seu trabalho". Como notou Jon Stewart: "Para se ter uma ideia de quão disfuncional o Serviço Secreto está a esta altura, o Congresso teve que ajudá-lo a encontrar soluções".

Eu não consigo apontar o dedo em algo precisamente, mas dá para sentir atualmente em Washington certa displicência, um ar de vale tudo e que muito poucas pessoas que trabalham para o governo federal se orgulham de seu trabalho, porque, de qualquer forma, tudo é simplesmente improvisado pelo Congresso e pela Casa Branca na última hora. Faz muitos anos desde que alguém nos mobilizou para uma ida à Lua, para algo grande. Então basta comparecer e bater o ponto.

Em dezembro de 2010, eu fui à Casa Branca para uma entrevista. Eu passei pelo posto de controle do Serviço Secreto na Pennsylvania Avenue. Após passar minha pasta pela máquina de raio X, eu segurei o puxador de metal da porta para entrar na Casa Branca. O puxador saiu na minha mão.

"Oh, isso às vezes acontece", disse despreocupadamente o agente do Serviço Secreto à porta, enquanto tentava encaixar o puxador de volta no lugar.

Pessoas que se orgulham de seu trabalho simplesmente não deixam o puxador da porta da Casa Branca cair desse jeito.

De novo, eu não estou desculpando o Serviço Secreto, mas as recentes invasões não me surpreendem, já que grande parte da classe política que supervisiona o serviço é tão míope, voltada para o próprio umbigo e tem aversão a risco. Quando as pessoas que nos governam se tornam tão cínicas, polarizadas e disfuncionais, isso certamente influencia a burocracia. Aquilo que está embaixo é como aquilo que está em cima.