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Papa e Putin --tudo o que você deseja e rejeita em um líder

23/10/2014 00h01

Lendo os jornais atualmente, eu vejo que os dois líderes mundiais que despertam mais paixão em mim são o papa Francisco e Vladimir Putin, o presidente da Rússia. Um é tudo o que você desejaria em um líder, o outro tudo o que não gostaria. Um tem influência sobre 1,2 bilhão de católicos romanos. o outro sobre nove fusos horários. Um continua me surpreendendo com sua capacidade de empatia, o outro por quanto se transformou em um idiota de primeira e um rufião. Mas nenhum deles pode ser ignorado e ambos têm uma influência enorme no mundo atual.

Primeiro, o papa. Em um momento em que tantos líderes por todo o mundo estão buscando promover sua sorte política explorando queixas e linhas divisórias, nós temos um papa pedindo ao seu rebanho que faça algo difícil, algo fora de sua zona de conforto, os pressionando para serem mais inclusivos em relação a pessoas gays e divorciadas.

Sim, Francisco foi rejeitado pelos bispos conservadores em um recente sínodo no Vaticano, quando lhes pediu que abraçassem a noção de que "os homossexuais têm dons e qualidades a oferecer à comunidade cristã", acrescentando, "nós somos capazes de acolher estas pessoas, lhes garantindo um espaço fraternal em nossas comunidades?"

Mas, como notou um editorial no "The New York Times", "o simples fato de Francisco ter ordenado aos líderes da Igreja que tratassem desses desafios parece um marco na história do Vaticano". O papa pediu para que o texto rejeitado fosse publicado para que todos vissem, alertando ao mesmo tempo contra "inflexibilidade hostil --isto é, querer se fechar dentro da palavra escrita, não se permitindo ser surpreendido por Deus".

"Inflexibilidade hostil?" Que liderança isso descreve? Veja o comportamento recente de Putin: suas forças armadas foram indiretamente envolvidas no abate de um avião de passageiros malasiano sobre a Ucrânia e sua KGB não apenas está tentando abocanhar um pedaço da Ucrânia, como também está beliscando a Estônia, Geórgia e Moldova, tudo sob a fachada de proteção dos "cidadãos de língua russa".

Eu fui contrário à expansão da OTAN porque acreditava que há poucos problemas globais que podemos resolver sem a ajuda da Rússia. Ao expandir a OTAN após o final da Guerra Fria, quando a Rússia estava fraca, nós ajudamos a cultivar políticos ali que algum dia seriam muito receptivos à mensagem de Putin, de que o Ocidente está conspirando contra a Rússia. Mas, dito isso, a mensagem é uma mentira. O Ocidente não tem a intenção de adicionar a Ucrânia à OTAN. E, por favor, levante a mão se você acha que a União Europeia planeja invadir a Rússia.

Mas Putin explora esses temores por dois motivos. Primeiro, ele tem um grande ressentimento --na verdade, imens-- pela Rússia não ser mais a potência global que já foi. Mas em vez de tornar a Rússia grande de novo, fazendo uso de suas pessoas criativas --as empoderando com educação, Estado de direito e política consensual para concretizarem seu potencial pleno-- ele optou pelo atalho de explorar todos seus poços de petróleo e gás e tirar o poder de sua população.

E em vez de criar uma Rússia que é um exemplo para seus vizinhos, ele faz uso da força bruta que seu petróleo e gás ainda podem comprar. Apesar de criticar a OTAN, o que ele realmente teme é a expansão da União Europeia --que os ucranianos prefiram abraçar o mercado e as regras democráticas da UE em vez de seus laços históricos com a Rússia, porque sabem que por meio da UE, eles podem concretizar potenciais que nunca seriam possíveis com a Rússia.

Ao tomar a Crimeia e incitar o nacionalismo, Putin não estava protegendo a Rússia da OTAN. Ele estava protegendo a si mesmo dos vírus da UE de transparência e prestação de contas, que, caso se estabelecessem na Ucrânia, poderiam se espalhar para Moscou, minando sua cleptocracia.

Normalmente, eu não me importaria, mas quando o mundo está dividido em zonas de ordem e desordem, e o mundo da ordem precisa colaborar para conter e reverter a desordem, o fato de Putin estar incitando a desordem nas fronteiras da Rússia, e não colaborando para promover a ordem no Oriente Médio, é um verdadeiro problema. O que é mais preocupante é que o país que ele mais ameaça é a própria Rússia. Se as coisas piorarem ali --e sua economia já está vergando sob as sanções do Ocidente-- o mundo da desordem ficará bem maior.

Esse é o motivo para a liderança de Putin importar, assim como a do papa. Eu estou focado em Putin porque acho que ele está tornando o mundo um lugar pior por motivos ruins, quando poderia fazer a diferença na Europa e no Oriente Médio com apenas uma pitada de decência e colaboração. Os Estados Unidos também têm muito o que aprender com a humildade do papa, mas diga o que quiser, nós ainda estamos focados em tentar fortalecer os bens comuns globais, seja protegendo as pessoas dos jihadistas no Iraque ou combatendo o ebola na África. Nós poderíamos fazer mais. Putin precisa fazer muito mais.

"Os melhores líderes não estabelecem metas tímidas e egoístas, que são fáceis de serem atingidas, mas sim metas ousadas e inclusivas, que são difíceis de atingir", comentou Timothy Shriver, o presidente das Paraolimpíadas, que acabou de escrever um livro sobre liderança, "Fully Alive: Discovering What Matters Most". "Nós todos estamos procurando formas de entender um mundo sem centro, mas apenas encontraremos isso em pessoas que liderem com humildade autêntica e generosidade despreocupada."