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Próximos passos do czar Putin

Soldados da autoproclamada República de Donetsk ouvem discurso de Putin no rádio - 14.dez.2014 - Vasily Maximov/AFP
Soldados da autoproclamada República de Donetsk ouvem discurso de Putin no rádio Imagem: 14.dez.2014 - Vasily Maximov/AFP

Em Zurique (Suíça)

29/01/2015 00h01

Em março passado, a ex-secretária de Estado americana Hillary Clinton disse, aparentemente, que o ataque do presidente russo Vladimir Putin sobre a Ucrânia, supostamente em defesa dos que falavam russo no país, era exatamente “o que Hitler fez nos anos 30” --usando a presença de alemães para justificar a invasão de terras vizinhas. Na época, eu achei a comparação exagerada. Não acho mais.

Eu endosso a comparação de Clinton puramente pelo efeito de chocar: ela chama a atenção para as coisas horríveis que Putin está fazendo na Ucrânia, sem mencionar o que faz em seu próprio país, cuja classificação de crédito acaba de reduzida para status de lixo.

O uso de tropas russas sem insígnias para invadir a Ucrânia e, secretamente, prestar reforços aos rebeldes ucranianos comprados e pagos por Moscou --tudo disfarçado por uma teia de mentiras que teria feito o propagandista nazista Joseph Goebbels corar-- é o mais feio assalto geopolítico acontecendo no mundo de hoje e tem o propósito de destruir o movimento de reforma da Ucrânia antes que gere um modelo democrático mais atraente para os russos mais do que a cleptocracia de Putin.

A Ucrânia é importante --mais do que a guerra no Iraque contra o EI (Estado Islâmico). Ainda não está claro que a maioria dos nossos aliados na guerra contra o EI compartilham de nossos valores --é um conflito com grandes elementos tribais e sectários. Porém, está inequivocamente claro que os reformadores recém-eleitos da Ucrânia --que estão lutando para se libertar da órbita da Rússia e tornar-se parte do mercado da União Europeia e da comunidade democrática-- partilham dos nossos valores. Se Putin, o Bruto, puder levar a cabo sua aniquilação do novo experimento democrático da Ucrânia e redesenhar, unilateralmente, as fronteiras da Europa, todos os países pró-Ocidente em torno da Rússia estarão em perigo.

“Putin teme uma Ucrânia que exige viver, que quer viver e insiste em viver com valores europeus -com uma sociedade civil robusta e liberdade de expressão e de religião (e) com um sistema de valores que o povo ucraniano escolheu e defendeu com suas vidas”, disse Natalie Jaresko, ministra das Finanças da Ucrânia, em um seminário Ucrânia no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, na semana passada.

Sanções

Os EUA e a Alemanha fizeram um bom trabalho organizando sanções contra a Rússia. Apesar de o governo Obama recentemente ter decidido enviar alguns soldados norte-americanos para a Ucrânia na primavera para treinar a Guarda Nacional ucraniana, eu apoiaria um aumento da nossa ajuda militar ao exército da Ucrânia para que ele possa melhor defender-se de um número estimado de 9.000 soldados que Putin infiltrou no país.

A Ucrânia também precisa de US$ 15 bilhões  (em torno de R$ 40 bilhões) em empréstimos e subsídios no próximo ano para estabilizar sua economia, além do resgate do Fundo Monetário Internacional. Os ucranianos estavam em um buraco profundo, depois de mais de 20 anos de corrupção em níveis industriais, a partir de uma série de maus governos após Kiev tornar-se independente da União Soviética.

A razão para a esperança é que a revolução e as mais recentes eleições na Ucrânia trouxeram uma nova geração de reformadores, que estão transformando os ministérios rapidamente e aprovando leis fiscais e de transparência. Na verdade, ficam satisfeitos em acatar regras de boa governança duras como condição para receber a ajuda ocidental. Mas se eles conseguirem fazer a parte deles, precisamos fazer a nossa.

O secretário do Tesouro, Jack Lew, viajou por toda a Europa nesta semana, em parte para fechar o pacote de ajuda a Kiev. Os EUA já se comprometeram com uma parcela, mas a União Europeia ainda está hesitando. O objetivo de Putin é semear a instabilidade para que o Ocidente refreie a ajuda, de modo que os reformadores da Ucrânia fracassem e fiquem desacreditados. Isso seria uma vergonha.

O financista mundial George Soros, que tem ajudado a promover a reforma ucraniana, disse na reunião de Davos que “há uma nova Ucrânia, que está determinada a ser diferente da antiga... O que a torna única é que não apenas está disposta a lutar, mas também em instaurar um conjunto de reformas radicais. Ela enfrenta a antiga Ucrânia que não desapareceu... e também enfrenta um projeto muito determinado do presidente Putin para desestabilizá-la e destruí-la. Mas está determinada a afirmar a independência e a orientação europeia da nova Ucrânia”.

A Ucrânia também poderia afetar o preço do petróleo. Os dois maiores atores que podem moldar esse preço hoje são o novo rei da Arábia Saudita, Salman, e o czar da Rússia, Putin. Se os sauditas decidirem reduzir a produção de forma significativa, o preço do petróleo vai subir. E se Putin decidir invadir abertamente a Ucrânia, ou pior, um dos Estados bálticos, e ver se a Otan vai realmente defendê-los, o preço do petróleo vai subir.

Com a economia em frangalhos, o governo de Putin hoje é quase inteiramente dependente das exportações de petróleo e gás, de modo que está realmente sofrendo com o colapso do preço do petróleo. As chances de Putin invadir francamente a Ucrânia ou um dos países bálticos são baixas, mas não podemos descartar essa possibilidade.

Disparar uma grande crise geopolítica com a Otan é uma maneira fácil de Putin dar um choque no preço do petróleo. As intervenções secretas de Putin na Ucrânia até agora não conseguiram isso. Em suma: o preço do petróleo de hoje será afetado de forma significativa por dois homens: pelo rei Salman e uso que fará de sua capacidade ociosa de produzir petróleo e o czar Putin e uso que fará de sua capacidade ociosa de produzir problemas.