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Qual é o interesse dos EUA em fechar um acordo com o Irã? E o de Israel?

Thomas L. Friedman

06/03/2015 00h03

Agora que o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, defendeu sua posição a respeito do Irã perante o Congresso, com toda a atmosfera de circo envolvida, vamos às questões sérias: qual é o interesse dos Estados Unidos em fechar um acordo com o Irã? Porque nossos interesses e os de Israel não estão plenamente alinhados. Qual é o mínimo que precisamos para atender nossos interesses? E como devemos equilibrar as críticas às nossas políticas do Bibi sério em comparação às do Bibi cínico?

Aquilo em que os Estados Unidos e Israel concordam, assim como eu, é que o Irã deve ser impedido de produzir uma bomba nuclear, porque ela poderia ser usada para ameaçar o Estado judeu e, assim que colocada em um míssil, também a Europa e os países árabes. Além disso, se o Irã tiver uma bomba, a Arábia Saudita, a Turquia e o Egito certamente ficarão tentados a também tê-la e, de repente, teríamos um Oriente Médio já repleto de guerras sectárias também cheio de armas nucleares –com poucas das salvaguardas dissuasoras que existiam durante a Guerra Fria entre Washington e Moscou. Há atores no Oriente Médio para os quais "destruição mútua assegurada" é um convite para uma festa –não um sistema de dissuasão mútua. Além disso, se o Irã obtiver uma bomba, há uma boa chance de que todo o regime global de não proliferação nuclear, já desgastado, se desfaça totalmente, o que seria altamente desestabilizador.

Aqui, o presidente Barack Obama e Netanyahu compartilham as mesmas preocupações. E, para ser justo, eu duvido que as sanções e negociações que temos hoje com o Irã existiriam se Bibi não tivesse ameaçado dar uma de Dr. Fantástico contra Teerã.

Entretanto, Bibi argumenta que qualquer acordo deve eliminar todas as centrífugas e componentes relacionados do Irã capazes de enriquecer material para uma bomba. Eu não critico o desejo dele. A maioria dos meus amigos israelenses o compartilham. Mas, como Robert Einhorn, um ex-membro da equipe de negociação americana com o Irã, observou em um artigo de opinião no "The Times", essa posição "não é nem viável e nem necessária" para garantir nossa segurança ou as de nossos aliados no Oriente Médio.

Netanyahu nunca apresentou um argumento que convencesse que dar as costas ao acordo de Obama com o Irã resultaria em um acordo melhor, mais sanções ou uma capitulação iraniana– e não uma situação na qual o Irã continuaria no caminho de produção de uma bomba e na qual nossas duas únicas opções seriam viver com isso ou bombardear o país, com todas as consequências nefastas que isso causaria. Nesse sentido, o discurso de Bibi foi perfeito para o Congresso: eu tenho um plano melhor, não custará nada e nem exigirá qualquer sacrifício pelo povo americano. O sujeito poderia ser um congressista.

A posição americana –compartilhada pela China, Rússia, Alemanha, Reino Unido e França– é: dado que o Irã já dominou as técnicas para produzir uma bomba e conseguiu importar todos os componentes para fazê-lo, apesar das sanções, é impossível eliminar a capacidade do Irã de produzir uma bomba. O que é possível é exigir que o Irã retroceda no enriquecimento e outras tecnologias, para que se algum dia o Irã decidir fazer uma bomba, ele precisará de um ano –tempo mais que suficiente para que os Estados Unidos e seus aliados a destruam.

Eu acho que esse acordo seria de interesse dos Estados Unidos se –e apenas se– incluir o Irã concordar com inspeções constantes, intrusivas e não anunciadas a todas as capacidades de produção de bomba e se, mesmo após os 10 anos especificados, houver mais inspeções do que o habitual. Eu também apreciaria se o Congresso acompanhasse o acordo concedendo ao presidente autorização formal –desde já– para usar "quaisquer meios necessários" para responder caso o Irã tente quebrar o acordo.

Essas condições atenderiam as preocupações estratégicas americanas, abrindo ao mesmo tempo a possibilidade –e nada mais– para o Irã se tornar mais integrado ao sistema global. No final, a única salvaguarda contra as ambições nucleares do Irã seria uma mudança interna no caráter do regime iraniano.

Meu problema com Netanyahu é que ele alertou que o acordo interino negociado por Obama com o Irã –que congelou e reverteu parte do programa nuclear do Irã e criou essas negociações– levaria a um colapso das sanções e seria violado pelos iranianos. Nada disso ocorreu.

Além disso, a mensagem de Bibi foi que não há nada mais importante do que dissuadir o Irã. OK. Mas, se essa fosse minha maior prioridade, eu articularia a obtenção de um convite para falar ao Congresso, atraindo apenas o Partido Republicano e o fazendo sem informar o presidente, que está conduzindo as negociações com o Irã? E eu o faria duas semanas antes das eleições israelenses, onde parece que estou usando o Congresso americano como instrumento de propaganda eleitoral, levantando a questão sobre se minha oposição ao Irã é em parte apenas pose política? E se eu precisasse dos europeus ao meu lado para sanções mais duras, eu não anunciaria a suspensão da construção de assentamentos na Cisjordânia, nas áreas que todo mundo sabe que farão parte de qualquer Estado palestino negociado? Essa decisão poderia ser politicamente cara para Bibi junto a sua base, mas certamente aumentaria o apoio a Israel na Europa.

A propósito, Bibi é Churchill em relação a isolar o Irã, mas é um desertor quando se trata de arriscar seu próprio futuro político para garantir que aconteça. Eu tenho um problema com isso. Eu ainda não sei se apoiarei esse acordo com o Irã, mas também tenho um problema com meu próprio Congresso uivando em apoio a um líder estrangeiro falho tentando por a pique as negociações de meu próprio governo antes de serem concluídas. Isso me incomoda demais.

Israel e Estados Unidos discordam sobre acordo com Irã