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Porta-bandeira da Independente ensaia de top e causa polêmica na internet

A porta-bandeira da Independente Jéssica Passos ensaiou de top, com o mestre-sala Cley Ferreira, e foi criticada - Reprodução
A porta-bandeira da Independente Jéssica Passos ensaiou de top, com o mestre-sala Cley Ferreira, e foi criticada Imagem: Reprodução

Daniel Lisboa

Colaboração para o UOL, em São Paulo

17/01/2019 04h00

Jéssica Passos voltou de seu ensaio no Anhembi achando que tinha superado apenas mais uma etapa da preparação rumo ao Carnaval. Ela é porta-bandeira da Independente, que neste ano desfila pelo Grupo de Acesso. Só não contava que precisaria superar também algumas velhas convenções do Carnaval.

Tudo porque sentiu calor e decidiu ensaiar usando um top. Isso aconteceu no último dia 7, segunda-feira retrasada. Dois dias depois, a página do Facebook "Ouvi Dizer", dedicada a comentar o que acontece "de mais curioso" no Carnaval, fez uma postagem com a seguinte pergunta: "Foi liberado porta-bandeira usar top. Pode isso, produção??". 

A questão, aparentemente corriqueira, rendeu debates acalorados na página e mais dois posts sobre o assunto. Outras porta-bandeiras fizeram postagens no Instagram -usando top- em apoio a Jéssica, e a cumprimentaram pela postura ao encontrá-la no Anhembi (veja a lista de ensaios técnicos). Jéssica ainda fez um vídeo na internet tirando um sarro do assunto. 

Quem ainda não entendeu o porquê de tanto barulho precisa conhecer as formalidades do mundo carnavalesco. Em algumas escolas, principalmente nas mais tradicionais, as regras sobre vestimentas podem ser rígidas mesmo em ensaios. Componentes masculinos usando bermudas, por exemplo, nem pensar. Para os mais puristas, seria o equivalente a um advogado aparecer num tribunal de chinelo. Ou uma advogada, de biquíni. 

"Podemos ensaiar de top, de blusinha, do que quisermos. Isso não interfere em nada na nossa dança. O jurado não vai me tirar um décimo porque eu estava ensaiando de top. Já ensaiei assim outras vezes e nunca foi um problema", diz Jéssica. "A gente ensaia num calor violento. Não vou me privar, correr o risco de passar mal. A porta-bandeira tem que vestir o que é mais confortável para ela."

Camila Moreira, porta-bandeira da Morro da Casa Verde - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Camila Moreira, porta-bandeira da Morro da Casa Verde, apoiou Jéssica com um post na internet
Imagem: Reprodução/Instagram
A porta-bandeira argumenta que, no Rio de Janeiro, é comum que suas pares ensaiem usando top e diz que a polêmica só ocorreu por conta de "um desocupado que vai lá no ensaio caçar o que fazer, mas caçou a pessoa errada".

A diretoria da Independente também se posicionou a favor da porta-bandeira. "A escola não viu nada de errado em relação à vestimenta usado no ensaio do Anhembi. Jéssica sempre demonstrou postura e honra ao nosso pavilhão", afirmou Danilo Zamboni, presidente do conselho.

Na postagem do "Ouvi Dizer", embora a quase totalidade das mensagens seja em apoio a Jéssica, houve quem discordasse da "ousadia" da porta-bandeira. "Daqui a uns dias elas vão estar de biquíni, maiô, tapa-sexo. Aí, algumas dizem que é modernidade, assim como dançar de cabelo solto. Acho horrível, mas cada um é cada um, o samba sambou", dizia um comentário. "Acho que calor não é desculpa. A partir do momento que você aceitou ser mestre-sala ou porta-bandeira, você pensou nos ensaios com sol ou com chuva e sabia dos riscos, o importante é manter a postura acima de tudo!", dizia outro.

 Em sua última postagem sobre o assunto, feita anteontem (14), o autor do site, que se apresenta como "educador físico, bailarino, dançarino, coreógrafo, coreógrafo técnico de mestre-sala e porta-bandeira e comissão de frente", dedica dez parágrafos para defender a pertinência da questão. Defende que seu post apenas fez uma pergunta, mas deixa claro que, no seu entender, um "top não caracteriza uma vestimenta de soberania. Isso sem contar o desrespeito com a tradição do quesito."

"Se fosse para eu seguir sempre o padrão, não iria nem ensaiar de tênis, iria sempre de salto", diz Jéssica. "Além da questão das formalidades, acho que meu caso envolveu uma pitada de machismo."

São Paulo