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As profundezas do Universo vistas do deserto mais árido do mundo

12/03/2013 21h09

PLAN¯CIE CHAJNANTOR , Chile, 13 Mar 2013 (AFP) - No deserto mais árido do mundo, a 5.000 metros de altitude, onde o oxigênio é escasso, a vegetação e a umidade são quase inexistentes e a temperatura cai a - 25°C, fica o maior observatório do mundo, denominado ALMA, um verdadeiro paraíso para o mundo científico.

Dez anos atrás, quando surgiu a ideia de construir o radiotelescópio mais potente do mundo, e que finalmente será inaugurado nesta quarta-feira, procurou-se um terreno que fosse alto, tivesse nenhuma ou pouca umidade, muitos dias de sol e um acesso relativamente fácil.

A Planície Chajnantor, situada bem na fronteira entre Chile e Bolívia e próxima do povoado turístico de San Pedro de Atacama, cumpria com todos os requisitos e, em alguns casos, os excedia. Os cientistas tiveram que medir várias vezes a umidade existente porque não se convenciam de que fosse tão baixa. Eles achavam que os instrumentos estavam quebrados, porque não indicavam dados de umidade.

"O que tem de especial neste lugar é que aqui, acima de nossas cabeças, não há praticamente vapor d'água. Há tão pouca que a radiação que chega do objeto celeste, da galáxia ou da estrela, chega sem problemas", contou à AFP o astrônomo do ALMA, Giani Marconi, na Planície Chajnantor.

Pela umidade quase nula, as 66 antenas do ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array, em inglês, ou Grande Conjunto milimétrico/submilimétrico do Atacama) podem captar quase sem perturbação os objetos situados na parte mais escura e distante do Universo, onde se acredita que tenha ocorrido o Big Bang ou grande explosão, no início de tudo.

Mas embora a Planície Chajnantor seja um paraíso para a radioastronomia, também é um ambiente completamente hostil para a vida humana, pelo pouco oxigênio. Além do mais, ali sol e vento castigam.

Planeta sem vida O local "é muito parecido a um planeta sem vida", acrescenta.

A inclemência do clima e do terreno condicionou a construção do projeto ALMA, um empreendimento conjunto de Estados Unidos, Japão e Europa, que será inaugurado com a presença do presidente chileno Sebastián Piñera e outras autoridades.

As antenas, com diâmetro de 7 a 12 metros, as mais precisas já construídas, são capazes de suportar as fortes oscilações do clima desértico e os ventos da altiplanície.

Mas os cientistas que trabalham nesta altitude precisam levar nas costas cilindros de oxigênio, que chega aos seus narizes através de pequenas mangueiras, o que lhes permite trabalhar em condições relativamente normais e fazer frente aos efeitos da altitude, como fadiga e dor de cabeça.

Ali também fica o "Correlacionador", um supercomputador, capaz de processar todos os dados recompilados pelas antenas, com a performance de 3.000 computadores portáteis ao mesmo tempo.

"As antenas recebem dados do céu, os digitalizam, os enviam ao 'Correlacionador' e este processa os dados. Mas a quantidade de dados produzida é tão grande, 36 milhões de amostras por segundo, precisamos de uma máquina especial capaz de digerir esta informação", contou à AFP o engenheiro encarregado, Alejandro Sáez.

O "Correlacionador" é "a máquina de cálculo mais potente que há no mundo", acrescentou. A sala onde fica deve ser mantida a 16 graus e tem proteções anti-sísmicas.

Os dados são transmitidos por fibra óptica até a base do observatório, que se encontra 2.000 metros mais abaixo, e onde trabalham de forma permanente técnicos e cientistas. Assim, é considerado o segundo edifício de maior altura construído no mundo.

O trabalho incessante das antenas Neste ambiente hostil, as antenas funcionam dia e noite.

Diferente dos telescópios ópticos, o ALMA capta comprimentos de onda milimétricas e submilimétricas, invisíveis ao olho humano, que depreendem os diferentes corpos do Universo e que podem recompilar a qualquer hora, sem importar a presença ou não de luz solar.

As antenas podem, ainda, ver através das densas nuvens de gás e poeira que costumam cobrir estrelas ou planetas. E não é só isso: o ALMA também pode analisar quimicamente o espaço, descobrindo e medindo as diferentes moléculas existentes, pilares fundamentais da vida.

"A comunidade científica quer usar o ALMA em suas pesquisas sobre a formação das estrelas, dos planetas e não só no que acontece agora em nosso sistema solar, mas também como o sistema foi criado depois do Big Bang", disse à AFP o diretor do ALMA, Thijs de Graaw.

"É uma revolução na história do Universo no âmbito das ondas milimétricas/submilimétricas, que têm o poder de olhar através das nuvens de poeira e podem se centrar na formação das próprias estrelas. Os telescópios não podem ver o que acontece dentro destas nuvens, com o ALMA podemos, e isso é como abrir uma nova janela", assegurou de Graaw.

O ALMA tem uma vida útil prevista de 30 anos, durante os quais cientistas do mundo todo poderão apresentar seus projetos para utilizá-lo.

"Trata-se do maior projeto de observatório do mundo já realizado até agora", disse Marconi, com orgulho.

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