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Entenda a polêmica em torno das usinas no Madeira

Carolina Glycerio<br>Enviada especial da BBC Brasil a Rondônia

04/12/2007 10h51

O processo de licitação da usina hidrelétrica de Santo Antônio (RO), que deve ocorrer dia 10, foi marcado por polêmicas relacionadas às condições de concorrência e aos impactos ambientais e sociais.

Em 2008, deverá ser licitada uma segunda usina, a de Jirau.

Entenda os debates em torno do projeto.

Por que a iniciativa é tão polêmica?

Ambientalistas e o Ministério Público se dizem preocupados com o impacto da obra sobre uma região tão rica em biodiversidade e sobre as populações ribeirinhas.

Um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) considerou os custos da obra superestimados e, além disso, contratos de exclusividade da Odebrecht com a estatal Furnas e com fornecedores de equipamentos levantaram suspeitas sobre as condições de concorrência.

Críticos também questionam se uma obra desse porte tão longe dos principais centros consumidores de energia seria a melhor opção para o país.

Por que as usinas são importantes?

A capacidade de produção de energia elétrica do país está próxima do limite e existe risco de desabastecimento se a economia crescer de forma mais acelerada.

A garantia de fornecimento de energia futura também dá segurança a empresários que planejam investir no país.

Os defensores do projeto dizem que o Brasil precisa dessa energia e que tem de buscá-la na Amazônia porque é lá que está 60% do potencial hídrico do país.

As novas usinas acabam com o risco de apagão elétrico?

Não acabam com o risco de falta de energia nos próximos anos, mas diminuem os riscos de falta de energia mais para a frente, especialmente a partir de 2012.

Qual são as principais preocupações com o meio ambiente?

Evitar o desaparecimento de determinadas espécies de peixe, que terão a sua rota migratória interrompida pelas barragens, evitar o acúmulo de sedimentos na represa e diminuir o impacto para as populações ribeirinhas que vivem da pesca e da agricultura nas áreas de várzea durante a época da seca.

Qual foi a polêmica em torno da licença ambiental?

O Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) concedeu a licença prévia para os dois empreendimentos em julho deste ano, após ter feito uma série de questionamentos e pedidos de complementação nos estudos de impacto ambiental, concluídos em maio de 2006.

A demora incomodou setores do governo como a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. A licença acabou saindo com 33 condicionantes.

Quais são as condicionantes?

O Ibama exige, por exemplo, que as ensecadeiras (paredões de concreto) construídas durante a obra sejam demolidas, para facilitar o fluxo de sedimentos e larvas de peixes.

Outra condicionante é a construção de um canal artificial para os peixes continuem subindo o rio para se reproduzir.

Também estão previstos programas de monitoramento para avaliar o risco de uma acumulação excessiva de mercúrio nos reservatórios e o dépósito de sedimentos.

Quais são as principais críticas ambientais ao projeto?

Os ambientalistas também dizem que os estudos avaliaram uma parte muito pequena do rio, a do trecho imediatamente afetado pelas usinas, e não permitem antever os efeitos que as obras poderão ter em toda a dinâmica do rio.

Segundo eles, as análises deveriam ter coberto toda a bacia do Madeira.

Como os empreendedores respondem a essas críticas?

O consórcio Furnas Odebrecht, que realizou os estudos de impacto ambiental, afirma que a lei não determinava que o estudo fosse feito em toda a bacia.

Eles dizem ainda que a tecnologia prevista no projeto minimiza o impacto ambiental em relação a outras hidrelétricas.

Como funciona essa tecnologia?

Nas chamadas usinas a fio d'água, as turbinas estão deitadas e são movidas pela correnteza, não por uma queda d'água, o que, segundo o consórcio, não altera muito a velocidade normal da água e por isso reduz a acumulação de matéria orgânica.

Segundo Furnas/Odebrecht, esse sistema torna nulos os riscos de assoreamento do rio e do acúmulo de níveis perigosos de mercúrio.

As hidrelétricas não são consideradas uma fonte de energia limpa?

Alguns ambientalistas questionam isso por causa das emissões de metano que elas geram e do alagamento, que interfere na dinâmica de cheia e seca, da qual dependem diversas espécies.

Além disso, pelo deslocamento de pessoas que essas obras envolvem, o impacto social também é considerado grande. Essa corrente defende usinas menores, com menor impacto no meio ambiente, uso de fontes alternativas de energia como o sol e o vento e diminuição do o desperdício de energia.

Outros dizem que a energia hidrelética ainda é preferível a fontes mais poluentes como o carvão e óleo diesel.

Por que o leilão foi adiado tantas vezes?

O governo argumentava que a concorrência precisava ser assegurada para garantir um menor preço da energia ao consumidor.

Até setembro, o único consórcio que se manifestava interessado em participar da licitação era o formado por Furnas, subsidiária da Eletrobras, com a construtora Norberto Odebrecht.

Outras empresas diziam relutar entrar na disputa por causa de um contrato de exclusividade do consórcio com fornecedores de geradores e turbinas previstos no projeto.

Como essa questão foi resolvida?

A Odebrecht abriu mão do contrato de exclusividade com o argumento de que não queria ser mais responsabilizada pelos atrasos no leilão, embora tenha defendido os contratos como "plenamente legítimos e prática usual de mercado".

Quem vai participar do leilão?

Três consórcios. O primeiro liderado por Furnas/Odebrecht (Consórcio Madeira Energia, com participação de Andrade Gutierrez, Cemig e Fundo de Investimentos, Banif e Santander); o segundo por Chesf e Eletronorte (Consórcio de Empresas Investimentos de Santo Antonio, com participação da CPFL Energia e da Endesa); e o terceiro composto por Suez e Eletrosul.

Como será definido o vencedor?

Será um leilão reverso, ou seja, foi estabelecida uma tarifa-teto de R$ 122 MW/hora e quem apresentar o mesmo preço, desde que cumpra outras condições previstas no edital, ganha o direito de construir e explorar a usina.

Qual é a capacidade das usinas?

Juntas, as duas usinas terão capacidade de produzir 6.450 megawatts - o equivalente a metade da potência de Itaipu e 8% da demanda nacional, de acordo com o governo.

Quando as usinas serão construídas?

A construção de Santo Antônio deverá começar entre o final de 2008 e o início de 2009.

A usina deverá começar a funcionar com capacidade parcial em 2012, de acordo com o cronograma, e com capacidade total em dois ou três anos.

A usina de Jirau deverá ser licitada no início do ano que vem.