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Por que islandeses são apaixonados por erupção de vulcões?

Thora Arnorsdottir*

Serviço de Radiodifusão Nacional da Islândia

08/09/2014 05h19

Quem não se lembra de, quando criança, correr atrás do irmão mais velho e não conseguir alcançá-lo? É assim que me sinto hoje e a razão disso são os vulcões.

Toda manhã, meu alarme toca às 6h e, em vez de ir para o banho, entro em todos os sites que fornecem notícias sobre vulcões na Islândia, minha terra natal. Desde o dia 16 de agosto, estão acontecendo milhares de terremotos na maior calota de gelo da Europa, o Vatnajökull, que cobre 8,8 mil quilômetros quadrados de extensão no sudeste da Islândia.

Cientistas acreditam que a atividade sísmica é causada por uma grande quantidade de magma que se move debaixo da crosta terrestre – provavelmente estão se movendo de um sistema vulcânico para outro.

Uma pequena erupção teve início na semana passada, sofreu interrupção e começou novamente no dia 29 de agosto, com uma força crescente. A fissura fica ao norte da calota de gelo e, por isso, é normal que haja fluxo de lava. Se houver erupção debaixo da geleira, o magma entra em contato com o gelo e explode, liberando cinzas.

As palavras Jökull e cinzas remetem a algo?

"Vulcão, acho que vou te chamar de Kevin". Essa foi a reação do comediante Jon Stewart ao ver os repórteres das principais emissoras do mundo falharem na tentativa de pronunciar o nome do vulcão islandês que arruinou os planos de viagem de milhões de pessoas em abril de 2010.

A imensa nuvem de cinzas causada pela erupção fechou, por seis dias, grande parte do espaço aéreo europeu, levando ao cancelamento de 100 mil voos.

Nem mesmo o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, pôde voar. Ele perdeu o funeral do então presidente da Polônia, assim como a chanceler alemã Angela Merkel e o então presidente francês Nicolas Sarkozy, que também tiveram seus voos cancelados.

Eyjafjallajökull ficou em quarto lugar na lista das dez palavras mais populares de 2010 segundo o ranking da revista Time. No entanto, as companhias aéreas não ficaram nem um pouco felizes: o custo total dos cancelamentos foi estimado em cerca de US$ 1,7 bilhão (R$ 3,8 bilhões).

Agora, somente quatro anos depois do ocorrido, parece que é hora de se preparar para mais transtornos. A atividade geológica acontece em ondas e tudo indica que a Islândia está entrando novamente nesta fase.

A ilha fica no meio da cordilheira do Atlântico Norte e, por isso, está sendo dilacerada. Metade do país está na placa tectônica da América do Norte, enquanto a outra metade se situa na placa euroasiática. Elas se movem um pouco mais de um centímetro por ano em direções opostas. Em 2014, esse deslocamento pode chegar a 50 centímetros.

Isso não significa que a Islândia esteja se dividindo em duas partes, pois sempre emerge magma suficiente para preencher a lacuna. O território do país também não está ficando maior, pois aos poucos o Oceano Atlântico tira pequenos pedaços de terra do litoral.

A teoria é a de que logo abaixo da geleira de Vatnajökull há um ponto de conexão com o manto da Terra. Supostamente, esse é um dos poucos lugares na Terra onde há esse ponto. Essa seria uma das razões pelas quais um terço da lava que corre pelo planeta nos últimos 500 anos tenha origem na Islândia.

Eis a cereja do bolo: o nome do sistema vulcânico em questão é Bardarbunga-Dyngjujokull. Bonito, não? Parece a irmã mais velha de Eyjafjallajökull, aliás "Kevin".

Há uma estranha possibilidade: mesmo que as erupções vulcânicas tenham tido consequências terríveis ao longo dos séculos, os islandeses amam seus vulcões. Muitas pessoas nomeiam seus filhos se inspirando neles, como Hekla e Katla.

Os islandeses respeitam os vulcões. Há algo majestoso sobre eles; é como ter um leão em casa: nós sabemos que são perigosos, mas aprendemos a conviver com eles.

Nosso país é jovem e dinâmico e ainda está sendo moldado pela natureza. Mapas têm de ser modificados de tempos em tempos, por causa dos constantes terremotos, surgimento de novas crateras e das diversas mudanças no litoral e no fluxo dos rios.

Islandeses costumam contar uns aos outros histórias de onde estavam quando ocorreu uma erupção e todos ouvimos o serviço nacional de rádio quando sentimos um abalo, para podermos acompanhar as notícias. Quão grande é? Foi apenas um terremoto ou um aviso de que o Monte Hekla está prestes a entrar em erupção? Seria a vez de Monte Katla agora?

As montanhas ao redor da calota de gelo Vatnajökull foram evacuadas e os poucos milhares de habitantes na região norte, para onde a inundação provavelmente desce, estão em alerta e prontos para sair de suas casas em um instante. Se o magma quente e brilhoso encontrar seu caminho até a superfície sob uma geleira, uma enorme quantidade de gelo vai derreter - e a água tem de ir para algum lugar.

Passei as últimas semanas navegando pela internet e trocando mensagens com meus amigos e parentes: a erupção já começou? A maioria dos estrangeiros pensa que essa atitude é porque estou preocupada com eles, mas esse não é o motivo. A capital, Reykjavik, fica a centenas de quilômetros de distância e é muito improvável que alguém ficasse em perigo por lá.

A razão é egoísta. Estou ansiosa por não estar lá para ver com meus próprios olhos. É ótimo ter a oportunidade de passar um semestre na Universidade de Yale, mas para um repórter da TV islandesa, é quase insuportável pensar que perderei a erupção do Bardarbunga-Dyngjujökull.

Eu acompanho pelas redes sociais a rotina dos meus colegas que estão acampados por lá, seguindo a força da natureza. Novas terras estão sendo criadas e eles estão muito animados com isso.

Neste momento, volto à minha infância, crescendo com quatro irmãos mais velhos e tentando acompanhá-los o mais rápido possível. Enquanto você espera que esta erupção acabe logo e que as cinzas não afetem os voos, meu único desejo é:

Caro sistema vulcânico Bardarbunga, Você pode, por favor, ficar mais calmo e prender a respiração até 15 de dezembro, para que eu, sua fiel admiradora, possa testemunhar seu show espetacular? Atenciosamente, Thora

PS: Os cientistas dizem, agora, que a erupção pode durar anos. Isso é reconfortante. Mais ou menos.

*Thora Arnorsdottir é editora sênior do Serviço de Radiodifusão Nacional da Islândia.