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Quem é o maior descobridor de territórios do mundo... tudo debaixo da terra

Andrew Eavis e um colega observam grande formação rochosa no meio de uma caverna em Guilin, na China - BBC Brasil
Andrew Eavis e um colega observam grande formação rochosa no meio de uma caverna em Guilin, na China Imagem: BBC Brasil

18/09/2015 10h39

O explorador de cavernas britânico Andrew Eavis é tido como a pessoa que descobriu mais territórios no planeta do que qualquer um - só que tudo debaixo da terra. Aos 67 anos, expedições que liderou permitiram a documentação de mais de 520 km de passagens subterrâneas, e o número continua a crescer.

"Na minha opinião, os três lugares que ainda restam a explorar são o espaço, o oceano profundo e as cavernas. E os dois primeiros estão fora do meu alcance", disse Eavis ao programa Outlook, da BBC.

O que move esse engenheiro de minas, que fez fortuna com uma empresa própria de embalagens de plástico, é a possibilidade de ser o primeiro a chegar onde ninguém esteve. "Se tivesse vivido há 200 ou 300 anos, teria adorado explorar países, continentes e ilhas."

A paixão pela espeleologia, o estudo das cavernas, veio ainda na universidade. Sua primeira expedição, parte de uma atividade escolar, foi a geleiras da Noruega em 1969.

Foi quando Eavis percebeu que as cavernas eram muito mais do que os lugares gelados, úmidos e sufocantes que costumam habitar o senso comum. E que existem cavernas gigantes e de grande beleza.

Em cavernas tropicais, a superfície é quente, úmida, claustrofóbica e tomada pelo barulho de insetos. Na verdade, é muito mais agradável no subsolo, que é o oposto disso

Em 1975, Eavis organizou sua primeira expedição, para a Papua-Nova Guiné. Foi uma viagem de seis meses com 24 pessoas, de custo alto para a época (cerca de 80 mil libras esterlinas, ou quase R$ 500 mil) e bastante responsabilidade para um jovem na casa dos 20 anos.

A viagem chamou a atenção da Royal Geographical Society, o principal órgão de estudo da geografia no Reino Unido, que o convidou para uma "oportunidade de ouro", como ele define: uma viagem, em 1978, à ilha de Bornéu, na Malásia.

Ali, no parque nacional Gunung Mulu, apenas cinco pessoas de seu grupo desbravaram mais de 150 km de um dos maiores sistemas de cavernas do mundo.

Tecnologia de ponta

E se naquela época Eavis documentava suas descobertas com fita métrica, inclinômetro e poucos instrumentos, hoje encara as cavernas munido de laptops, baterias e scanners a laser que chegam a custar R$ 600 mil cada um.

Esses equipamentos permitem fazer um levantamento topográfico com precisão em centímetros, revelando os contornos de câmaras tomadas pela escuridão e que podem ter o tamanho de três estádios de Wembley, o famoso campo de Londres.

"Mas fico impressionado ao comparar os resultados de hoje com pesquisas de 40 anos atrás: as medições são parecidas, o que mostra como aquelas pesquisas eram boas", afirmou Eavis, hoje diretor da Associação Britânica de Espeleologia.

O britânico, morador de Hull, uma cidade de 250 mil habitantes no norte da Inglaterra, também foi um dos primeiros ocidentais a desbravar uma das áreas mais importantes do mundo para o estudo das cavernas, a China.

Em 1982, esteve pela primeira vez em Guilin, no úmido sudeste do país, conhecida como a capital chinesa do carste, o relevo típico das cavernas, caracterizado pela ação geológica da água subterrânea sobre rochas solúveis.

"Na China, estive em vilarejos que só são acessíveis por passagens por cavernas. E como (os vilarejos) estão relativamente intocados pela situação moderna, estão em grande parte como há 200, 300 anos", disse.

Eavis abriu caminho para a espeleologia na China numa época em que o país ainda vivia num regime político muito fechado, e seu trabalho e as relações que estabeleceu por lá ajudaram a difundir o interesse pelas cavernas.

Descobri uma caverna (na China) em 2000, voltei três anos depois e tinha um milhão de visitantes

O explorador conta que muitas cavernas na China guardam ruínas de antigas fábricas de sal - substância abundante nesses locais, e que também servia para o preparo da pólvora.

"A China tinha pólvora há 5.000 anos, e isso por causa das cavernas, e hoje ainda usam essa pólvora para abrir estradas (com explosões de rochas) como faziam há 5 mil anos."

Perigos e família

Em quase 50 anos de exploração, Eavis tem a sorte de poder afirmar que nunca se feriu gravemente nessas oportunidades.

"Já passei por tudo que se possa imaginar, mas faço tudo de forma muito controlada. Controlo meu próprio destino, e não entro numa caverna se achar que não possa sair", afirmou.

E ele brinca ao dizer que, apesar de adorar desbravar as profundezas do planeta, gosta também de sair delas, e que a claustrofobia que sente nas ruas durante a época de compras de Natal o incomoda muito mais.

"Os humanos têm grande afinidade com a luz do sol, do dia. Amo cavernas, mas gosto de entrar e sair delas", disse ele, que após quase 50 anos de viagens subterrâneas ainda fala com encanto das belezas naturais e vestígios humanos do mundo das cavernas.

Para ele, a superfície pode ser até mais perigosa - na entrevista ao programa Outlook, da BBC, contou que na semana anterior fora queimado por um raio ao se debruçar na janela de um edifício em Estocolmo para fotografar uma forte tempestade elétrica.

A mulher de Eavis, Lilian, com quem tem três filhos, o acompanha em muitas viagens, mas prefere não se aventurar nas profundezas.

Para ilustrar a relação da família com seu ofício de risco, ele conta que a mulher chegou a decretar o fim da carreira de aventuras dele quando o primeiro filho do casal nasceu, na década de 1970. Mas depois, quando o caçula fez quatro anos, a mesma mulher perguntou quando Eavis o levaria a uma caverna.

Hoje, esse filho mais novo, Robert, segue os passos do pai na espeleologia.

E ainda há muito caminho à frente desse aventureiro: segundo estudiosos do assunto, 90% das cavernas do mundo ainda são território inexplorado.