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Astrônomos flagram nascimento de estrela em disco de poeira cósmica de 'sol gigante'

Ao buscarem planetas em formação, cientistas acabaram se deparando com o nascimento de um nova estrela - J.D.Ilee/Universidade de Leeds
Ao buscarem planetas em formação, cientistas acabaram se deparando com o nascimento de um nova estrela Imagem: J.D.Ilee/Universidade de Leeds

Edison Veiga

De Milão para a BBC News Brasil

14/12/2018 11h00

Ao buscarem planetas em formação, cientistas acabaram se deparando com o nascimento de um nova estrela, em uma das observações mais detalhadas já feitas deste fenômeno até hoje.

Os cientistas estavam só em busca de uma formação semelhante ao nosso Sistema Solar, com o objetivo de encontrar a 11 mil anos-luz da Terra uma jovem estrela com os planetas em formação ao seu redor.

Vale lembrar que em termos astronômicos, ver o céu é sempre observar o passado. Ou seja: ao olhar para um lugar a 11 mil anos-luz da Terra, os cientistas estão observando luzes emitidas há 11 mil anos.

Mas quando os astrônomos analisavam a estrela MM1a e observavam o que estava ao redor dela, tentando compreender a possível formação de planetas em um sistema, tiveram a surpresa: não se tratava de uma estrela, mas de duas. MM1a não está sozinha, tem a companhia da pequena MM1b.

Ou seja: em vez de observarem planetas em formação, acabaram se deparando com o nascimento de uma nova estrela. Esta é a principal conclusão de um estudo publicado nesta sexta no periódico Astrophysical Journal Letters.

"A MM1a é um dos exemplos mais claros de uma jovem estrela massiva que pudemos observar até hoje. De fato, é tão massiva - tem cerca de 40 vezes a massa do nosso Sol - que acreditamos que o disco em torno dela desmoronou sob seu próprio peso, formando a companheira MM1b", explicou à BBC News Brasil o astrônomo John Ilee, pesquisador da Escola de Física e Astronomia da Universidade de Leeds, da Inglaterra.

"Havia muito material disponível no disco em colapso. Em vez de crescer para a massa de um planeta, o MM1b foi capaz de crescer muito mais - para pouco mais de metade da massa do nosso Sol", completa o cientista.

Essas conclusões foram obtidas depois de Ilee e sua equipe chegarem, graças a dados captados pelo radio-observatório Alma, do Chile, a uma das visões mais detalhadas já feitas de uma jovem estrela até hoje.

O nascimento de uma estrelinha

O objeto principal, MM1a é uma jovem estrela massiva cercada por um disco rotativo de gás e poeira. MM1b, descoberta nas proximidades, foi detectada logo depois desse disco rotativo - seria um raro, até o momento, exemplo de sistema binário em que há um disco entre as duas estrelas.

Ilee explica que o sistema está em formação, já que as estrelas são resultantes justamente de aglomerações densas de grandes nuvens de gás e poeira espacial.

"Quando essas nuvens sucumbem à gravidade, elas começam a girar mais rápido, formando um disco ao redor delas. Em estrelas de baixa massa como o nosso Sol, é nesses discos que os planetas podem ser formar", compara o cientista. "No caso observado, estrela e disco são tão massivos que, em vez de testemunhar um planeta se formando no disco, estamos vendo outra estrela nascer."

Para concluir o tamanho de cada estrela, os cientistas mediram a quantidade de radiação emitida e observaram as mudanças sutis na frequência de luz da nuvem de gás. A estimativa é que MM1a pese 40 vezes a massa do nosso Sol. Já a pequena MM1b tem cerca de metade do Sol.

Isto é intrigante. De acordo com Ilee, em sistema binários o mais comum é que ambas as estrelas tenham massas semelhantes - indicando que foram formadas em conjunto. "Encontrar um sistema binário jovem com uma razão de massa de 80 para 1 é muito raro. Isto sugere um processo de formação totalmente diferente para os dois objetos", comenta o astrônomo.

"Um processo assim era previsto apenas em modelos teóricos e computacionais. O conjunto MM1a e MM1b é o primeiro exemplo descoberto 'na natureza' para jovens estrelas", afirma Ilee.

Uma hipótese interessante lançada pelos cientistas é que o sistema pode vir a ter planetas no futuro - mas estes devem gravitar a irmã menor, a MM1b. Eles acreditam que ela também esteja cercada por um próprio disco, com potencial para a formação de astros.

Conforme explica Ilee, estrelas "tão massivas como a MM1a só vive por um milhão de anos antes de explodir em poderosas supernovas". A menor MM1b, por sua vez, tem potencial de formar o próprio sistema planetário no futuro.

O Alma

Sigla para Atacama Large Milimeter Array, o Alma é um rádio-observatório espacial em funcionamento desde 2011 no deserto do Atacama, no Chile.

O conjunto de 66 antenas do Alma permite observar os confins do universo, inclusive galáxias muito distantes - J.D.Ilee/Universidade de Leeds - J.D.Ilee/Universidade de Leeds
O conjunto de 66 antenas do Alma permite observar os confins do universo, inclusive galáxias muito distantes
Imagem: J.D.Ilee/Universidade de Leeds

Está instalado a uma altitude de 5 mil metros e é administrado por uma parceria firmada entre países da Europa, Ásia, América do Norte e o próprio Chile.

O conjunto de 66 antenas - as 54 maiores com 12 metros de diâmetro - permite observar os confins do universo, inclusive galáxias muito distantes. O telescópio começou a ser construído em 2003.

A equipe de Ilee utilizou os 66 pratos das antenas simultaneamente, em um processo que é capaz de simular um único telescópio que teria 4 quilômetros de diâmetro. Em 2019, esse grupo de cientistas deve continuar utilizando o Alma.

"O Alma é capaz de simular o poder de resolução espacial de um telescópio com quilômetros de extensão. Isso nos permite sondar fragmentos extremamente pequenos a grandes distâncias da Terra, detectar a fraca emissão de poeira e gás ao redor dessas jovens estrelas e caracterizá-las em detalhes", diz Ilee.