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Estudioso do ponto G explica por que é tão dífícil criar um Viagra para mulheres

Cristina Almeida<br>Especial para o UOL Ciência e Saúde

17/06/2008 18h11

Dez anos se passaram desde que a mais famosa pílula para combater a disfunção erétil entrou no mercado e ainda não há qualquer sinal de que as mulheres um dia venham a ter um equivalente ao Viagra. Para o professor e sexólogo italiano Emmanuele Jannini, pesquisador do "ponto G" , as pesquisas para desenvolver uma versão feminina do remédio avançam lentamente porque a sexualidade da mulher é mais complexa.

Idealizador do primeiro curso de sexologia de nível superior da Itália, na Universidade de Áquila, Jannini conta que, há seis anos, resolveu investigar a tese de Ernest Gräfenberg sobre a existência de uma zona erógena situada entre a uretra e a vagina. Os estudos tiveram como base os cadáveres de 12 mulheres. Primeiro, constatou-se que as configurações anatômicas femininas variavam: de fato, era possível visualizar o ponto G em algumas delas.

Arquivo pessoal
Para o pesquisador italiano Emmanuele Jannini, é difícil criar um remédio para tratar a disfunção sexual feminina porque, entre outros fatores, as mulheres têm duas portas para o prazer, enquanto os homens têm só um tipo de orgasmo
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INJEÇÕES PARA O PONTO G
DISFUNÇÕES SEXUAIS FEMININAS
A maior descoberta, porém, foi a identificação - nos tecidos examinados - de uma substância conhecida como PDE5, associada à ereção masculina. Segundo Jannini, tal circunstância levou à conclusão de que as condições bioquímicas para atingir o orgasmo poderiam ser comuns entre homens e mulheres. A pesquisa mereceu publicação e suscitou novas investigações.

A segunda etapa dos estudos previa o uso do ultrassom como instrumento de medição do ponto G. As voluntárias eram mulheres de 30 anos, ativas sexualmente. Além da medição exata da variação anatômica, foi possível analisar a correlação existente entre fatores físicos e prazer. Os resultados indicaram a probabilidade de que mulheres com menor espaço entre seus órgãos sejam desprovidas de orgasmos vaginais.

O sexólogo esclarece que o intuito da pesquisa era apenas provar a possibilidade de mensurar o ponto G por meio de um simples exame. Embora tenha alcançado esse fim, seu trabalho foi muito criticado, especialmente em razão da quantidade de amostras coletadas. O número de mulheres examinadas (vinte) era suficiente para demonstrar a possibilidade do uso desse método. Quem criticou meu trabalho, considerando-o pouco importante, infelizmente não leu o conteúdo da pesquisa, que foi publicada em uma prestigiada revista médica", diz Jannini.

Portas para o prazer

Para o médico italiano, é difícil criar um remédio para tratar a disfunção sexual feminina porque, em primeiro lugar, as mulheres têm duas portas para o prazer, enquanto os homens têm só um tipo de orgasmo.

Além desse aspecto, que Jannini considera de natureza objetiva, ele aponta outro, subjetivo, que decorre da perplexidade das mulheres diante de seu próprio corpo: "Mulheres que não têm orgasmos vaginais não acreditam que é possível existir uma conformação anatômica que as faz diferentes das outras".

O especialista exemplifica com um fato ocorrido na publicação de uma reportagem sobre sua pesquisa no jornal francês "Le Figaro": ao lado do artigo, uma intelectual francesa comentava que seu estudo, mais uma vez, reforçava o fato de que as mulheres precisavam de um homem para ter prazer. "Tive vontade de publicar uma nota dizendo que a verdade científica é que nenhuma mulher depende de ninguém para chegar ao clímax, pois todas são dotadas de clitóris!". Esse tipo de reação, acredita o médico, é o que não permite que se chegue mais perto e mais rápido de uma explicação para os mistérios da sexualidade feminina.

Novas pesquisas

Jannini revela que, no momento, está observando se o ponto G muda de acordo com o ciclo hormonal. "O que queremos entender é se, nos casos de menopausa precoce, poderemos usar hormônios para estimular o ponto G", afirma. Parte-se da premissa de que, nesse caso, vagina e clitóris se atrofiam - como conseqüência, a zona erógena estudada também. "Para mulheres que sofrem com a falta de hormônios, talvez haja a esperança de uma solução", acrescenta.

É possível aumentar o ponto G?

Recentemente, médicos dos EUA e até no Brasil passaram a oferecer às pacientes injeções para aumentar o ponto G. A técnica consiste em aumentar essa região ligada ao prazer com colágeno ou ácido hialurônico, com a promessa de facilitar o orgasmo feminino.

Questionado sobre essa possibilidade, Jannini responde que esse tipo de intervenção não tem nenhum fundamento científico: "Não existe uma linha escrita sobre o assunto. Quem vende esse produto, está se utilizando de um assunto polêmico para ter publicidade".

Cartas íntimas

Enquanto muitas perguntas seguem sem respostas, mulheres de todo mundo escrevem para o sexólogo. Algumas buscam explicações para suas dificuldades; outras contam detalhes de sua capacidade orgásmica. A mais curiosa das mensagens foi a de uma jovem portuguesa, 27 anos, que se colocou à disposição da universidade para ser estudada por achar que havia algo errado em seu corpo.

Após a leitura do trabalho de Jannini, ela descobriu que não era doente, apenas apresentava um fenômeno comum em mulheres que têm o ponto G, segundo o médico: a ejaculação durante o orgasmo. Uma habilidade que demonstra a semelhança bioquímica com o prazer masculino mencionada pelo pesquisador, mas que, como tudo o que se refere à sexualidade feminina, ainda não foi bem elucidada.