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NYT: Exame contra câncer em idosos gera debate entre médicos

Por Roni Caryn Rabin<br>The New York Times

14/07/2008 16h58

Como a maioria dos cânceres, o risco de câncer de mama aumenta com a idade. Mesmo que os médicos digam às mulheres para realizarem mamografias anuais depois dos 40, eles muitas vezes aconselham as mulheres com mais de 85 anos a deixar dois ou até três anos entre os exames.

O problema, segundo os médicos, são os dados insuficientes. Triagens clínicas, incluindo aquelas que descobriram que a mamografia salva vidas, tendem a se concentrar em pessoas mais jovens e excluir as mais idosas.

Um estudo recente, que tentou avaliar a utilidade da mamografia para mulheres entre 80 e 90 anos, descobriu que muito poucas mulheres nessa faixa etária, cerca de 20%, se submeteram a exames regulares contra o câncer de mama, mas que aquelas que fizeram o exame, descobriram o câncer cedo o suficiente para evitar a amputação do seio e sobreviver por pelo menos mais cinco anos.

A descoberta é importante, porque a população de pessoas muito velhas está crescendo agudamente, com um aumento quádruplo esperado até 2050. De acordo com o Instituto Nacional sobre o Envelhecimento, dois terços das pessoas acima de 85 anos são mulheres.

Mas o estudo pode levantar mais perguntas que respostas. Alguns especialistas questionam a sugestão de que todas as idosas deveriam realizar mamografias anualmente - uma idéia que aumenta o espectro de frágeis mulheres sendo arrastadas de camas de enfermagem caseiras para serem examinadas contra câncer, quando têm bem mais chances de morrer de uma doença cardíaca ou complicações de uma fratura no quadril.

"Isso nos traz de volta à questão: qual é a meta do cuidado preventivo nos idosos?" diz a Dra. Diana B. Petitti, vice-presidente da Força-Tarefa de Serviços Preventivos dos Estados Unidos. "Em minha opinião, é maximizar a qualidade de vida e a função."

Petitti e outros especialistas em cuidados para os idosos dizem que o foco na mamografia poderia desviar a atenção de problemas mais urgentes, como pressão alta, baixa mobilidade, depressão, dores crônicas e deficiência na visão e na audição.

Os direcionamentos da força-tarefa não definem uma idade de corte para a mamografia, mas recomendam que se leve em consideração as outras doenças do paciente quando optar por um exame.

O estudo da mamografia, publicado em maio no "Journal of Clinical Oncology", analisou os registros de mais de 12.000 pacientes com mais de 80 anos que receberam diagnósticos de câncer de mama de 1996 a 2002. Descobriu-se também que, entre as que fizeram uma mamografia a cada um ou dois anos antes do diagnóstico, 68% descobriram o câncer em um estágio inicial, comparado a 33% daquelas que faltaram aos exames.

Cinco anos depois do diagnóstico de câncer de mama, 75% das pacientes freqüentemente examinadas estavam vivas, contra apenas 48% daquelas que não haviam sido examinadas durante pelo menos cinco anos antes que seu câncer fosse descoberto.

Mas aquelas que tiveram mamografias freqüentes não apenas tinham mais chances de sobreviver ao câncer, dizem os autores do estudo, mas também de sobreviver a outras doenças, significando que elas poderiam simplesmente ser mais saudáveis desde o início.

"Elas poderiam estar sobrevivendo por serem mais saudáveis, e não porque fizeram o exame", diz a Dra. Gildy V. Babiera, autora do estudo e professora associada de oncologia cirúrgica no Centro de Câncer M.D. Anderson da Universidade do Texas, em Houston. "Mulheres saudáveis estavam fazendo mais mamografias, por serem capazes de ir até o local e se submeter ao procedimento. E elas também podiam resistir ao tratamento contra o câncer."

Babiera diz ter se interessado pelo assunto quando percebeu que um número crescente de pacientes na faixa dos 80 anos estava indo a ela em busca de tratamento contra o câncer de mama.

"Quando vejo uma paciente com câncer avançado que tem 80 anos ou mais e tem diversas outras doenças, eu penso, 'E se ela tivesse feito uma mamografia antes?'" diz ela. "E então ela poderia ter retirado o caroço, em vez de uma amputação e dissecação do nó de linfa, que são muito diferentes em termos de cirurgia e tempo de recuperação."

Cerca de 17% dos cânceres de mama são diagnosticados em mulheres com mais de 80 anos. Mas como as mulheres com mais de 74 não foram incluídas em nenhum exame médico randômico ou mamografia, as organizações que definem os tratamentos para mulheres idosas tiveram de inferir nos estudos de mulheres mais jovens, tornando as conclusões inconsistentes e até mesmo contraditórias.

A Força-Tarefa de Serviços Preventivos recomenda uma mamografia a cada um ou dois anos, enquanto a Sociedade Geriátrica Americana fala em uma a cada dois ou três anos para mulheres acima de 75 anos, se a expectativa de vida é de pelo menos quatro anos. A Sociedade Americana de Câncer sugere mamografias anuais para todas as mulheres acima de 40 anos e com boa saúde.

"Uma mulher com 70 ainda tem, em média, perto de 19 anos de vida," diz Robert A. Smith, o diretor da sociedade dos exames contra o câncer. "Contanto que esteja com boa saúde e seja candidata a tratamento caso fosse diagnosticada, ela deveria continuar a fazer mamografias."

Mas alguns médicos especializados no tratamento a mulheres idosas são críticos de tais recomendações, argumentando que os exames deveriam focar em mulheres com uma expectativa de vida de pelo menos cinco anos, que têm maiores chances de se beneficiar. Poucas mulheres com seus 80 anos realmente morre de câncer de mama, que geralmente progride mais de forma mais lenta em mulheres mais velhas.

"Menos de 2% das mulheres com mais de 80 anos morrem de câncer de mama", diz a Dra. Mara A. Schonberg, professora de medicina em Harvard que realiza pesquisas sobre mamografia e cuidados preventivos para idosas. "Há um momento para iniciar os exames e outro para parar - você não começa no nascimento e continua examinando até a morte."

Schonberg acrescenta que o estudo deveria ter mais a dizer sobre as desvantagens do exame, como a ansiedade com os testes, a possibilidade de falsos positivos levarem a procedimentos desnecessários e o risco mais alto para pacientes idosos em relação à cirurgia e anestesia.

O tempo limitado de um clínico geral com pacientes mais velhos seria mais bem usado, diz Schonberg, encorajando-os a fazer exercícios e tomar suas vacinas, e discutindo problemas que podem interferir com seu dia a dia, como incontinência, quedas e a necessidade de manter os laços sociais.

A Dra. Louise C. Walter, médica de equipe no Centro Médico Veterans Affairs de São Francisco, que realiza pesquisas sobre o exame de câncer em idosos, concorda.

"O maior dano potencial é que uma paciente com demência ou falha congestiva no coração pode fazer uma mamografia, seguida de uma biópsia ou outro procedimento com alto risco de complicações", diz ela. "E depois, seja por todos os distúrbios ou pelo curso natural dos eventos, ela morra da doença que já tinha antes. E passe o último ano de sua vida fazendo todos os tipos de procedimentos, quando poderíamos ter melhorado sua qualidade de vida."