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Lei antifumo diminui risco de recaídas para quem decidiu parar, diz médica

Tatiana Pronin<br>Editora do UOL Ciência e Saúde<br>Em São Paulo

07/08/2009 07h00

Embora tenha sido criada para proteger a saúde de quem não fuma, a lei que proíbe o cigarro em áreas fechadas de uso coletivo, como bares e restaurantes, deve fazer com que mais fumantes procurem tratamento para abandonar o vício. É o que afirmam especialistas ouvidos pelo UOL Ciência e Saúde.

Pesquisas indicam que mais de 80% dos fumantes querem abandonar o vício. Para a psiquiatra Analice Giglioti, presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e Outras Drogas (Abead), a lei vai beneficiar especialmente aqueles que veem nos encontros sociais uma oportunidade de recaída.

A médica lembra que a bebida está associada ao cigarro para boa parte dos fumantes. "Isso acontece porque o álcool deprime o sistema nervoso, enquanto a nicotina é um estimulante, e diminui o PH do sangue, o que reduz a disponibilidade de nicotina e aumenta a vontade de fumar", explica. Além disso, os drinques diminuem a autocensura, o que faz a pessoa perder controle sobre a quantidade de cigarros consumidos.

Desestímulo aos jovens

Giglioti também acredita que esse tipo de restrição tem impacto para os jovens, que deixam de encarar o fumo como algo natural. Opinião que é dividida com a psiquiatra Célia Lídia da Costa, coordenadora do Grupo de Apoio ao Tabagista do Hospital A.C.Camargo. "O jovem gosta de transgredir, mas também tem receio das drogas ilícitas, por isso opta pelo cigarro, que é mais aceitável", comenta. Todo movimento contra a ideia de que o tabaco é uma droga mais leve, portanto, pode fazer o adolescente pensar melhor antes de dar o primeiro trago, na opinião da psiquiatra.

Costa reforça que o tabagismo ainda é visto como uma questão de força vontade, o que é um mito. "Fumar causa uma dependência química comparável à de cocaína, e ainda há a dependência psicológica", descreve. Por isso, os tratamentos considerados de primeira linha para abandonar o vício incluem não apenas medicamentos, mas também psicoterapia.

As especialistas, assim como o pneumologista Gustavo Prado, que atua nos grupos de cessação de tabagismo do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo e do Instituto do Coração, contam que a lei antifumo tem gerado reações positivas entre os pacientes atendidos por eles.

"Boa parte das pessoas que trabalham em bares, restaurantes, hotéis e afins não fuma, e elas agora têm a garantia legal de que o ambiente em que trabalham é protegido dessa poluição", observa, ainda, Prado. "Separar mesas para fumantes e não fumantes em um restaurante é a mesma coisa que dividir raias para urinadores e não urinadores em uma piscina", garante.

O médico diz que diversas cidades da Califórnia, nos Estados Unidos, e da Irlanda (cuja restrição ao consumo de cigarros em ambientes públicos já existe há vários anos) já registraram diminuição do número de eventos cardiovasculares agudos, como infartos, angina e mortes súbitas. E, segundo ele, não houve diminuição da frequência do público nos estabelecimentos.

Repositores de nicotina

Muita gente se pergunta se a proibição não fará com que as pessoas passem a fumar em dobro antes de entrar no bar, ou quando deixarem o restaurante. Para o pneumologista, isso já acontece em outras situações, como antes de entrar no cinema, no avião, ou mesmo antes de dormir. É um reflexo ligado aos sintomas da abstinência, que são desagradáveis.

Levar uma goma de nicotina para o restaurante pode trazer algum alívio para quem ainda não decidiu parar? Prado concorda que a medida pode ajudar os fumantes a sentirem menos desconforto nos locais onde a proibição vigora. "Esses produtos têm venda livre e são bastante seguros, exceto para pessoas com problemas cardíacos graves", avalia. Mas ele sugere que um médico seja consultado antes, se possível.

Já a psiquiatra do Hospital A.C.Camargo alerta que, se o indivíduo fuma e ainda começa a usar repositores de nicotina, a dependência pode até ser agravada. Buscar orientação para aliviar a aflição de ficar sem o cigarro, portanto, é a melhor alternativa.