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Inventor cria óculos que permite ao usuário mudar o foco conforme o uso

John Markoff<br>The New York Times

12/08/2009 20h25

Como promissor aluno de graduação em física aplicada da Caltech, Stephen Kurtin poderia ter aceitado uma oferta de emprego na Intel, no alvorecer da microeletrônica, 40 anos atrás. Em vez disso, ele seguiu o caminho do inventor solitário, obtendo mais de 30 patentes em campos que variam de softwares de processamento de texto a sistemas sonoros, culminando no par de óculos descansando em seu nariz - que, segundo acreditava, poderia livrar quase dois bilhões de pessoas em todo o mundo de bifocais, trifocais e lentes progressivas.

Michal Czerwonka/The New York Times
Stephen Kurtin com elemento que faz parte de seu óculos com foco ajustável
UOL CIÊNCIA E SAÚDE
Os óculos possuem um minúsculo indicador ajustável na ponte da armação, o que permite focar alternadamente a página de um livro, uma tela de computador ou uma montanha ao longe.

Kurtin, de 64 anos, passou quase 20 anos de sua carreira numa busca para criar óculos melhores para indivíduos que sofrem de presbiopia - a condição que afeta quase todas as pessoas acima dos 40 anos, à medida que elas progressivamente perdem a habilidade de focar objetos próximos.

Após muito becos sem saída, ele obteve sucesso em criar óculos com um foco mecanicamente ajustável. O inventor diz que eles são melhores que outros óculos, e que algumas formas da cirurgia Lasik. O advento também traz uma intrigante expressão de moda: um pouco de Harry Potter com uma pitada de "A Vingança dos Nerds".

Kurtin realizou sua pesquisa de graduação em física aplicada para Carver A. Mead, pioneiro da indústria e físico. Mais tarde, uma série de suas inovações em tecnologia de software levou ao Lexitron Videotype, o primeiro processador de texto Wysiwyg independente. Ele ainda criou uma versão inicial de um sistema de som surround para a Advent, uma fabricante de altofalantes.

A cruzada dos óculos é sua paixão desde 1992. Neste mês, a TruFocals, empresa fundada por ele três anos atrás, começou a comercializar seus primeiros óculos de foco ajustável, através de um pequeno grupo de oftalmologistas, e logo iniciará a venda online. Kurtin disse que, junto com sua esposa, já investiu milhões de dólares no projeto. Ele contou que investidores privados, incluindo Jonathan Seybold, publisher da indústria de computadores, investiram outros tantos milhões.

A invenção das lentes bifocais é creditada a Benjamin Franklin, que foram desenhadas usando um incomum par de óculos desde 1764. Desde então, a chegada de avanços significativos tem sido muito lenta. Os bifocais foram seguidos pelos trifocais, e então, logo após a virada do século 20, pelas lentes progressivas, que eliminam as linhas visíveis associadas às bifocais.

"Por mais de 140 anos, o foco ajustável tem sido reconhecido como o Santo Graal da presbiopia", disse Kurtin, referindo-se à terça parte da população que perdeu alguma ou toda a capacidade de focar em objetos próximos. Porém, existe uma razão para o não-surgimento de alternativas melhores: "Trata-se de um problema extremamente difícil", disse ele.

A ideia de uma lente fluida, cujo plano focal possa ser mecanicamente ajustado, remete a uma patente de 1866, emitida a D.A. Woodward, um inventor de Baltimore. Desde então, houve várias tentativas de comercializar a tecnologia, mas nenhuma delas atingiu todos os critérios para o sucesso. As lentes precisam ser finas, leves, duráveis e facilmente ajustáveis. Há muitos anos, Kurtin teve sua visão. Uma lente frontal removível magneticamente presa criaria um sistema compacto e durável.

Outros conduziram pesquisas com abordagens que não envolvem um fluido, como sistemas de lentes e tecnologias eletro-óticas. Em 1964, por exemplo, Luis W. Alvarez, ganhador do Nobel de física em 1968, projetou uma lente de duas partes que alterava o foco ao deslizar dois componentes de vidro com formatos de selas opostas através uma da outra.
Muitos esforços internacionais estão em progresso para adaptar as duas abordagens às 1,3 bilhões de pessoas na base da pirâmide econômica - o número estimado pela Organização Mundial da Saúde para pessoas sem acesso a óculos. Tanto o Centro para Visão no Mundo em Desenvolvimento, em Oxford, na Inglaterra, quanto o U-Specs, em Amsterdã, trabalham em óculos capazes de serem distribuídos por uma fração de seu preço no mundo desenvolvido.

Os óculos TruFocals, vendidos a 895 dólares, foram os primeiros disponíveis comercialmente nos Estados Unidos. Os óculos consistem numa lente comparável, em espessura, às lentes de óculos comerciais, mas possui três componentes: um vidro por trás, uma membrana interna cheia de fluido - essencialmente um pedaço de material parecido com plástico, esticado através de um círculo cuja curvatura de superfície pode ser alterada mecanicamente -, e lentes exteriores presas com ímãs à armação. Para mudar o foco, o usuário move uma peça na ponte.

A lente TruFocals precisa ser redonda, para garantir que a curvatura das lentes internas esteja correta, mas os fundadores da empresa não consideram o formato um obstáculo de moda. Os TruFocals vêm em armação unissex, e numa variedade de cores.

Mesmo se os TruFocals não forem aceitos como óculos para todos os usos, eles podem encontrar mercado para um grupo diferente de usuários, como trabalhadores de escritórios que usam computador e também leem livros, revistas ou jornais, ou pessoas com alguma doença que altere sua visão.
"Isso não vai abrir todo o mercado, mas eles não precisam fazer isso", disse Eli Peli, professor de oftalmologia da Escola de Medicina de Harvard e investidor do TruFocals. Por enquanto, o TruFocals tem o mercado só para ele, mas pode haver concorrência no próximo ano.

A PixelOptics, empresa de Roanoke, Virgínia, vem buscando uma abordagem eletro-ótica, capaz de utilizar uma tecnologia similar a um dispositivo LCD para alterar o índice refrativo de um componente transparente, que a empresa encaixará nas lentes convencionais.

A princípio, isso tornará a tecnologia acessível em muitas armações e formatos. O objetivo é um sistema que determine automaticamente o foco usando um acelerômetro, um sensor que mede alterações em movimento, explica Ronald Bloom, fundador da empresa. O sistema precisaria de recarga a cada dois ou três dias. A empresa ainda não divulgou detalhes sobre o preço dessa tecnologia, mas afirmou que já está em teste de uso.

Kurtin está introduzindo seu produto lentamente no mercado, mas está esperançoso de que sua nova moda pegará. Ele afirma que, quando os membros da família de um de seus investidores se reúnem, eles brincam que se parecem um pouco com o fã-clube da banda Devo.

Tradução: Pedro Kuyumjian