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Tecnologia reduz para US$ 50 mil o custo de decodificação de um genoma

Nicholas Wade<br>The New York Times

19/08/2009 16h26

Um engenheiro de Stanford inventou uma nova tecnologia para decodificação de DNA, e a usou para decodificar seu próprio genoma - gastando menos de 50 mil dólares.

O engenheiro, Stephen R. Quake, diz que o baixo custo irá "democratizar o acesso aos frutos da revolução do genoma", ao permitir que muitos laboratórios e hospitais decodifiquem genomas humanos inteiros.

Até agora, somente empresas ou centros de sequenciamento de genomas, equipados com grandes equipes e centenas de máquinas, eram capazes de decifrar as três bilhões de unidades de um genoma humano.

A máquina de Quake, chamada Sequenciador Heliscope de Molécula Única, consegue decodificar ou sequenciar um genoma humano em quatro semanas, com uma equipe de três pessoas. O aparelho é fabricado por uma empresa fundada por ele, a Helicos Biosciences, e custa "cerca de um milhão de dólares, dependendo do quanto você pechincha", disse ele.

Apenas sete genomas humanos foram totalmente sequenciados: o de J. Craig Venter, pioneiro da decodificação de DNA; o de James D. Watson, co-descobridor da dupla-hélice do DNA; dois coreanos; um chinês; um iorubá; e o de uma vítima de leucemia. O de Quake parece ser o oitavo genoma humano completo, sem contar o mosaico de indivíduos cujos genomas foram decifrados no Projeto Genoma Humano.

Um artigo descrevendo a decodificação do genoma de Quake, divulgado na última segunda-feira na publicação Nature Biotechnology, mostra o grau de sobreposição entre as variações de DNA em seu próprio genoma e aquelas nos de Venter e Watson.

Durante muitos anos, o DNA era sequenciado por um método desenvolvido por Frederick Sanger, em 1975, e usado para organizar a sequência do primeiro genoma humano em 2003, a um custo provável de pelo menos US$ 500 mil. Diversas tecnologias de sequenciamento de última geração são desenvolvidas e constantemente aprimorados a cada ano. A tecnologia de Quake é uma nova entrada nessa corrida.

Quake calcula que o último genoma humano sequenciado tenha custado US$ 250 mil para ser decodificado, e que este aparelho leva o custo a menos de um quinto desse valor.

Existem quatro tecnologias comerciais, nada é estático e todas as plataformas estão melhorando num fator de dois por ano", disse ele. "Estamos prestes a ver os portões sendo abertos e muitos genomas humanos sendo sequenciados".

Ele conta que a amplamente discutida meta de mil dólares por genoma pode ser atingida em dois ou três anos. Esse é o custo, como especialistas já preveem há muito tempo, pelo qual o sequenciamento de genomas poderia começar a se tornar rotineiro na prática da medicina.

O impedimento do uso médico dos genomas, entretanto, está rapidamente ligado não ao avanço tecnológico, mas a habilidade de compreender e interpretar o que a tecnologia revela.

A jornada para descobrir as raízes genéticas de doenças complexas, como câncer, diabetes ou Alzheimer, um objetivo crucial do Projeto Genoma Humano, emperrou recentemente. A maioria dessas doenças, no final das contas, é causada não por algumas variantes em comum, como esperavam muitos biólogos, mas por um número incontrolável de raras variáveis, que não oferecem um alvo claro para medicamentos ou diagnósticos.

Essa complexidade genética atrapalhou muitos planos da medicina personalizada, pois, para doenças e comportamentos complexos, não existe uma maneira óbvia de prever a condição de uma pessoa a partir de sua sequência de DNA.

Existe um conhecimento muito mais profundo a respeito da base genética de muitas doenças simples - as que são causadas por uma única variante genética -, mas a maioria dessas doenças é rara e corresponde a uma pequena fração do peso geral da disfunção.

Ainda assim, pessoas tentando analisar sua própria sequência DNA têm chance de encontrar uma ou mais das variantes de doenças de genes únicos, pois essas são as únicas compreendidas até agora.

Quake disse que analistas estavam anotando seu genoma e descobriram uma variante associada a doenças de coração. Felizmente, Quake herdou essa variante apenas de um de seus pais; a outra cópia do gene é boa.

"Você precisa ter um estômago forte quando olha para seu próprio genoma", disse.

Quake disse estar tornando pública a sequência de seu genoma, como fizeram Venter e Watson, para acelerar o avanço do conhecimento.

"Cientistas possuem uma forte ética para compartilhar dados", disse ele. "Os genomas de Venter e Watson foram incrivelmente úteis na análise do meu, e espero que o meu tenha a mesma utilidade para outras pessoas".

Alguns peritos acreditam que a solução ao atual impasse para compreender as raízes de doenças complexas residirá no sequenciamento de genomas completos de muitas pessoas, incluindo indivíduos que sofrem doenças específicas. Métodos mais baratos de sequenciamento devem ajudar com esse objetivo.

George Church, um dos principais biotecnólogos da Escola de Medicina de Harvard, diz que, para a genética clínica, as sequências de DNA precisam ser decodificadas com uma precisão de apenas um erro para cada 10 mil a 100 mil unidades de DNA. Já Quake afirma que sua máquina possui uma precisão de um erro para cada 20 mil unidades.

Uma verdadeira revolução na tecnologia, segundo Church, seria a habilidade de sequenciar um genoma humano por US$ 5 mil com uma precisão de um erro a cada 100 mil unidades.

A máquina de sequenciamento de Quake, aproximadamente do tamanho de uma geladeira, funciona dividindo a dupla-hélice do DNA em tiras únicas e quebrando essas tiras em fragmentos menores que, na média, correspondem a 32 unidades de DNA em comprimento.

Os pedaços de DNA são, em seguida, capturados num vidro. Em cada uma dessas tiras amarradas é construída uma nova hélice, unidade por unidade, de modo a gerar luz. A adição de cada unidade é registrada por um microscópio na máquina, que pode acompanhar um bilhão de fragmentos de DNA por vez. Como as duas tiras de uma dupla-hélice de DNA são complementares, a sequência de novas unidades que se une a cada tira em crescimento revela a identidade das unidades na tira amarrada.

Então, um programa de computador compara os bilhões de fragmentos de 32 unidades aos genomas humanos completos já registrados, e grava os locais onde há adições ou apagamentos à sequência padrão, ou uma unidade de DNA distinta daquela mais comum na população. A coleção completa dessas diferenças é o que torna cada indivíduo único.

Tradução: Pedro Kuyumjian