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Terapia trata traumas com movimento dos olhos

Por Cristina Almeida

Especial para o UOL Ciência e Saúde

16/12/2009 11h00

Quem foi sequestrado, assaltado, sofreu algum tipo de violência na idade adulta ou na infância sabe: dores psicológicas duram e comprometem substancialmente a qualidade de vida. Para muitas pessoas, o mal-estar pode ser tão profundo, que nem mesmo a clássica terapia e o uso de antidepressivos garantem o alívio dos sintomas. Mas uma nova técnica terapêutica, baseada no estímulo bilateral dos hemisférios cerebrais, pode ser a esperança para vencer esses traumas: trata-se da Eye Movement Desensitization and Reprocessing [Dessensibilização e Reprocessamento por meio dos Movimentos Oculares], ou EMDR.

A terapia conta 20 anos e foi descoberta por acaso pela psicóloga americana Francine Shapiro. Ela conta que, enquanto fazia uma caminhada e meditava sobre seus problemas, percebeu que as emoções desagradáveis que sentia diminuíam após a movimentação rápida e espontânea dos olhos.

 

Divulgação
A psicóloga Esly Carvalho, representante do EMDR Institute no Brasil, durante sessão
ENTENDA COMO SÃO AS SESSÕES
TERAPIA É ÚTIL PARA DEPRESSÃO
UOL CIÊNCIA E SAÚDE

Convencida de que o fenômeno tinha relação com o movimento ocular realizado durante o sono (REM), Shapiro passou a pesquisar e a testar a prática, agregando-lhe outros estímulos duplos de atenção: “O objetivo era focar um estímulo externo, ao mesmo tempo em que a causa de determinada angústia fosse acessada internamente”.

Os resultados obtidos pela psicóloga deram origem à EMDR, terapia hoje reconhecida por instituições como  Associação Americana de Psiquiatria e o Departamento de Defesa dos EUA e é indicada especialmente para o tratamento do Transtorno do Estresse Pós-Traumático (TEPT).

Novo paradigma

A psicóloga clínica Esly Carvalho é representante brasileira do EMDR Institute e Presidente da EMDR Treinamento e Consultoria, afirma considerar o Reprocessamento um novo paradigma terapêutico: “Ao contrário das terapias tradicionais, não há exigência de que o paciente fale muito e os resultados são mais rápidos. A explicação para isso é que a técnica reproduz uma ação orgânica natural”.

A psicóloga diz que “Processar informações é uma atividade espontânea do cérebro, mas diante de uma situação traumática, esse processo fica prejudicado, dando oportunidade às reações disfuncionais. Os estímulos rítmicos e bilaterais da EMDR acionam o sistema cerebral, possibilitando a reorganização dos componentes causadores das memórias negativas e dando às emoções um significado mais positivo”.

Embora a experiência comprove os benefícios da terapia, ela tem sido objeto de discussões no meio científico, pois ainda não há consenso sobre como ela opera na diminuição ou desaparecimento do trauma. Shapiro revela que uma das teorias confirma sua tese sobre o movimento noturno dos olhos. “As experiências diárias, incluídas as desagradáveis, são processadas durante os sonhos. Mover os olhos na prática da EMDR reproduz exatamente esse processo”, explica a especialista.

Outra tese credita aos movimentos bilaterais o mérito pelo estímulo dos dois hemisférios cerebrais (verbal e não verbal), que facilitariam o reprocessamento. Supõe-se, também, que a prática ajuda o paciente a lidar melhor com seus pensamentos negativos, reduzindo a carga de ansiedade. Segundo a APA, a despeito da eficácia da EMDR, mais pesquisas precisam ser feitas para que se entenda como ela atua.

Já são mil os profissionais credenciados no território nacional: “Segundo o modelo americano, somente psicólogos e psiquiatras têm condições de aplicar a técnica com segurança”, revela a especialista. A psicóloga clínica Silvia Malamud, do Instituto Sedes Sapientiae, explica que esse critério se justifica, porque a prática é contraindicada em certos casos de transtornos psicológicos ou neurológicos. Assim, os profissionais precisam ser capazes de identificar as pessoas que não podem ser submetidas à terapia.