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Cientistas tentam defender trabalhos sobre o clima

Por John M. Broder

New York Times News Service

31/03/2010 19h15

Há meses cientistas do clima sofrem críticas cruéis na mídia e na internet, acusados de esconder dados, cobrir erros e suprimir visões alternativas. Sua reposta até agora tem sido, em grande, parte, insistir na legitimidade de seu vasto corpo de ciência climática e ridicularizar seus críticos, chamando-os de esquisitos e desinformados.

No entanto, o volume de críticas e a profundidade da dúvida só cresceram. Muitos cientistas hoje se dão conta de estarem enfrentando uma crise de confiança pública e de terem de rebatê-la. Temporariamente e a contragosto, eles estão começando a envolver seus críticos, admitir erros, abrir dados e remodelar a forma como conduzem seu trabalho.

A liberação não autorizada, no último outono, de centenas de mensagens de e-mail de um grande centro de pesquisa sobre o clima na Inglaterra, e, mais recentemente, revelações de um punhado de erros num suposto relatório confiável das Nações Unidas sobre a mudança climática, criaram o que vários cientistas importantes afirmam ser uma grande quebra de confiança em sua pesquisa. Eles afirmam que essa agitação ameaça minar décadas de trabalho e tem prejudicado enormemente a confiança do público na atividade científica.

O episódio do e-mail, chamado de “climategate” por alguns críticos, revelou a arrogância e o que um importante pesquisador do clima chamou de “tribalismo” entre alguns cientistas. A correspondência parece mostrar esforços para limitar a publicação de opiniões contrárias. O conteúdo das mensagens deu margens a alguns cientistas conhecidos de sofrerem acusações de esconder dados de temperatura de pesquisadores rivais e manipular resultados para estarem em conformidade com conclusões pré-estabelecidas.

“Eu obviamente escrevi alguns e-mails terríveis”, disse Phil Jones, britânico cientista do clima que está no centro da controvérsia, em confissão recente a um comitê especial do Parlamento. Mas ele discordou veementemente de acusações de que ele teria escondido dados ou falsificado resultados.

Algumas das alegações mais sérias contra Jones, diretor da unidade de pesquisa climática da University of East Anglia, e outros pesquisadores foram derrubadas, embora várias investigações ainda estejam a caminho para determinar se outros estiveram envolvidos.

No entanto, danos sérios já foram causados. Uma pesquisa conduzida no final de dezembro pela Universidade de Yale e pela George Mason University descobriu que o número de americanos que acreditava que a mudança climática era uma enganação ou conspiração científica mais que dobrou desde 2008, de 7% da população para 16%. Adicionais 13% dos americanos disseram achar que, mesmo que o planeta esteja esquentando, isso seria resultado de fatores naturais apenas e não representaria uma preocupação significativa.

Cientistas do clima foram balançados pelas críticas e agora estão começando a buscar formas de recuperar sua reputação. Eles estão aprendendo um pouco de humildade e tentando evitar ao máximo cruzar a linha para a defesa de diretrizes.

“Está claro que a comunidade científica do clima simplesmente não estava preparada para a escala e ferocidade dos ataques, e simplesmente não responderam de forma rápida e adequada”, afirmou Peter C. Frumhoff, ecologista e cientista-chefe da Union of Concerned Scientists. “Precisamos reconhecer os erros e ajudar a mudar o foco das atenções, do que está acontecendo na blogosfera para o que está acontecendo na atmosfera”.

Várias instituições estão iniciando esforços para melhorar a qualidade de sua ciência e tornar seu trabalho mais transparente. A agência britânica oficial do clima está realizando uma revisão completa de seus dados de temperatura e irá tornar públicos seus registros e análises pela primeira vez, permitindo análises detalhadas por parte de terceiros em relações a métodos e conclusões. O painel das Nações Unidas de mudança climática irá aceitar supervisão externa de suas práticas de pesquisa, também pela primeira vez.

Duas universidades estão investigando o trabalho de importantes cientistas do clima para determinar se eles violaram padrões acadêmicos e minaram a crença na ciência. A National Academy of Sciences está se preparando para publicar um artigo não técnico salientando o que se sabe – e o que não se sabe – sobre mudanças no clima global. Além disso, um debate vigoroso está a caminho entre cientistas climáticos sobre como tornar seu trabalho mais transparente e recuperar a confiança do público.

Entretanto, alguns críticos acreditam que se tratam apenas de esforços cosméticos que não resolvem o verdadeiro problema.
“Vou deixar você por dentro de um segredo bem escuro e feio – não quero que a confiança na ciência do clima seja recuperada”, disse Willis Eschenbach, engenheiro e oposicionista do clima que posta frequentemente em blogs de ceticismo climático, em resposta a uma proposta de cientistas de compartilhar mais pesquisas. “Não quero vocês aprendendo novas formas de promover ciência barata. Não quero que vocês descubram como inspirar confiança camuflando suas práticas inescrupulosas de maneira inovadora”.

“A solução”, ele concluiu, “é que vocês parem de tentar fingir que esse lixo é ciência”.

Ralph J. Cicerone, presidente da National Academy of Sciences, órgão científico mais prestigiado dos Estados Unidos, disse haver o risco de que a desconfiança na ciência climática poderia se ramificar e gerar dúvidas em relação ao conhecimento científico de forma mais ampla. Ele disse que os cientistas devem fazer um trabalho melhor se policiando e tentando ser ouvidos em redes de TV, rádio e internet.

“Essa é uma busca na qual os cientistas não têm muita experiência”, disse Cicerone, especialista em química atmosférica.

A batalha é desigual, no sentido de que os cientistas se sentem obrigados a apoiar suas descobertas com observação cuidadosa e análises replicáveis, embora seus críticos sejam livres para fazer afirmações condenando seu trabalho como fraudulentos.

“Temos que fazer um trabalho melhor de explicar que sempre existem mais coisas para serem aprendidas, sempre há incertezas a serem resolvidas”, disse John P. Holdren, cientista ambiental e conselheiro científico da Casa Branca. “Mas também precisamos lembrar às pessoas de que as ocasiões onde um amplo consenso é derrubado por um incrédulo da ciência são muito, muito raras”.

Nenhum órgão científico está sofrendo inspeções mais hostis do que o Painel Intergovernamental das Nações Unidas sobre Mudança Climática (IPCC), que compila pesquisas climáticas de centenas de cientistas ao redor do mundo em relatórios periódicos com o objetivo de ser a afirmação definitiva da ciência e um guia para a criação de diretrizes. Críticos, citando vários erros relativamente menores em seu relatório mais recente e acusações de conflitos de interesse contra seu líder, Rajendra K. Pachauri, pedem que o IPCC seja dispensado ou radicalmente reformulado.

No dia 27 de fevereiro, após semanas de recusa em envolver os críticos, o IPCC anunciou que estava solicitando a criação de um painel independente para revisar seus procedimentos de pesquisa, a fim de eliminar parcialidades e erros de futuros relatórios. No entanto, embora permitindo alguma supervisão externa, Pachauri insistiu que o painel apóia seu trabalho anterior.

“Os cientistas devem conquistar a confiança do público continuamente, ou teremos o risco de cair numa nova Idade Média, onde a ideologia vence a razão”, disse Pachauri, em mensagem de e-mail.

Porém, alguns cientistas disseram que responder a céticos em relação a mudanças climáticas era perda de tempo.

“Os cientistas do clima são pagos para fazer ciência”, disse Gavin A. Schmidt, climatologista sênior do Instituto Goddard de Estudos Espaciais da NASA. “O trabalho deles não é convencer o público”.

Ele afirmou que a recente onda de hostilidade para com a ciência do clima tinha sido motivada tanto pelo inverno frio quanto por qualquer pecado científico, real ou percebido. “Sempre houve pessoas nos acusando de sermos criminosos fraudulentos, que o IPCC seria corrupto”, disse Schmidt. “A novidade é essa paranoia combinada com inverno frio nos Estados Unidos e a liberação do ‘climategate’. É uma tempestade perfeita que permitiu aos malucos controlarem a agenda”.

A resposta é simples, ele disse: “A boa ciência é a melhor vingança”.