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Reatores de pesquisa representam desafio para segurança nuclear

Por William J. Broad

The New York Times

19/04/2010 18h59

Em Cambridge, Massachusetts, no MIT (Massachusetts Institute of Technology), um reator nuclear emite um estranho brilho azul 24 horas por dia, 7 dias por semana. Seu combustível é 93% urânio 235 – o urânio de alta pureza necessário para energizar uma bomba atômica, exatamente o que o Ocidente teme que o Irã queira produzir.

O aparelho do MIT é apenas um dos 130 reatores civis de pesquisa do mundo que usam urânio altamente enriquecido. Especialistas nucleares afirmam que administrá-los exige toneladas de combustível, o suficiente para construir centenas de ogivas nucleares. E a maioria está apenas levemente protegida.

Esse é um dos desafios com o qual o presidente americano Barack Obama e dezenas de líderes mundiais lidaram durante uma reunião de cúpula sobre segurança nuclear, realizada em Washington há alguns dias. A agenda tem o objetivo de reforçar a segurança das armas nucleares do mundo, assim como de alguns materiais e locais dedicados, como o reator do MIT.

“Devemos garantir que os terroristas nunca obtenham uma arma nuclear”, disse Obama a uma multidão vibrante em Praga, há cerca de um ano. “Assim, hoje eu anuncio um novo esforço internacional para proteger todo o material nuclear vulnerável do mundo dentro de quatro anos. Vamos estabelecer novos padrões, expandir nossa cooperação com a Rússia, buscar novas parcerias para isolar esses materiais delicados”.

Os reatores de pesquisa são vistos por Obama e seus assistentes como particularmente vulneráveis a ataques terroristas, e, portanto, especialmente difíceis de proteger em quatro anos.

Normalmente, os locais civis empregam poucas proteções militares que são padrão, como arame farpado, postos de controle, camuflagem, guardas fortemente armados e canhões antiaéreos. Em vez disso, eles tendem a motivar o uso por parte de universidades, indústrias e outros pesquisadores. O Laboratório de Reator Nuclear do MIT, por exemplo, recebe estudantes universitários e do ensino médio e realiza tours ao grande público. Atualmente, ele trabalha com a General Electric e a Hitachipara ver se o pequeno reator pode produzir isótopos médicos para hospitais da região de Boston.

“Estamos bastante otimistas de que poderemos fornecer para um mercado de nicho”, afirmou David Moncton, diretor do reator do MIT, em entrevista.

Reatores de pesquisa que funcionam com urânio altamente enriquecido são, em parte, um legado das ambições da Guerra Fria de Washington e Moscou para promover átomos para a paz. Eles eram oferecidos pelas duas superpotências como prêmios para atrair estados. Hoje, os países estão tentando controlar e diminuir a ameaça de roubo terrorista ao aumentar a segurança, desativando reatores antigos e substituindo o combustível por variedades menos enriquecidas.

No começo deste ano, por exemplo, especialistas da Administração Nacional de Segurança Nuclear em Washington conduziram uma operação delicada no Chile para remover combustível altamente enriquecido de dois reatores de pesquisa. Mas um terremoto de magnitude 8.8 ocorreu no meio da operação delicada, colocando o Chile no caos e forçando as equipes nucleares a improvisar na remoção do combustível.

A reunião de cúpula teve o objetivo de acelerar esses esforços ao criar uma onda de apoio financeiro e técnico capaz de ajudar o plano de quatro anos de Obama a ser concluído.

Entretanto, especialistas alertam que o objetivo do presidente americano não só é assustador (alguns chamam de “missão impossível”), mas agora ficou tão conhecido que líderes do mundo todo podem acabar simplesmente jogando dinheiro nos problemas, em vez de buscar soluções de longo alcance, como o fim do comércio civil de urânio enriquecido. No pior dos casos, eles dizem, a reunião poderia reforçar o status quo perigoso.

“Estou preocupado que a cúpula possa estar caminhando na direção errada”, disse Alexander Glaser, especialista nuclear da Woodrow Wilson School of Public and International Affairs, em Princeton. “Se você tem eventos e prazos, é mais fácil gastar milhões num sistema de segurança, em vez de qualificar um novo combustível para reatores”.

Melhorias de segurança relativamente fáceis em locais de reatores incluem câmaras de combustível, detectores de movimento, câmeras de segurança, portas de aço, fechaduras magnéticas e alarmes centrais. O processo de passar para um combustível de reator com pouco ou nenhum uso possível em bombas é difícil, custoso e consome tempo. Mas, no fim das contas, oferece uma solução mais fundamental, praticamente eliminando o risco de desviar o combustível de reatores para a fabricação de bombas.

O reator do MIT ilustra a dificuldade potencial de adotar um novo combustível. Durante décadas, autoridades federais falaram sobre a substituição de seu combustível capaz de ser usado em bombas por uma variedade mais segura. Porém, até recentemente, o processo custoso nunca recebeu muita atenção ou financiamento.
Moncton, do MIT, disse que a mudança planejada para combustível pouco enriquecido tinha passado recentemente de 2014 para 2015. Mas isso não era um perigo real, ele acrescentou, pois o risco de terrorismo era praticamente zero.

“Eles não poderiam fazer uma bomba” a partir da oferta limitada de combustível do reator, ele disse em entrevista. “Mas acreditamos na questão global e queremos fazer nossa parte para tirá-lo do setor civil”.

Uma explicação comum para a fraca segurança em reatores de pesquisa é que a quantidade de combustível é muitas vezes pequena demais para produção de bomba. No entanto, especialistas nucleares temem que dois ou três roubos possam produzir uma quantidade suficiente e que alguns locais têm material mais que suficiente para fabricação de arma nuclear.

Como classe, reatores de pesquisa funcionam principalmente como fábricas para a produção das partículas subatômicas chamadas de nêutrons, que são usadas por experimentos científicos e vários tipos de produção nuclear. Em contraste, reatores de energia tendem a ser muito maiores e seu alto calor é normalmente usado para girar turbinas e produzir eletricidade.

O centro de reatores de pesquisa emite um brilho azulado conhecido como radiação Cherenkov, em homenagem ao cientista russo que explicou sua origem pela primeira vez. Ele ocorre quando partículas carregadas passam rapidamente por água em resfriamento, emitindo explosões de luz inofensiva.

Matthew Bunn, especialista nuclear do Centro Belfer de Ciência e Relações Internacionais de Harvad, disse, na edição mais recente de seu relatório anual, “Securing the Bomb”, publicado na semana passada, que arranjos de segurança para reatores de pesquisa tendem a ser “notavelmente modestos”. Entre os problemas típicos: nenhum guarda armado, nenhuma checagem de antecedentes, nenhuma exigência de segurança nem cercas com alarme.

No ano passado, investigadores do congresso relataram outro problema: a resistência estrangeira em relação a melhorias em segurança. Um país não identificado, como eles observaram, tinha recusado diversas ofertas federais por nove anos.

Alguns especialistas nucleares acusaram o governo americano de lentidão em relação a conversão do combustível em reatores nacionais. No começo de 2008, o Natural Resources Defense Council, grupo ambiental que monitora questões nucleares, solicitou à Comissão Regulatória Nuclear que estabelecesse uma data-limite para não mais licenciar o uso civil de urânio enriquecido. “Os altos riscos para a segurança nacional”, argumentou o grupo, “claramente superam os benefícios”.

Entre outras coisas, o grupo argumentou que uma mudança dessa estabeleceria um bom exemplo para outros países. No começo do ano, a comissão negou a solicitação.

“É imprescindível que o presidente Obama busque uma proibição global sobre o uso comercial de urânio enriquecido”, disse Thomas B. Cochran, especialista nuclear do conselho. “Até então, assegurar e reduzir os estoques globais desse material deve ser uma prioridade para os líderes mundiais – e para esta cúpula”.

A maioria dos reatores de pesquisa do mundo que são abastecidos com urânio enriquecido capaz de ser usado em bombas está localizada na Rússia e, de acordo com especialistas, Moscou tem resistido à pressão de Washington de adotar combustível de baixo enriquecimento.

Na verdade, fora de São Petersburgo, um novo reator de pesquisa está sendo construído para funcionar com urânio enriquecido, para tristeza de autoridades americanas.

“Ninguém jamais fala sobre isso”, disse Glaser, de Princeton. “É um reator bastante significativo, muito urânio”.

Ele chamou a situação de “forte golpe contra os esforços de conversão”.

Glaser acrescentou que se Obama e seus assistentes podem convencer a Rússia a modificar sua posição em relação ao uso de urânio enriquecido é “provavelmente uma das questões principais para a cúpula”.

© 2010 New York Times News Service