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Síndrome da pressa já afeta cerca de 30% dos brasileiros, diz especialista

Chris Bueno

Especial para o UOL Ciência e Saúde

06/07/2010 13h42

Você vive de olho no relógio? Está sempre reclamando que não tem tempo pra nada? Quase tem um chilique se tem que esperar 10 minutos pelo almoço? Tem vontade de atropelar alguém que anda em um passo mais lento que o seu? Com certeza, uma maioria esmagadora de pessoas responderia “sim” a todas essas perguntas.

A pressa é uma característica dos dias de hoje e é muito difícil encontrar alguém que não tenha que cumprir prazos e horários, ou não se importe com eles. Mas especialistas afirmam que essa preocupação excessiva pode ser considerada uma síndrome, com consequências importantes para a saúde.

Apesar de não ser reconhecida oficialmente pela psiquiatria, a síndrome da pressa é estudada desde 1980. Segundo estudo realizado pelo International Stress Management Association do Brasil (Isma-BR), entidade que estuda os efeitos do estresse, o transtorno já atinge cerca de 30% dos brasileiros. Ele não constitui uma doença, mas uma série de comportamentos que altera significativamente a saúde e a qualidade de vida dos indivíduos.

As pessoas que sofrem desse transtorno vivem literalmente com pressa, ou seja, não sentem ansiedade apenas em contextos específicos, como antes de uma reunião importante. “A pressa do dia-a-dia é pontual, direcionada para um momento. Já a síndrome acompanha o indivíduo nas 24 horas. Ele acredita que é pouco tempo para dar conta de suas demandas, acumula cada vez mais funções e se sente culpado se não faz mais coisas”, explica a psicóloga Katie Almondes.

Hostilidade

O transtorno é caracterizado por um conjunto de sinais como tensão, hostilidade, impaciência, ansiedade, valorização da quantidade e desvalorização da qualidade, sono agitado, inadmissão a atrasos, problemas de memorização e interrupção da fala de terceiros.

Geralmente a pessoa que sofre da síndrome da pressa demonstra sua agitação até mesmo no seu modo de andar, falar e escrever: o passo acelerado, a fala atropelada e a escrita abreviada (muito comum em tempos de internet) são marcas típicas do transtorno. “Outro sintoma é a agressividade, pois a pessoa que está sempre com pressa quer que todos sigam o seu ritmo", aponta a psicóloga Ana Maria Rossi, presidente do Isma-BR. Quem estiver em outro ritmo pode levar um empurrão ou até ser agredido no trânsito.

A síndrome da pressa apresenta sinais semelhantes ao do estresse em estágio avançado, e é comumente confundida com ele. Porém, os problemas tem origens diferentes. Enquanto o estresse avançado é uma reação física e psicológica a um evento novo, ameaçador ou angustiante, a síndrome da pressa é desencadeada por um padrão de comportamento em que o próprio indivíduo traz o estresse para si – ou seja, na maioria das vezes, ele próprio transforma sua vida nesse corre-corre sem fim, seja para produzir mais e ter mais retorno financeiro, seja para ter mais reconhecimento no trabalho.

Os pesquisadores ainda não sabem se esse transtorno é causado pelo ritmo frenético imposto pela atualidade, ou se é uma característica genética.

Consequências

A pressa constante afeta a qualidade de vida em vários níveis: pessoal, profissional, emocional e físico. Isso porque a pessoa deixa de se dedicar aos relacionamentos e a qualidade do trabalho fica comprometida. Além disso, a ansiedade e a frustração constantes afetam a qualidade do sono e da alimentação, o que pode acarretar uma série de doenças. Depressão, distúrbios gástricos, transtornos alimentares, insônia, dores musculares, fadiga e pressão alta podem ser algumas consequências.

“Tem dias que eu tenho chilique se pego trânsito intenso ou uma fila longa”, conta Carolina Bittencourt, estudante universitária e professora de inglês. Ela conta que já teve discussões com pessoas que estavam a “atrasando”. Furar fila e passar em sinal vermelho também são deslizes que confessa cometer. “Depende da minha pressa e se estou atrasada ou não”, afirma. Ela diz que vive acelerada e se justifica pela quantidade de coisas que têm de fazer. Mas o ritmo desenfreado já está mostrando suas consequências: “Vivo de mau humor, tenho muita dor nas costas e acabei de descobrir que estou com gastrite”, conta. Mesmo assim, ainda não pensa em desacelerar.

Movimento "slow"

O jornalista canadense Carl Honoré, um dos mais conhecidos nomes do movimento “Slow” (devagar, em inglês) aponta que essa correria desenfreada prejudica não apenas as pessoas. "Tanta velocidade ameaça até mesmo a economia e o meio ambiente”, diz. De acordo com ele, o mercado tem se baseado no crescimento rápido, no lucro e no consumo imediatos, e isso está levando o mundo ao colapso econômico e ambiental.

Honoré concorda que, em algumas profissões, a pressa é indispensável. É o caso de bombeiros, policiais ou médicos, que precisam de velocidade para atender emergências e salvar vidas. Outra área em que a pressa é essencial é no esporte, em que a velocidade está em muitas competições e é responsável por grande parte da emoção. “Ninguém assistiria a uma competição de vagareza, nem ficaria torcendo pelo último colocado, aquele que conseguiu chegar mais devagar”, aponta.

Os problemas começam quando a pressa não é necessária, mas exigida. Ou seja: para ser bom, é preciso ser veloz. “Mesmo quando queremos desacelerar, uma voz dentro de nós fica repetindo para irmos rápido. Acabamos nos sentindo mal se fazemos poucas coisas, ou se demoramos para fazê-las”, ressalta Honoré.

Desta forma, a pressa acaba se tornando um vício difícil de ser vencido. “Eu sou viciada em pressa. Não consigo, e não gosto, de fazer nada devagar. Estou sempre correndo, fazendo várias coisas ao mesmo tempo, e quero que as pessoas à minha volta sigam meu ritmo, senão parece que o trabalho não flui e a produtividade diminui”, confessa Bittencourt. Apesar de se assumir uma apressada, a estudante afirma que gosta da velocidade e acredita que é difícil mudar. “Não consigo diminuir o ritmo. Me sinto mal se ficar parada e me irrito quando demoro muito para terminar alguma coisa”.