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Estudos mostram benefícios de práticas como ioga e meditação à saúde

Cristina Almeida

Especial para o UOL Ciência e Saúde

22/09/2010 11h16

“Quando nem os contrários nem os semelhantes curam, o que convém é o que cura”. Esse é o terceiro princípio de Hipócrates, considerado o pai da medicina, mas resume os fins de uma nova abordagem médica denominada Medicina Integrativa. Trata-se da combinação da medicina convencional com terapias, sistemas e cuidados complementares, de eficácia comprovada, e que são usados em conjunto, de forma integrada. O tema foi objeto do 2º Simpósio Internacional de Medicinas Tradicionais e Práticas Contemplativas, organizado pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), na semana passada.

A iniciativa de reunir profissionais da área médica para discutir os avanços do conhecimento, das pesquisas, segurança e eficácia de medicinas tradicionais e de técnicas como ioga, massagem e meditação atende à necessidade de encontrar novas formas de cuidados terapêuticos que garantam bem-estar físico, mental, espiritual e social às pessoas, metas que correspondem ao conceito de saúde estabelecido pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

Reconhecidas pelo National Institutes of Health (EUA) há mais de uma década, as terapias complementares só foram inseridas no Sistema Único de Saúde (SUS) em 2006, por meio de uma portaria. No momento, medicina tradicional chinesa, homeopatia, fitoterapia, termalismo e medicina antroposófica são as modalidades disponíveis. “Além dessas terapias, 76% das unidades públicas já oferecem práticas corporais ou meditativas gratuitas (como tai chi chuan, lian gong etc), com resultados satisfatórios para a melhora da qualidade de vida de seus usuários", diz a coordenadora regional de Saúde da Prefeitura Municipal de São Paulo, Sheila Busato, presente no Simpósio.

Fernando Bignardi, médico homeopata e coordenador do Centro de Estudos do Envelhecimento da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), um dos palestrantes do encontro, explica que “A medicina convencional tende a ver os fenômenos de forma reduzida e topográfica, enquanto a medicina integrativa sugere uma abordagem transdisciplinar”. Isso permite observar o doente e a doença em toda sua complexidade, segundo ele.

A inspiração para legitimar essa nova perspectiva vem das medicinas milenares que, segundo a médica Ângela Tabosa, coordenadora científica da Liga de Acupuntura da Unifesp, possuem “uma verdade comum que é ver o ser humano de forma abrangente”. “O que falta é difundir informações corretas para que as pessoas saibam, por exemplo, que a acupuntura é uma prática complementar integrativa, mas apenas compõe um sistema médico que vislumbra massagem, exercícios, e fitoterapia”, complementa.

Medicina tibetana

Men-Ram-Pa, ou Dr. Dawa, do Tibetan Medical&Astrology Institute conta que a medicina tibetana já é reconhecida nos EUA, em alguns países da Europa, Índia, Butão, Mongólia e Tailândia, onde existem centros de estudos especializados que já pesquisam a eficácia desse sistema. Os princípios que a regem se fundamentam num livro denominado "Quatro Tantras": “Segundo a tradição, o médico tibetano parte da premissa de que a maioria das doenças tem como causa o estilo de vida e a alimentação”, diz o especialista.

Numa consulta, o foco são as causas do desequilíbrio físico/mental que levaram à doença. “A visita dura em média 1 hora, e além da pesquisa cuidadosa sobre a forma como a pessoa vive, examinamos a língua, os dedos indicador, médio e anular, relacionados aos principais órgãos, além da pulsação”, explica Dawa. O tratamento pressupõe mudança de hábitos e remédios fitoterápicos.

Ioga e meditação

“Inúmeras pesquisas sobre ioga, que combina respiração, postura e meditação, têm apresentado resultados benéficos para a saúde”, afirma  a médica Shirley Telles, do National Institute of Mental Health&Neurosciences de Banglore, na Índia. “As investigações são importantes porque o homem moderno mudou seu estilo de vida e, com isso, sua fisiologia também se modificou”.

O impacto dessa prática é o objeto de estudo de Telles, que publicou um trabalho, em janeiro, na revista Medical Science Monitor, especializada em pesquisas clínicas e experimentais. A conclusão indica que a adoção de um programa de ioga, além de mudanças alimentares, podem ser úteis entre os obesos. O grupo estudado obteve melhora na estabilidade postural, redução da cintura e dos quadris, bem como diminuição dos níveis séricos de leptina (hormônio relacionado ao tecido adiposo). “Para usuários de computador, a ioga trouxe alívio para o desconforto músculo esquelético e lombar, e ainda aumentou a capacidade de digitação bilateral, bem como a rapidez dos toques da mão direita”, informa.

Estresse e ansiedade são sintomas de distúrbios como a esquizofrenia que, de acordo com a psicóloga clínica Tamara Russel, do Instituto de Psiquiatria do King's College London e do Western Psychiatric Institute and Clinic, da Universidade de Pittsburgh, nos EUA, podem ser atenuados com o uso de técnicas contemplativas como a Mindfulness (atenção plena), definida como a habilidade de estar consciente das próprias experiências para responder às situações de forma não automática. “Ainda não podemos falar em cura, mas o fato é que as evidências das pesquisas em curso mostram que quando mente, cérebro e corpo estão em sintonia, há melhora na qualidade de vida desses pacientes”.

Preconceito

Na opinião do sociólogo médico Nelson Filice de Barros, da Universidade de Campinas (Unicamp), preconceito e falta de conhecimento são os desafios a serem superados no percurso que leva ao entendimento do que é a medicina integrativa, um modo de praticar a arte médica que envolve vários especialistas de áreas diferentes e o paciente, colocando-os como protagonistas do processo de restabelecimento da saúde.

Barros lembra que as práticas complementares já foram consideradas uma espécie de movimento da contracultura, e que somente num passado recente foram admitidas como auxiliares da medicina convencional. “O que hoje vivenciamos é um caminho em direção ao estabelecimento de uma cultura de pluralismo, que confere ao paciente autonomia. A consequência, para ele, é mais consciência e responsabilidade pela própria saúde”, conclui.