Topo

Estresse pode levar as células produtoras de insulina à dormência

Amanda Schaffer

The New York Times

10/10/2012 17h04

Durante anos, pesquisadores investigaram como o corpo perde a capacidade de produzir insulina em quantidade suficiente, uma característica da diabetes. Agora, uma intrigante teoria está surgindo, e sugere um potencial tratamento que poucos cientistas tinham considerado.

O hormônio insulina facilita a entrada da glicose – ou açúcar – presente na corrente sanguínea nas células para que ela seja utilizada como energia. Mas o corpo pode tornar-se resistente à insulina, e as células beta do pâncreas, que produzem o hormônio, precisam trabalhar mais para compensar. Por fim, elas perdem a capacidade de aumentar a síntese de insulina.

"Costumávamos dizer que as células beta desistem", disse Alan Saltiel, diretor do Instituto de Ciências da Vida da Universidade de Michigan.

Na realidade, acrescentou, isso significa que "nós não temos nenhuma ideia do que está acontecendo".

Algumas evidências sugerem que um grande número de células beta morrem através de um processo de morte celular programada, denominado apoptose. Mas isso é, na melhor das hipóteses, uma explicação parcial. Agora, pesquisadores da Universidade de Columbia avaliam uma alternativa surpreendente.

Em camundongos com diabetes tipo 2, os pesquisadores mostraram que as células beta que perderam a funcionalidade não estavam totalmente mortas. A maioria delas permaneceu viva, mas de uma forma modificada. Elas reverteram seu desenvolvimento para um estado anterior, ou "progenitor".

É como se essas células tivessem "voltado no tempo a um ponto que, aparentemente, elas já passaram durante seu desenvolvimento", disse Domenico Accili, diretor do Centro de Pesquisa em Endocrinologia e Diabetes da Universidade Columbia, que liderou o novo trabalho.

Se os pesquisadores conseguirem encontrar uma maneira de reverter o processo, persuadindo-as a se tornarem células beta novamente, elas poderiam recuperar a capacidade de produzir insulina.

"É uma ideia muito nova", disse Saltiel, e que "traz muita esperança".

Em trabalhos anteriores, Accili procurou entender o que acontecia com as células beta no nível molecular conforme a diabetes progredia. Ele investigou o papel desempenhado por uma proteína chamada FOXO1, que parece desaparecer quando as células beta deixam de produzir insulina.

No novo trabalho, publicado em setembro no periódico Cell, Accili, Chutima Talchai, que na época era pesquisadora de pós-doutorado em seu laboratório, e colegas projetaram camundongos geneticamente modificados que não tinham a FOXO1 em suas células beta. No início, os animais pareceram normais, mas, quando foram submetidos a estresse – gestação em fêmeas e envelhecimento em machos – os camundongos desenvolveram elevação de açúcar no sangue, diminuição da secreção de insulina e outros sinais de diabetes tipo 2.

Os camundongos também começaram a produzir proteínas normalmente encontradas somente durante o desenvolvimento fetal. Accili descobriu que algumas das células beta tinham se tornado parecidas com células progenitoras. Similares às células-tronco, estas são destinadas a transformarem-se, ou "diferenciarem-se", em células produtoras de hormônio conforme o animal atinge a maturidade. Seu surgimento em camundongos adultos foi uma surpresa. Accili também mostrou que esse processo – em que as células beta perdem a identidade, ou se desdiferenciam – responde por praticamente toda a diminuição da capacidade do animal de produzir insulina. Isso não estava acontecendo apenas em uma minoria dos casos.

Outros laboratórios estão examinando o estranho fenômeno. Matthias Hebrok, diretor do Centro de Diabetes da Universidade da Califórnia, em São Francisco, disse que ele e seus colegas também tinham evidências de que o estresse pode fazer com que células produtoras de insulina parem de funcionar corretamente e revertam para um estado menos maduro.

Uma série de estresses fisiológicos, incluindo gravidez, obesidade e envelhecimento, tendem a aumentar a demanda nas células beta para a produção de mais insulina, disse Accili. Pode ser que o retorno a um estado menos ativo signifique que elas estejam "descansando um pouco", disse ele. Embora ainda não esteja claro o porquê de isso acontecer, a descoberta pode dar suporte à ideia de que os médicos devem se concentrar no alívio do estresse sobre as células beta, em vez de forçá-las a produzir mais insulina, o que pode acelerar a progressão da diabetes, disse Accili.

Se algo semelhante ocorrer em humanos com diabetes tipo 2, os cientistas podem encontrar maneiras de estimular as células beta diferenciadas a retornarem à maturidade, a forma que produz insulina. Na pesquisa de Accili, algumas das células progenitoras passaram a produzir outro hormônio, o glucagon, que leva a um aumento de açúcar no sangue.

Isso sugere que essas células ainda possuem a capacidade de se transformar em outros tipos de células endócrinas.

"Por que não se tornar célula beta de novo?" Perguntou Accili.

De fato, pesquisas em camundongos mostraram que, quando um grande número de células beta são destruídas, algumas células alfa produtoras de hormônio transformam-se em células beta. Outro estudo demonstrou que, por meio da adição de proteínas chamadas fatores de transcrição, um outro tipo de célula pancreática, chamada célula acinar, também pode tornar-se uma célula beta.

"O pâncreas não é um conjunto de células totalmente estáticas. É muito mais dinâmico do que se acreditava anteriormente", disse o Dr. Mark A. Magnuson, professor de biofísica e fisiologia molecular no Centro Médico da Universidade Vanderbilt. "Esse é o conceito da plasticidade celular, e ele tem grande participação nesse fenômeno."

Ainda assim, adicionou Magnuson, transformar as células progenitoras em células beta funcionais, que poderiam responder normalmente à glicose, permanece um desafio.

"Muitas pessoas estão pensando sobre isso, mas ainda não encontramos a resposta."