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É possível aprender enquanto dormimos, como sugerem alguns cursos?

Enquanto dormimos, o nosso cérebro se mantém em atividade - Getty Images
Enquanto dormimos, o nosso cérebro se mantém em atividade Imagem: Getty Images

Colaboração para o VivaBem

29/12/2022 04h00

Enquanto dormimos, não estamos apenas dormindo. Descobertas da neurociência mostram que o cérebro humano permanece bem ativo durante o sono, e é possível tirar proveito disso.

Ninguém perde tempo durante o sono. Na verdade, esse é um evento biológico dinâmico, com fases bem definidas: reduz seu metabolismo em alguns momentos e acelera em outros, mantendo atividades de aprendizado, organização de memórias, ensaios de criatividade e testes emocionais.

Mas é possível, devido a toda essa atividade cerebral, aprendermos enquanto dormimos, como sugerem alguns cursos de idiomas?

Indivíduos estimulados a processar informações simples antes de dormir continuam com a tarefa em andamento nas fases iniciais do sono.

Num experimento da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, e da Escola Normal Superior, em Paris, na França, pessoas ouviam determinadas palavras e deviam classificá-las em "animais" ou "objetos", apertando um botão em cada mão. A atividade foi realizada pouco antes de os voluntários dormirem.

Depois que caíam no sono e deixavam de apertar os botões, os participantes continuaram a ser estimulados a realizar a tarefa. Pelos registros da atividade cerebral, os cientistas notaram que eles continuavam acertando tudo, só demoravam um pouco mais para "responder".

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A atividade cerebral durante o sono serve para nos ajudar a consolidar memórias
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Embora não tenham fornecido respostas definitivas, os resultados mostraram que o cérebro é capaz de continuar processando informações externas durante os estágios iniciais do sono (no caso, palavras ouvidas). Mas não demonstraram evidência de aprendizado nas tarefas propostas.

Um outro estudo, financiado pela Fundação Nacional de Ciência da Suíça, mostrou que, ainda que não dê para aprender efetivamente dormindo, é possível ao menos solidificar a memória das palavras ouvidas antes de ir para a cama.

O trabalho convocou 60 alunos de língua alemã para aprender à noite algumas palavras em holandês. Metade do grupo foi dormir, enquanto o som ambiente reproduzia as palavras gravadas, e a outra metade permaneceu acordada para ouvir o mesmo áudio. Depois, às 2h, todos foram submetidos novamente ao novo vocabulário, e quem dormiu se saiu muito melhor ao recordar as palavras novas.

Sonhos e soluções

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Muitas vezes vamos para a cama pensando num problema e acordamos com uma solução
Imagem: Getty Images/iStockphoto

A grande responsável pela consolidação de memórias é a chamada fase "REM" (sigla para "movimento rápido dos olhos" em inglês) do sono. Ela é o quinto estágio do sono.

Nas fases 1 e 2, ele é superficial e as pessoas estão mais sensíveis ao despertar, já que ainda há uma ligeira percepção do mundo externo. As fases 3 e 4 são as denominadas de sono profundo, ou de ondas lentas. O cérebro trabalha menos, mas não fica totalmente parado: é apenas um descanso.

Depois de todo esse processo, surge o sono REM, quando pouco nos mexemos, com exceção dos olhos, que se movem por baixo das pálpebras. Ficamos sensorialmente "distantes" do mundo ao nosso redor, enquanto o cérebro organiza memórias recentes, exercita a criatividade e cria os sonhos.

Nessa fase, há intensa ativação de áreas ligadas a emoções, sem muita interferência da crítica e da racionalidade, o que explica, muitas vezes, os sonhos surrealistas que temos.

Apesar da aparente confusão, esse processo é fundamental para a consolidação do aprendizado pelo cérebro. Dormimos pensando num problema e às vezes acordamos com uma solução para ele.

Durante o sono, o cérebro mantém processamentos vindos do período de vigília numa espécie de "segundo plano" menos consciente, mas eventualmente muito efetivo e criativo, talvez por menor interferência do juízo e da crítica, que limitam as alternativas.

Fontes: Leandro Teles, neurologista e membro da ABN (Academia Brasileira de Neurologia; Benito Damasceno, professor de neurologia da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), em São Paulo. Revistas Current Biology, Science e Cerebral Cortex.