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Ave mais antiga do Brasil tinha o tamanho de um beija-flor

Fóssil muito bem preservado da ave mais antiga do Brasil. Material tem aproximadamente 115 milhões de anos - Divulgação/Nature
Fóssil muito bem preservado da ave mais antiga do Brasil. Material tem aproximadamente 115 milhões de anos Imagem: Divulgação/Nature

Rodrigo de Oliveira Andrade

Revista Pesquisa Fapesp

15/06/2015 21h29

Há muito se sabe que a Bacia de Araripe, depósito de rochas formadas por sedimentos localizado na cidade de Nova Olinda, interior do Ceará, abriga uma variedade de fósseis de plantas e animais pré-históricos, sobretudo do período Cretáceo, que vai de 145 a 65 milhões de anos atrás. Ainda assim, o paleontólogo Ismar de Souza Carvalho, do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), não esperava encontrar algo tão raro por lá. Em escavações, ele e sua equipe depararam com o fóssil muito bem preservado de uma ave pequena, do tamanho de um beija-flor, de aproximadamente 115 milhões de anos, coberto por penas e plumas – estruturas que dificilmente resistem à ação do tempo. Até onde se sabe, esse seria o fóssil de ave mais antigo do Brasil.

ave - Ilustração Gabriel Lio/Revista Pesquisa Fapesp - Ilustração Gabriel Lio/Revista Pesquisa Fapesp
Imagem: Ilustração Gabriel Lio/Revista Pesquisa Fapesp
De acordo com os pesquisadores, o fóssil – encontrado preso entre rochas sedimentares – pertence a um grupo de aves da era Mesozoica conhecido como Enantiornithes, que habitou o Nordeste brasileiro no contexto do Gondwana, o supercontinente formado há cerca de 200 milhões de anos e que agrupava América do Sul, África, Madagascar, Índia, Oceania e a Antártida. Análises indicam que o animal tinha um corpo pequeno e olhos grandes e que possivelmente se tratava de uma ave jovem. Apesar do tempo, e para surpresa de todos, o fóssil estava recoberto por uma plumagem filamentosa, com penas largas e duras distribuídas pela asa, conforme descrevem em um estudo publicado nesta terça-feira, 2, na revista Nature Communications. O trabalho teve a colaboração de pesquisadores do Museu Argentino de Ciências Naturais Bernardino Rivadavia, da Fundação de História Natural Felix Azara, do Geopark Araripe e do Departamento Nacional da Produção Mineral.

O mais surpreendente, no entanto, é que essa ave tinha duas longas penas caudais, chamadas de rétrices, conectadas às últimas duas vértebras da cauda. Esse tipo extinto de plumagem, em que as penas da cauda têm uma estrutura central rígida a partir da qual surgem filamentos secundários, é bastante raro de se ver, dizem os pesquisadores. Até hoje, só havia sido observado em fósseis encontrados na China. Uma vantagem no caso da ave identificada pelos brasileiros é que essas penas se preservaram em um ângulo tridimensional. Isso favorece o desenvolvimento de estudos detalhados acerca desse tipo de plumagem e um entendimento mais abrangente de aspectos da paleobiologia e da evolução das aves.

“Existem muitas dúvidas relacionadas à origem e à função dessas penas”, diz Ismar Carvalho, autor principal do estudo. “Certamente não deveriam ter uma função significativa para o voo, mas sim para uso ornamental, servindo para a identificação de membros da espécie ou, então, como atrativo sexual.” As longas penas da cauda e das asas e a plumagem diversificada ao longo do corpo sugerem, segundo ele, que a ave é um animal bastante incomum e ainda desconhecido para a paleontologia. Os pesquisadores pretendem agora entender que mecanismos ou eventos geológicos permitiram a preservação do fóssil articulado e com ossos, tecidos musculares e penas associados. “Em seguida, queremos avaliar o significado das manchas observadas em algumas das penas para saber se têm relação com a coloração e o padrão ornamental dessa ave”, afirma.