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Vacina com chip, terraplanismo: Por que adoramos uma teoria da conspiração?

Getty Images
Imagem: Getty Images

De Tilt, em São Paulo

01/06/2021 04h00

Sem tempo, irmão

  • Humanos têm a necessidade natural de dar causas para efeitos
  • As teorias da conspiração não passam de padrões explanatórios
  • Conspirar dá sensação de prazer por liberar dopamina no nosso cérebro
  • Paranoias coletivas podem trazer muitos prejuízos à sociedade

De quem acredita que a Terra é plana aos que têm certeza que a vacina da covid-19 tem um chip, passando pelos que juram de pé junto que o coronavírus foi criado em laboratório, tem sempre alguém espalhando ou defendendo teorias da conspiração pela internet.

A astronomia também está cheia delas, e não é de hoje. Quem não se lembra da teoria que dizia que o homem nunca pisou na Lua e que, em 1969, tudo não passou de uma pura encenação cinematográfica? Ou de quando internautas trataram como farsa a chegada da sonda New Horizon, da Nasa, a Plutão em 2015? Há quem diga que a Nasa está acobertando a existência de alienígenas...

Muitas dessas teorias conspiratórias usam argumentos bastante convincentes para ganhar força — muitas vezes até se baseiam em conceitos científicos. Mas por quê, afinal, somos tão inclinados a acreditar em falsas hipóteses?

Ávidos por padrões

O psicólogo e escritor Michael Shermer, autor de livros como "Por Que as Pessoas Acreditam em Coisas Estranhas?" e "Cérebro e Crença", afirma que as pessoas amam uma teoria da conspiração por causa da necessidade humana de explicar por que as coisas acontecem na vida, de dar causas para os efeitos.

Fundador da revista Skeptic, Shermer explica que o cérebro humano, assim como de outros primatas, é ávido por padrões, por isso, rapidamente encontra formas de conectar o evento "A" com o "B" e assim por diante.

"Às vezes essa conexão realmente existe, mas às vezes não", continua o escritor. "A gente simplesmente assume que os padrões são reais, e teorias da conspiração não passam de padrões explanatórios."

Organizações poderosas e, muitas vezes, sem um rosto bem definido, tornam-se alvo fácil para projetarmos a imagem de gente discutindo segredos entre quatro paredes. Por isso o governo dos EUA é uma "vítima" frequente dos conspiracionistas.

A Nasa é apenas uma agência do governo, e não é especialmente grande em comparação com outras, mas lida com espaço; e pessoas interessadas em óvnis e alienígenas sempre associam a agência a isso
Michael Shermer, psicólogo e escritor

Conspirar dá um "barato"

No livro "Cérebro e Crença", o psicólogo discute o papel da dopamina na tendência a aderir a teorias da conspiração, algo demonstrado em alguns estudos científicos. Esse neurotransmissor é associado ao aprendizado e à memória — e isso explica por que pessoas cultas e inteligentes se envolvem nisso.

Mas a dopamina é, também, essencialmente ligada ao sistema de recompensa do cérebro: "E encontrar conexões é gratificante", comenta Shermer.

Ou seja: dá um certo barato pensar que o presidente dos EUA forjou um atentado terrível como foi o ataque às Torres Gêmeas, em Nova York, para justificar a invasão do Iraque e do Afeganistão ou fomentar a indústria bélica.

Paranoia coletiva, prejuízo coletivo

A verdade é que teorias da conspiração trazem muitos prejuízos à sociedade. Muitas delas surgiram durante a pandemia da covid-19 e têm deixado muita gente com medo de se vacinar ou sem medo nenhum de andar por aí sem máscara.

Um estudo feito na Universidade de Cambridge (Reino Unido) no ano passado mostrou que até um terço da população de alguns países é suscetível a acreditar em informações falsas e em teorias da conspiração sobre a covid-19, o que provoca uma perda de confiança na vacinação.

O engajamento em torno de teorias da conspiração também tem feito com que muitos pais acreditem em argumentos do movimento antivacina e deixem de imunizar seus filhos, colaborando para surtos de doenças que seriam evitáveis; muita gente tem deixado de se envolver em campanhas e comportamentos favoráveis ao meio ambiente por acreditar em teorias que dizem que o aquecimento global é uma falácia.