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Redução de áreas verdes favorece mosquitos vetores de doenças como dengue

James Gathany/Centers for Disease Control and Prevention via AP
Imagem: James Gathany/Centers for Disease Control and Prevention via AP

Maria Fernanda Ziegler

Da Agência Fapesp

18/01/2018 17h46

A urbanização e a consequente redução de áreas verdes nas cidades podem ser consideradas uma verdadeira festa para mosquitos vetores de doenças, como o Aedes 

Mais adaptados às áreas urbanas, eles são beneficiados pelo declínio da população de outras espécies de mosquitos. No município de São Paulo, essa relação não é diferente. Foi o que comprovou um estudo feito por pesquisadores da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo com o apoio da Fapesp (Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo).

Com a colaboração do Centro de Controle de Zoonoses e do Departamento de Parques e Áreas Verdes do município, foram coletados 37.972 espécimes da família Culicidae, que compreende espécies conhecidas popularmente como pernilongos. As análises posteriores realizadas em laboratório mostraram que eles pertenciam a 73 espécies e 14 gêneros diversos.

Embora a coleta --feita em nove parques municipais monitorados pelo estudo-- indique uma rica diversidade de espécies na cidade, o estudo mostrou que existe um problema quanto à distribuição e composição dessas espécies nas áreas verdes do município.

Entre os resultados divulgados em um artigo na revista científica "Scientific Reports" está a constatação de uma tendência à redução de espécies de mosquitos. Com isso, vetores de patógenos que causam doenças em humanos acabam sendo beneficiados. www.nature.com/articles/s41598-017-18208-x.

Dos insetos coletados no estudo, 68% pertenciam a cinco espécies: Culex nigripalpus, Aedes albopictus, Cx. quinquefasciatus, Ae. fluviatilis e Ae. scapularis. Outras espécies de vetores – Cx. declarator, Ae. aegypti, Cx. chidesteri, Limatus durhami e Cx. lygrus  – também foram encontradas com maior frequência nos parques urbanos.

"Existe uma relação entre o tamanho das áreas verdes e a diversidade das espécies. As áreas verdes menores tendem a possuir um subconjunto das espécies encontradas em áreas verdes maiores, havendo uma tendência para que a fauna de mosquitos nas áreas menores seja formada principalmente por vetores", disse um dos autores do estudo, Antônio Ralph Medeiros-Sousa, doutorando na Faculdade de Saúde Pública da USP.

De acordo com Medeiros-Sousa, em cenários de fragmentação e redução das áreas verdes, mosquitos vetores são beneficiados com a extinção de espécies mais silvestres.

"Eles são mais adaptados ao meio urbano e, com a redução progressiva das áreas verdes, as espécies mais silvestres vão desaparecendo e as mais urbanas, justamente as mais competentes para a veiculação de patógenos, de certa forma dominam o território", disse.

O estudo também mostrou que há uma grande variação na riqueza de espécies entre os parques monitorados. Foram coletadas 16 espécies no parque do Ibirapuera, com 1,58 km2 de área, enquanto no Parque Anhanguera (9,5 km2) foram encontradas 47 espécies. Como esperado, os fragmentos menores de área verde são mais suscetíveis a distúrbios ambientais, que afetam principalmente a permanência de espécies de baixa abundância.

"É bastante expressivo coletar quase 50 espécies de mosquitos dentro de uma área verde inserida em uma cidade. Não esperávamos esse número. Foi uma surpresa, mesmo sabendo que algumas regiões, como o próprio parque Anhanguera, teriam uma diversidade mais elevada, justamente por causa de sua área", disse Medeiros-Sousa.

Mesmo com a comprovação da maior concentração de mosquitos vetores --sete dos oito mais comuns são vetores de patógenos em humanos--, os pesquisadores destacam não ser possível afirmar que há um maior risco de transmissão de patógenos, mas apenas uma maior possibilidade de contatos entre mosquitos vetores e humanos.

"Não quer dizer que vai ter doença. Existe outra parte determinante para a doença que é a presença do patógeno, como o vírus da dengue, zika ou febre amarela. O estudo mostra que há um desequilíbrio, com menor diversidade de espécies em áreas menores e menos preservadas", disse outro autor do estudo, Mauro Marrelli, professor associado da Faculdade de Saúde Pública da USP e orientador de Medeiros-Sousa.

Segundo os autores, os dados reunidos pelo estudo destacam a necessidade de outros trabalhos que busquem entender como a perda de espécies pode afetar o risco de doenças infecciosas em áreas urbanas.