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Como cataclismo ambiental, 2ª Guerra deixa sua marca em árvores norueguesas

O encouraçado alemão Tirpitz em um fiorde na Noruega - DW
O encouraçado alemão Tirpitz em um fiorde na Noruega Imagem: DW

11/04/2018 21h31

Após encontrarem marcas incomuns em anéis de árvores na Noruega, pesquisadores descobriram se tratar de efeitos de nevoeiro químico usado por nazistas para esconder navio de guerra dos Aliados.

Durante a maior parte da Segunda Guerra Mundial, os bombardeiros aliados tentaram repetidamente afundar o Tirpitz, o maior navio de guerra da Alemanha nazista. A embarcação era uma obsessão do primeiro-ministro britânico Winston Churchill, que passou a chamar o encouraçado de "a besta".

Nesta quarta-feira (11), especialistas em árvores que se reuniram no encontro anual da União de Geociências Europeia mostraram por que os aliados tiveram tanta dificuldade de afundar o navio, que só foi a pique no final de 1944 em um fiorde da Noruega, então ocupada pelos nazistas.

Claudia Hartl, pesquisadora da Universidade Johannes Gutenberg, em Mainz, na Alemanha, disse que "a história estava nos anéis das árvores".

Uma evidência improvável dessa batalha da Segunda Guerra Mundial foi encontrada no verão de 2016, quando Hartl levou estudantes em uma pesquisa de rotina de florestas ao redor do Kafjord, uma das dezenas de fiordes ao longo da costa norte da Noruega.

"Nós voltamos ao laboratório e medimos os anéis de árvores e vimos que eles eram muito estreitos --e em alguns casos, quase ausentes-- para 1945", disse ela.

Em outras palavras, isso era um sinal de que as florestas da região haviam sido atingidas por algum tipo de cataclismo ambiental. "Claro que nos perguntamos: por que isso?"

As suspeitas

A primeira suspeita foi a de que alguma infestação de insetos, um fator que pode ser grave e severo, especialmente em florestas boreais de alta latitude, teria afetado as árvores. Nos últimos anos, grandes extensões de florestas no Canadá têm sido afetadas por insetos, que se propagam mais constantemente por causa do aquecimento global.

Só que não havia insetos conhecidos no norte da Escandinávia que pudessem ter provocado aquela tipo de choque ambiental em meados do século 20.

"Foi só após falarmos com um cientista local que acabamos fazendo a conexão com o Tirpitz", disse Scott St. George, geógrafo do Instituto do Meio Ambiente da Universidade de Minnesota, nos EUA.

Durante a guerra, o encouraçado Tirpitz, junto com sua tripulação de 2.500 homens, havia retrocedido para esconderijos em fiordes do norte da Noruega para despistar a aviação aliada. Na era pré-satélite, até mesmo um gigante de aço de 250 metros (820 pés) de cumprimento não era tão fácil de ser detectado.

Mas aviões de reconhecimento aliados finalmente encontraram o navio --e os ataques começaram. Os alemães, no entanto, tinham um plano: produzir grandes quantidades de névoa artificial para esconder o navio dos aviões. E é nesse ponto que os anéis de árvores entram em cena.

Os efeitos

"A fumaça lançada nas florestas ao redor do fiorde danificou pinheiros e bétulas próximas, deixando para trás uma 'impressão digital' distintiva e incomum", disse St. George.

O estudo dos anéis nas árvores, chamado dendrocronologia – literalmente, "medição cronológica de árvores" – é usado por cientistas do clima para traçar mudanças de temperatura, das chuvas ou de cursos de rios. A medição permite conseguir dados de centenas e até milhares de anos atrás.

Os círculos concêntricos encontrados em troncos, portanto, podem ajudar a estabelecer a idade de edifícios, naufrágios, instrumentos musicais, molduras de pinturas ou outros artefatos feitos de madeira proveniente de zonas temperadas.

O fim do Tirpitz em novembro de 1944 - DW - DW
O fim do Tirpitz em novembro de 1944
Imagem: DW
Como as árvores nos trópicos crescem continuamente, elas geralmente não produzem os anéis, que são resultados de surtos de crescimento durante a primavera e o verão.

Para investigar mais, Hartl retornou à cena da batalha para tentar entender os efeitos na vegetação. Ela estabeleceu cinco sítios para coleta de dados na área onde o Tirpitz esteve ancorado. A distância entre a região e os sítios variava de alguns metros a até dez quilômetros.

Perto de onde o navio se escondeu, mais de 60% das árvores praticamente não apresentaram crescimento em 1945. Todas elas foram afetadas em algum grau. Lacunas na floresta onde árvores jovens surgiram na década de 1950 sugerem que o nevoeiro químico também causou fatalidades na vegetação.

A quatro quilômetros de distância, mais da metade das árvores foi severamente afetada, levando oito anos em média para se recuperarem totalmente. Pinheiros --que conseguem manter suas folhas por até sete anos-- foram as árvores mais atingidas.

O nevoeiro artificial que desnudou as árvores era provavelmente composto de ácido clorossulfúrico, que quando misturado com água produz um vapor espesso e branco. Os navios alemães costumavam ter equipes especiais equipadas com máscaras de gás para gerar esse tipo de nevoeiro artificial.

O Tirpitz

Apesar dessa técnica, o Tirpitz acabou não escapando para sempre da aviação aliada. Lançado em 1941 pela Kriegsmarine, o Tirpitz fazia parte da mesma classe de navios de guerra do célebre Bismarck --que também foi alvo de uma caçada implacável por parte dos Aliados. Só que ao contrário do Bismarck, o Tirpitz nunca viu muita ação no mar --foi usado mais como uma arma para dissuadir navios aliados a penetrarem no mar Báltico.

O nome do navio era uma homenagem ao almirante Alfred von Tirpitz, o arquiteto da antiga marinha imperial alemã. Em outubro de 1944, o navio foi enviado para outro fiorde da Noruega, nos arredores, de Tromso. Desta vez o nevoeiro artificial não foi suficiente para esconder o navio.

No mês seguinte, o navio foi finalmente afundado por um esquadrão de 32 bombardeiros britânicos Lancaster. Cerca de mil tripulantes morreram no ataque. Nos anos 1950, os restos do navio foram retirados em operações para recuperar sucata.