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Como se tornar um astronauta? Ministro dá dicas

Astronauta brasileiro, Marcos Pontes  - Arquivo Pessoal
Astronauta brasileiro, Marcos Pontes Imagem: Arquivo Pessoal

Lucas Borges Teixeira

Colaboração para o UOL, em São Paulo

07/01/2019 04h00

Como é ver a Terra de cima? Esse pode ser o sonho de muitos, mas nem 600 pessoas podem responder. E apenas uma delas é brasileira: Marcos Pontes, que assume o Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações no governo Bolsonaro.

Ele foi enviado à Estação Espacial Internacional para realizar experimentos em ambiente de microgravidade. A viagem durou dez dias.

"A carreira de astronauta é uma das mais difíceis do planeta", afirma o ministro ao UOL.

O caminho até lá não foi fácil. A começar pela barreira territorial: são poucos os países no mundo com agências que formam astronautas profissionais e o Brasil não é um deles. Atualmente, aliás, diferente da época em que Pontes viajou, o país não tem nenhum programa de incentivo à formação nesta carreira.

Então, como começar? Pontes e Agência Espacial Brasileira (AEB) são categóricos: estude, cuide da saúde, saiba trabalhar em equipe e depois estude um pouco mais. 

Jair Bolsonaro cumprimenta o ministro Marcos Pontes, da Ciência e Tecnologia - Eduardo Anizelli/Folhapress - Eduardo Anizelli/Folhapress
Jair Bolsonaro cumprimenta o ministro Marcos Pontes, da Ciência e Tecnologia
Imagem: Eduardo Anizelli/Folhapress

Tenha formação em ciências exatas ou biológicas

Para entrar para algum dos programas das grandes agências internacionais, o passo inicial é a formação. Tão importante quanto cursar uma boa universidade é escolher cursos que tenham a ver com ciência espacial.

De acordo o engenheiro mecatrônico Pedro Kaled, tecnologista da AEB, há carreiras mais aptas e serem aceitas para os programas. Em sua maioria, são profissionais das chamadas "ciências duras" --as exatas-- ou médicas.

Para algumas agências, como a norte-americana Nasa (Agência Espacial Norte-Americana), ter um diploma em uma dessas áreas é pré-requisito necessário.

"Muitos dos astronautas são pilotos ou engenheiros, em especial de áreas ligadas à Aeronáutica. Já na medicina, procura-se muito por profissionais que pesquisem saúde humana em órbita e assuntos relacionados", afirma o tecnologista. "É muito comum nos Estados Unidos, por exemplo, cientistas com pesquisas relacionadas ao espaço entrarem para a Nasa."

Os exemplos de astronautas que tinham conhecimento técnico de voo e engenharia são inúmeros: de Neil Armstrong, primeiro homem a pisar na Lua, em 1969, ao ministro Marcos Pontes.

Nascido em Bauru (SP), Pontes entrou para a FAB (Força Aérea Brasileira) aos 18 anos, em 1981. Lá, pilotou 25 tipos diferentes de aeronaves e se especializou em caças.

Quatro anos depois, recebeu o bacharelado em tecnologia aeronáutica pela AFA (Academia da Força Aérea) e, em 1993, tornou-se engenheiro aeronáutico pelo ITA (Instituto Tecnológico Aeronáutico). Ele fez ainda um mestrado em engenharia de sistemas pela Naval Postgraduate School, na Califórnia (EUA).

"Bem antes de se tornar um astronauta, ele já tinha uma formação bem completa. Como o Armstrong, são pessoas capacitadas e interessadas na ciência, é o tipo de pessoa que valem à pena para as agências terem em seu quadro", afirma Kaled.

Também é importante ressaltar que a carreira de astronauta é civil. Embora muitos, como Pontes, tenham formação militar, não é um pré-requisito necessário. O imprescindível, na verdade, é ter inglês fluente em fala, leitura e escrita. 

O astronauta brasileiro Marcos Cesar Pontes acena em momento de preparação para o lançamento da nave Soyuz TMA 8 rumo à Estação Espacial Internacional, em 2006. A chamada "Missão Centenário" marcou a primeira viagem de um brasileiro ao espaço - AFP PHOTO / DENIS SINYAKOV - AFP PHOTO / DENIS SINYAKOV
O astronauta brasileiro Marcos Cesar Pontes acena em momento de preparação para o lançamento da nave Soyuz TMA 8 rumo à Estação Espacial Internacional, em 2006. A chamada "Missão Centenário" marcou a primeira viagem de um brasileiro ao espaço
Imagem: AFP PHOTO / DENIS SINYAKOV

Para além dos estudos

Mas a formação acadêmica é só uma das partes para seguir esta carreira. Saúde e habilidade de lidar com grupos também são muito importantes --e requeridas pelos quadros de formação.

Para se tornar um astronauta profissional, é necessário ter excelente formação acadêmica em ciência e tecnologia, saúde perfeita, ótimo trabalho em equipe e liderança, além de outras competências específicas"

Marcos Pontes

"A carreira de astronauta exige muito do corpo, especialmente, claro, quando você vai para o espaço. Por isso, a saúde é tão importante", afirma Kaled.

De acordo com o tecnologista, também saber lidar com equipe é importante principalmente para conseguir resolver os eventuais problemas que acontecerão. 

Onde fazer o curso

O Brasil não tem uma escola de formação de astronautas. Marcos Pontes ingressou no programa da Nasa em 1998, onde fez o curso de dois anos.

Apesar de ser a mais conhecida e respeitada, a agência norte-americana não é a única a formar estes profissionais. Atualmente, há no mundo outras cinco escolas: Agência Espacial Europeia (ESA), Agência Japonesa de Exploração Aeroespacial (JAXA), Agência Espacial Russa (Roscomos), Agência Espacial Canadense (ASC) e Administração Nacional Espacial Chinesa (CNSA).

Cada uma tem seus pré-requisitos para aceitar os candidatos dos programas. A ESA, por exemplo, só aceita cidadãos europeus e "prefere" pessoas entre 27 e 37 anos e entre 1,53 m e 1,90 m de altura, enquanto a JAXA exige que os candidatos tenham pelo menos três anos de experiência com trabalhos relacionados à ciência ou à indústria da tecnologia.

Já a Nasa, que tem o mais conhecido e procurado programa, exige que os candidatos tenham formação universitária e pós-graduação em cursos voltados para engenharia e ciências.

A agência também requer que as instituições que o candidato cursou sejam "de excelência".

É preciso ficar de olho quando estes programas para o curso de astronautas são abertos, algo que não tem uma periodicidade exata. Neste momento, nenhuma das agências está com programa disponível. As informações sobre cada uma estão disponíveis em seus respectivos sites, em inglês.

Não é só ir ao espaço

Depois de concluído o curso não significa que o profissional é enviado diretamente ao espaço. Na verdade, a maior parte do trabalho de um astronauta é feito em terra firme, em trabalhos de pesquisa e administração.

Pontes, por exemplo, concluiu seu curso em 2000, mas só saiu da Terra em 2006.

"Os astronautas ficam realizando trabalhos de desenvolvimento para estas agências. O foco na viagem espacial se dá mais quando há uma expedição mercada e aí é iniciado um preparo mais intensivo, mas não é todo mundo que vai [ao espaço]", afirma Kaled.

"Não desista do seu sonho", incentiva Pontes. 

Lula recebe o astronauta Marcos Cesar Pontes em cerimônia de boas-vindas em Brasília (DF), em 2006 - Sérgio Lima/Folhapress - Sérgio Lima/Folhapress
Lula recebe o astronauta Marcos Cesar Pontes em cerimônia de boas-vindas em Brasília (DF), em 2006
Imagem: Sérgio Lima/Folhapress

Programa de formação brasileiro

Apesar de ser formado pela Nasa, Marcos Pontes foi ao espaço em 2006 em uma espaçonave russa, a Soyuz TMA-8, em uma parceria entre a AEB e a Roscomos. Este foi o auge do investimento nacional na formação de astronautas.

De lá para cá, infelizmente, o investimento federal na formação de astronautas só diminuiu e atualmente está parado. "Não sabemos quando e se vai retomar, mas a nossa intenção, claro, é que volte", afirma Kaled, que também tem o sonho de se tornar um astronauta. "Quem sabe com Pontes como ministro as coisas não melhoram."

O ministro diz ter a intenção de retomar o trabalho de formação de astronautas, mas também não finca datas. 

Vamos trabalhar forte no nosso programa espacial para recuperar nossa capacidade técnica e científica em cargas úteis, veículos lançadores e centros de lançamento. No momento adequado, poderemos treinar outros astronautas. Certamente, eles cumprirão missões importantes para o Brasil e o planeta"

Marcos Pontes

Atualmente, a AEB tem parceria com a agência espacial chinesa em um programa de produção e lançamento de satélites de mapeamento.