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Desastres aéreos instigam imaginário coletivo e alimentam fobias

Por Fernanda Ezabella, da São Paulo

18/07/2007 19h17

Sempre alarmados com turbulências e ruídos estranhos, brasileiros com medo de voar agora vêem o leque de medos crescer, após o intervalo de apenas 10 meses entre os dois piores desastres aéreos da história do país.

O vôo JJ 3054 da TAM, com 186 pessoas a bordo, chocou-se na terça-feira com prédios na capital paulista após dar um vôo rasante em uma movimentada avenida em frente ao Aeroporto de Congonhas. Em setembro, uma aeronave da Gol que saiu de Manaus bateu com um jato em pleno vôo, matando 154 pessoas no Mato Grosso.

Para especialistas, esses desastres de proporções cinematográficas instigam o imaginário coletivo do brasileiro de forma inédita, intensificando ou criando medos.

Para o piloto aposentado da Força Aérea Luiz Alberto Bohrer, que tem uma empresa de assessoria de segurança de vôo, as pessoas têm medo do desconhecido e, por isso, entram em pânico com turbulências rotineiras e outros barulhos normais durante um vôo.

"Depois de acidentes desses, aqueles que já têm medo ficam aguçados para saber o que aconteceu. E, automaticamente, associam seus próprios fatores de medo com o desastre", disse.

A psicóloga Patricia Kortlandt, que atende pilotos e tripulantes em situação pós-traumática, afirmou que os brasileiros sempre tiveram orgulho do sistema de aviação do país, mas tudo mudou após a grave crise da Varig há alguns anos, seguida pelo acidente de setembro e pelo caos nos aeroportos.

"Nos últimos 10 meses, vários novos fatores de insegurança foram aparecendo ao público", disse Kortlandt, que dá cursos para superação do medo de voar. "Antes era um medo leve, um receio (...) e, depois de setembro, estou sendo procurada por mais pessoas que dependem do avião para negócios."

VOAR, ESPORTE RADICAL

Citando uma pesquisa Ibope de 1998, que afirmava que cerca de 40 por cento dos brasileiros têm medo de voar, a psicóloga pergunta: "Depois disso (novo acidente), para onde vai o nível de estresse do brasileiro?".

A pergunta também inquieta o advogado Márcio Araújo Opromolla, 32 anos. Ele cancelou nesta quarta-feira viagem de avião a Belo Horizonte agendada para a próxima semana, e mudou de Congonhas para Cumbica sua chegada de Salvador em setembro, quando tem um compromisso de trabalho inadiável.

"Fica aquela sensação de 'tá vendo como eu tenho razão de ter medo?' Voar é esporte radical hoje em dia", disse o advogado. "Agora ficou pior, porque minha teoria de chance remota de se repetir um acidente (em curto prazo) foi pro espaço", afirmou.

"Eu fico translúcido, nem branco, de pavor", disse. "Lembro de uma frase do Vinícius (de Moraes): 'mais pesado que o ar e motor movido a explosão não têm como funcionar'."