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Seres humanos são sensíveis à cor verde, mostram pesquisas

Imagem aproximada de um botão de girassol. As primeiras flores surgiram na Terra há 130 milhões de anos, durante o período cretáceo - Amy White and Al Petteway/National Geographic Creative
Imagem aproximada de um botão de girassol. As primeiras flores surgiram na Terra há 130 milhões de anos, durante o período cretáceo Imagem: Amy White and Al Petteway/National Geographic Creative

Natalie Angier

27/04/2015 15h05

De acordo com todas as evidências, a cor favorita de Nero era o verde. O imperador romano se vestia de verde, colecionava esmeraldas, torcia para o time do “estábulo verde” nas corridas de bigas e gostava particularmente de comer alho-poró.

Goethe louvava o verde como o casamento “tranquilizador” entre os opostos cromáticos amarelo e azul. George Washington dizia que o verde era “um agrado para os olhos” e pintou sua sala de jantar Mount Vernon com uma pátina verde brilhante. E não podemos esquecer que o elefante mais querido do mundo, Babar, usava um elegante terno em um “atraente tom de verde”.

Os cientistas também gostam dos charmes da cor verde por uma grande variedade de razões, começando com uma que pode ser mais bem compreendida em uma caminhada por um parque no início da primavera. A clorofila, pigmento que faz com que as plantas sejam verdes, está intimamente conectada à fotossíntese, a fundamental empreitada eletroquímica que não para de deslumbrar os cientistas que a estudam, e que, dizem eles, deveria nos deslumbrar também.

Afinal, a fotossíntese não apenas transforma a luz do sol e a água nos açúcares que comemos, ela gera um resíduo bacana, o oxigênio que respiramos. “Toda comida vem da fotossíntese. Não haveria vida superior na Terra sem ela”, constata Petra Fromme, professora de Química e Bioquímica da Universidade Estadual do Arizona.

Verde, afirma ela, “é a cor da vida”.

Em uma pesquisa nova e surpreendente sobre a evolução das diferentes formas de fotossíntese, os cientistas descobriram que a prezada variedade que faz oxigênio pode ser muito mais antiga do que qualquer um suspeitava, e que o processo que tornou a Terra verde e com atmosfera pode ter começado logo depois que a primeira célula viva apareceu.

Em um relatório recente publicado na Molecular Biology and Evolution, Tanai Cardona, do Imperial College London, e seus colegas compararam sequências genéticas de cerca de 200 espécies de cianobactérias – micróbios que conseguem fazer fotossíntese – com plantas e algas representativas. Os pesquisadores focaram em um gene chave chamado D1, que permite que uma linha de montagem fotossintética tire elétrons da água para usá-los.

A equipe determinou que existem pelo menos cinco variedades de D1 e que algumas delas, diz Cardona, “têm características muito antigas”. Os resultados dão apoio a propostas recentes e reconhecidamente controversas de que a fotossíntese que faz oxigênio começou alguns bilhões de anos antes do que a data já aceita de 2,4 bilhões de anos atrás.

Outros pesquisadores procuram entender melhor, primeiro, por que as plantas são verdes – mais especificamente, por que a clorofila rejeita a maior parte da luz solar que chega à superfície de suas folhas ao invés de absorver e usar tudo, uma abordagem supostamente mais eficiente para conseguir energia, que aconteceria se as plantas fossem pretas.

Por que a clorofila reflete não apenas algumas das porções verdes do espectro solar, e por isso as plantas parecem verdes aos nossos olhos, mas também a maior parte dos abundantes e invisíveis comprimentos de onda das radiações ultravioleta e infravermelha? Alguns pesquisadores estão tentando modificar a clorofila e outros elementos relacionados com a fotossíntese para expandir seu poder de absorção de luz, manipulações que podem ser aplicadas na hora de construir melhores células fotovoltaicas ou criar plantas que crescem mais rapidamente para alimentar um mundo em crescimento acelerado. O desafio, admitem os pesquisadores, é considerável.

“A evolução selecionou todas as propriedades do sistema ao longo de bilhões de anos para que trabalhassem bem”, afirma Robert Blankenship, professor de Biologia e Química que estuda fotossíntese na Universidade Washington, em Saint Louis. “Quando tentamos trapacear, com certeza vamos ter que encarar problemas.”

Blankenship afirma que as plantas não são realmente avessas à radiação solar verde: elas geram outras moléculas de pigmentos que, ao contrário da clorofila, efetivamente absorvem até 90 por cento da luz verde do sol. Mas os 10 por cento que são refletidos, comparados com o quase nada que é refletido da luz azul ou vermelha visíveis, é o que faz nossos olhos perceberem a diferença de cor.

“Somos muito sensíveis na região verde, por isso vemos a pequena quantidade que a planta não absorve”, explica Blankenship.

Os neurocientistas que estudam a visão da cor também se impressionam com a nossa sensibilidade para o verde. “O verde é a parte do espectro mais brilhante para nós. Nosso maquinário visual, nossos fotorreceptores estão otimizados para a parte do meio do espectro, verdes e amarelos”, diz Bevil Conway, professor adjunto do Wellesley College.

Dos três tipos de cones de nossas retinas pelos quais detectamos e interpretamos as cores, diz Conway, dois registram seu pico de sensibilidade para comprimentos de onda de luz verde – talvez o legado de um sistema visual que se desenvolveu em nossos ancestrais marinhos.

“Muito da luz desaparece em água salgada. Mas a luz verde consegue passar por ela muito bem.” Mesmo as pessoas que não têm um dos três tipos de cones fotorreceptores e por isso são daltônicas para verde e vermelho, diz ele, normalmente são sensíveis a sutis gradações de verde.

“Eles foram contratados em várias guerras para encontrar inimigos camuflados”, conta.

Somos sensíveis ao verde, e muitos de nós o amam. Em pesquisas internacionais de cores favoritas, o verde fica normalmente em segundo, perdendo apenas para o azul. Somos atraídos para o verde como um sinal de natureza e abundância, e pesquisas mostraram que a adição de apenas duas árvores e uma faixa de grama em um projeto habitacional dominado pelo concreto pode melhorar a saúde, o humor e o desempenho na escola.

Ao mesmo tempo, geralmente ignoramos o verde como cor de fundo, e os pintores a usam quando querem fazer os objetos sumirem visualmente. O verde não é muito marcante: some rapidamente da memória.

Em um relatório publicado no mês passado no jornal Frontiers in Psychology, Christof Kuhbander da Universidade de Regensburg, na Alemanha, e seus colegas contam que descobriram que quando mostramos a um grupo uma série de desenhos de objetos como cadeiras, carros e roupas pintadas de azul, vermelho, verde e amarelo, as pessoas lembram menos da cor dos objetos verdes.

O verde talvez não seja marcante, mas se tornar verde é complicado. De acordo com Geoffrey Hill, que estuda a coloração dos pássaros na Universidade Auburn, os pesquisadores só determinaram recentemente que os pássaros geralmente fazem penas verdes da mesma maneira que crianças produzem tinta verde: misturando amarelo e azul.

Os pigmentos amarelos são extraídos daquilo que comem ou, no caso dos papagaios, sintetizadas internamente. Essas tintas amarelas são depois adicionadas a penas que estão crescendo e que são estruturadas molecularmente para capturar a luz azul. O resultado: ombros pulverizados de oliva em uma Mariquita do Tenesse ou a barriga verde neon do periquito australiano.

De maneira intrigante, como o historiador Michel Pastoureau, da Sorbonne, diz em sua pesquisa abrangente e maravilhosamente ilustrada, “Vert: Historie d´une Coleur” (“Verde: a História de uma Cor”, em tradução livre), a natureza combinatória e normalmente instável de muitos corantes e tintas da era pré-industrial e sua derivação da mistura de pigmentos amarelos e azuis, pode explicar algumas das associações não muito boas do verde.

Verde era mutável, caprichoso, incontrolável como o destino, tão confiável quanto um duende ou um espírito verde. “A partir do século XVI, as mesas de jogo passaram a ser cobertas com tecido verde, a cor simbolizando a sorte, as apostas, a participação e o dinheiro que seria ganho ou perdido”, escreve Pastoureau.

Depois, os químicos inventaram corantes verdes muito mais estáveis, incluindo a tinta de trióxido de cromo que colocou o verde na palheta nos anos 1860. A tinta verde não pode ser destruída por ácidos, básicos ou outros agentes químicos, não desbota facilmente e é extremamente difícil de falsificar. É o pano de fundo ideal para o rosto dos pais da pátria.