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Vilão dos incêndios nos EUA, capim super-resistente ganha caçadora à altura

Sabia que o capim bromo-vassoura pode ser visto até do espaço? - Ruth Fremson/NYT
Sabia que o capim bromo-vassoura pode ser visto até do espaço? Imagem: Ruth Fremson/NYT

Christopher Solomon

17/10/2015 06h00

O capim bromo-vassoura ("Bromus tectorum") pode concorrer ao título de espécie invasora mais bem-sucedida da América do Norte. A planta vive em todos os Estados norte-americanos e é dominante em, estima-se, quase 400 mil quilômetros quadrados do Oeste. Quando ela se torna verde na primavera, "pode ser vista do espaço", afirmou Bethany Bradley, professora assistente da Universidade de Massachusetts, campus de Amherst, que estuda Biogeografia, a distribuição espacial das espécies.

Os pecados do bromo-vassoura são muitos. Suas sementes resistentes se alojam nos olhos e gengivas do gado (sem falar nas orelhas de bichos de estimação e nas meias das pessoas). Até mesmo uma infestação moderada dele em um trigal pode reduzir a colheita pela metade.

Sua profusão é um dos grandes motivos pelos quais os incêndios no Oeste dos Estados Unidos queimam mais terra, com maior frequência e ferocidade do que no passado, afirmam cientistas. Ao contrário do nativo e bem espaçado capim tussok, o bromo-vassoura cresce praticamente grudado um no outro e depois morre no verão, formando tapetes densos de material inflamável.

Findo o incêndio, o bromo-vassoura viceja enquanto a flora nativa sofre para se recuperar.

Passado mais de meio século de tentativas em grande medida infrutíferas de controlar o avanço do capim, uma pesquisadora pode ter uma nova e poderosa arma contra ele.

Ann Kennedy, especialista em solo do Serviço de Pesquisa Agrícola do Departamento de Agricultura dos EUA, descobriu a ocorrência natural de uma bactéria do solo que impede o crescimento do sistema de raízes profundas da erva, sua vantagem competitiva; plantas nativas não são afetadas.

A caçada de Ann por um matador de bromo-vassoura dura quase 30 anos. Em 1986, ela investigava trigo amarelado na região de Palouse, no estado de Washington, quando encontrou bactérias que pareciam inibir o número de brotos que o trigo liberava no ar, mas não a produção média do trigo; a planta somente produzia grãos mais graúdos. Ela se perguntou se a bactéria poderia ser utilizada para atacar pragas.

Com a ajuda de estudantes de graduação da Universidade Estadual de Washington, onde é professora adjunta, Ann testou 25 mil bactérias coletadas de áreas cultivadas. A meta era achar aquelas que combinassem com as características consideradas ideais, tais como prejudicar o bromo-vassoura e não o trigo. Ela comparou a pesquisa à atitude exigente na hora de encontrar um par na internet.

A pesquisadora enfim selecionou duas cepas de "Pseudomonas fluorescens", espécie gigante de bactérias que está presente em toda a natureza. A maioria de suas cepas executa funções benéficas no ambiente.

Em testes práticos de longo prazo na região Noroeste, incluindo o Monumento Nacional Hanford Reach, no Estado de Washington, a bactéria de Ann reduziu a quantidade de bromo-vassoura em canteiros de teste mais ou menos pela metade em três anos após uma única aplicação.

"Chegaremos a quase nenhuma semente em cinco ou seis anos", disse ela, enquanto outras plantas se recuperaram e crescem mais competitivas. A bactéria também ataca duas outras plantas invasoras, "medusahead" e "goatgrass". As descobertas recentes serão publicadas no próximo ano, explicou a cientista.

Segundo Ann, as bactérias atuam de forma diferente dos herbicidas de ação rápida. Assim que uma solução concentrada é borrifada no solo, gerações sucessivas dos organismos se estabelecem no solo e depois colonizam as raízes do bromo-vassoura.

A principal vantagem do bromo-vassoura está em suas raízes, que podem se aprofundar perto de 80 centímetros. Elas crescem mais tarde no outono e mais cedo na primavera do que as raízes de plantas nativas, monopolizando a água e os nutrientes do solo. A bactéria produz um composto que impede o crescimento normal da raiz, removendo essa vantagem.

Não é questão de se funciona ou não. A dúvida é se podemos pegar o que ela fez em pequena escala e reproduzir em 10 mil, 20 mil, 50 mil ha

Mike Gregg, biólogo da agência dos EUA responsável pela proteção da fauna

As bactérias estão vivas e se não forem aplicadas nas condições certas, "podem morrer", disse Jerry Benson, proprietário e gerente da BFI Native Seeds, de Moses Lake, em Washington, empresa de recuperação de habitat que trabalha em protocolos para aplicar a bactéria.

Uma das cepas de Ann já teve o uso aprovado pela Agência de Proteção Ambiental dos EUA; um produto comercial deve ser lançado no segundo semestre de 2016. Ela tem esperanças ainda maiores na segunda cepa, agora em processo de aprovação.

Interesse é alto porque a necessidade é urgente

No começo do ano, Sally Jewell, secretária do Interior, solicitou uma nova estratégia para atacar os incêndios florestais, estimulados pelo bromo-vassoura, que está torrando grandes porções da paisagem recoberta de artemísia do Oeste. As perdas resultantes de habitat foram um grande motivo para o tetraz-cauda-de-faisão entrar para a lista de espécies ameaçadas; o governo não quis listar a ave no mês passado, citando novos planos de recuperação de agências estaduais e federais.

Ann reconhece que sua descoberta não é uma panaceia. Embora espalhar a bactéria "seja como preparar cerveja", borrifar 40 milhões de hectares do Oeste ficaria proibitivamente caro. Além disso, o bromo-vassoura poderia voltar um dia.

Em vez disso, ela e outras pessoas sugerem um avião-tanque, como os usados para apagar incêndios florestais, tratando quilômetros de fogo com as bactérias, para acabar com a planta e reduzir a disseminação dos incêndios.

Bradley, da Universidade de Massachusetts, campus de Amherst, cujos modelos mostram que o bromo-vassoura poderia avançar pelo norte do Wyoming e leste de Montana por causa da mudança climática, afirma que a bactéria de Ann também pode ajudar a manter o limite.

Questionada se se preocupa com a possibilidade de trocar um problema por outro ao espalhar a bactéria, Ann respondeu: "Ela está nos nossos solos. Apenas não é encontrada na quantidade suficiente para desempenhar a função." Segundo a cientista, a bactéria morre naturalmente após quatro anos.

Ann contou que ela e colegas selecionaram para uso somente as cepas que tinham apenas características benignas, examinando sua inocuidade em mais de 250 tipos de capim, insetos, pássaros e ratos.

A pesquisadora acredita ter encontrado soluções para outros problemas com plantas.

"Realmente, existe uma beleza no solo. É um mundo simplesmente maravilhoso em atividade. É só procurar."