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Os ursos-das-cavernas foram extintos há 25 mil anos, mas o DNA deles continua vivo

Ursos-pardos, como o da foto, carregam DNA do urso-das-cavernas - Lajos Berde via The New York Times
Ursos-pardos, como o da foto, carregam DNA do urso-das-cavernas Imagem: Lajos Berde via The New York Times

Karen Weintraub

31/08/2018 04h01

Há cerca de 25 mil anos na Europa ocidental, o último urso-das-cavernas deu o último suspiro e a espécie foi extinta.

Mas um estudo publicado na segunda-feira (27) em "Nature Ecology & Evolution" mostra que um pouco do DNA do urso-das-cavernas continua vivo nos ursos-pardos modernos, do mesmo modo que os seres humanos carregam um pouco do Neanderthal.

A descoberta desafia nossa visão da extinção, segundo Ludovic Orlando, um professor no Centro de Geogenética do Museu de História Natural da Dinamarca, que participou da pesquisa.

A extinção não implica que o material genético desapareça para sempre

No novo estudo, os pesquisadores inicialmente decidiram saber mais sobre o urso-das-cavernas estudando sua genética. Quase de brincadeira, eles compararam a sequência genética que haviam extraído do urso-das-cavernas com uma sequência existente de um urso-pardo, disse Axel Barlow, o principal autor do estudo e pesquisador de pós-doutorado na Universidade de Potsdam, na Alemanha. Os resultados os surpreenderam.

"Havia um sinal bastante evidente de hibridização entre essas espécies", disse Barlow.

Imaginando que os resultados poderiam ser um erro, a equipe então comparou o genoma do urso-das-cavernas com o de outros sete ursos-pardos, um antigo e seis modernos, e descobriram a mesma mistura genética. Os ursos-das-cavernas contribuíram com pouco menos de 1% a 2,4% do genoma dos ursos-pardos, segundo o estudo.

"Não esperávamos encontrar isso, porque eles são realmente muito diferentes em termos de evolução", disse Barlow.

A equipe também pôde determinar que os genes fluíam nos dois sentidos entre as espécies, com os ursos-das-cavernas carregando parte do DNA dos ursos-pardos. A mais recente transferência de genes veio do urso-das-cavernas para o pardo, revelou o estudo.

Pesquisador segura crânio de um urso-das-cavernas, extinto há 25 mil anos - Andrei Posmoanu via The New York Times - Andrei Posmoanu via The New York Times
Pesquisador segura crânio de um urso-das-cavernas, extinto há 25 mil anos
Imagem: Andrei Posmoanu via The New York Times

Os ursos-pardos são mais estreitamente relacionados aos ursos polares do que eram aos ursos-das-cavernas, dos quais divergiram há mais de um milhão de anos, explicou Barlow. Os ursos-das-cavernas eram principalmente herbívoros, enquanto os ursos-pardos são carnívoros e cerca de 20% menores que os das cavernas, com ossos mais delicados. Um urso-pardo provavelmente pareceria "fraco" ao lado de um urso-das-cavernas, disse ele.

Ambos compartilharam aproximadamente o mesmo território até cerca de 25 mil anos atrás na Europa, disse Barlow. Dois ursos-pardos do Alasca também revelaram a presença de DNA do urso-das-cavernas, sugerindo uma difusão inesperada de genes que precisa ser melhor investigada, disse o professor.

Não está claro por que os ursos-das-cavernas foram extintos, segundo Barlow, embora o momento mais ou menos acompanhe o padrão de migração dos humanos de anatomia moderna da África para a Europa. Os últimos ursos-das-cavernas viveram na Europa ocidental, e, pelo menos, um esqueleto foi encontrado com fragmentos de uma lança feita por humano inserida em suas vértebras.

Também não se sabe se o cruzamento entre espécies de ursos ofereceu alguma vantagem evolucionária aos ursos-pardos, o que Barlow disse que pretende investigar. Nas pessoas, descobriu-se que um gene de outra espécie de hominídeos chamada denisovanos ajudou os tibetanos a se adaptarem às altas altitudes em que vivem.

Pontus Skoglund, do Laboratório de Genômica Antiga do Instituto Francis Crick, disse que de certa forma não causa surpresa que criaturas semelhantes que viviam na mesma geografia tenham se misturado, sobrepondo sua genética. Mas isso obriga os cientistas a mudar sua definição de "espécie" como animais que não se reproduzem entre si, disse ele.

"Isso confronta a ideia de espécies que muitas pessoas têm na biologia e enfatiza que realmente precisamos assumir esses dados empíricos de que o fluxo de genes de fato ocorre", disse Skoglund.

Orlando disse que está interessado em aprender mais sobre os genes que foram preservados e os que podem ter levado à extinção do urso-das-cavernas. "Esses genes do urso-das-cavernas que não são encontrados no urso-pardo (pois incompatíveis) podem se mostrar essenciais para se compreender o processo de especiação", disse ele.

Barlow se perguntou se animais que têm DNA de outras espécies devem ser conservados preferencialmente, porque provavelmente serão mais resistentes, ou se os biólogos devem dar preferência a proteger animais "mais puros", com menor mistura genética. Uma melhor compreensão das espécies que já foram extintas também pode ajudar os conservacionistas a oferecer condições ideais para preservar as espécies ameaçadas de hoje, disse ele.