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Fux devolve "ultimato" a Bolsonaro, mas seu destino depende de Lira e Aras

Luiz Fux, o presidente do STF, lê discurso na sessão de abertura após o 7 de Setembro golpista  - Nelson Jr./STF
Luiz Fux, o presidente do STF, lê discurso na sessão de abertura após o 7 de Setembro golpista Imagem: Nelson Jr./STF

Colunista do UOL

08/09/2021 17h59

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Em seu mais vigoroso pronunciamento desde o início da crise institucional, o presidente do STF, Luiz Fux devolveu o "ultimato" que Bolsonaro vinha dando ao Judiciário nas últimas semanas, e lembrou que o desprezo às decisões judiciais, como o capitão ameaçou fazer em seus discursos golpistas do dia 7, "além de representar atentado à democracia, configura crime de responsabilidade, a ser analisado pelo Congresso Nacional".

Pois é exatamente aí que reside o problema. Pouco antes, Arthur Lira, o presidente da Câmara, a quem caberia abrir o processo contra Bolsonaro, já tinha descartado essa possibilidade. Aliás, nem tocou na palavra impeachment e não citou o nome do presidente do discurso.

Sentado solenemente sobre os mais de 130 pedidos de impeachment de Bolsonaro, Lira se ofereceu para ser o "pacificador" no embate entre Executivo e Judiciário e informou que a Câmara "está aberta a conversas e negociações para serenarmos".

"Arthur Lira vê na crise uma oportunidade.... de negócios", escreveu Bernardo Mello Franco, em sua coluna no Globo. "De negociações ele entende bem".

Perdem seu tempo os líderes e presidentes de partidos que, animados com o discurso de Fux, ainda esperam convencer Arthur Lira a, finalmente, sair de cima dos pedidos. O Centrão velho de guerra ainda espera receber muitas outras emendas secretas, entre vários regalos, como alguns cargos e ministérios.

Fux não percebeu que Augusto Aras tinha pedido para falar também, na reunião virtual do Supremo, desculpou-se, e lhe passou a palavra.

Quem esperava ouvir de Aras alguma grande novidade sobre o veemente discurso do presidente do STF em defesa da democracia e do Judiciário, frustrou-se. Aras pediu a palavra para não dizer absolutamente nada, além de fazer citações de almanaque e oferecer louvores à democracia, ao devido processo legal, etc.

Ficamos assim, então: por mais que investigue e encontre provas contra Bolsonaro nos quatro inquéritos dos quais é relator no STF, o ministro Alexandre de Moraes, alvo da fúria do presidente em seus discursos, terá que mandar primeiro as denúncias para o procurador-geral.

Só então, se Aras estiver de acordo para tocar o processo adiante, será enviado à Câmara, que teria de decidir em plenário, dominado pelo Centrão, sobre a abertura ou não do rito de impeachment.

É tudo um grande jogo de cena, com mil prazos e entraves burocráticos até um processo de impeachment começar a andar no Congresso e chegar finalmente ao Senado para o veredito final.

Se o procurador-geral e o presidente da Câmara forem aliados do presidente da República, como é o caso agora, por mais crimes de responsabilidade de que Bolsonaro seja acusado será muito difícil o processo andar antes do final do seu mandato.

Se depois de todas as delinquências que Bolsonaro já praticou, um verdadeiro passeio pelo Código Penal, com tudo o que a CPI da Pandemia já apurou, fora o que ainda falta investigar no STF e no TSE, nenhum processo foi adiante, porque iria agora?

Com Dilma Rousseff, foi tudo muito rápido porque o presidente da Câmara era o inefável Eduardo Cunha, um inimigo da presidente que queria se vingar do PT, contra quem se elegeu, e o procurador-geral era o implacável Rodrigo Janot.

Tudo depende das pessoas e não dos cargos, e o capitão soube se blindar muito bem, aparelhando todos os órgãos de controle, a começar pela PGR.

Mas no STF ele só tem um voto garantido, o do Kássio com K, enquanto não consegue nomear seu ministro "terrivelmente evangélico". Já estava difícil e agora ficou pior, depois que o capitão resolveu dinamitar todas as pontes no 7 de Setembro golpista em que chamou Alexandre de Moraes de "canalha" e avisou que não vai cumprir suas decisões.

A praça dos Três Poderes agora poderia mudar de nome para "Triângulo das Bermudas", onde os navios com os processos ficam navegando em círculo, até um bater no outro e afundar.

Com impostação de voz digna de um estadista, Luiz Fux ainda fez um apelo: "Povo brasileiro, não caia na tentação das narrativas fáceis e messiânicas que criam falsos inimigos da nação". O nome completo do presidente, que não foi citado, é Jair Messias Bolsonaro.

Agora é tarde. Bolsonaro e seus fanáticos seguidores já decidiram que seus inimigos estão no STF, a única instituição capaz de impor barreiras ao ímpeto golpista de quem se recusa a governar o país e só está preocupado com ele mesmo e a família.

Vida que segue.