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Chico Alves

Professor brasileiro nos EUA denuncia ao FBI ameaça nas redes sociais

29.ago.2019 - O professor do Departamento de Estudos de Mídia da Universidade da Virgínia (EUA), David Nemer, que pesquisa campanhas políticas, fakenews e grupos de WhatsApp - Divulgação/Dan Addison/Universidade da Virgínia
29.ago.2019 - O professor do Departamento de Estudos de Mídia da Universidade da Virgínia (EUA), David Nemer, que pesquisa campanhas políticas, fakenews e grupos de WhatsApp Imagem: Divulgação/Dan Addison/Universidade da Virgínia

Colunista do UOL

16/07/2020 17h57

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Email inválido

Professor da Universidade da Virginia e especialista em Antropologia da Tecnologia, o brasileiro David Nemer volta e meia se vê às voltas com ameaças que recebe por conta de seu trabalho. Ele pesquisa as redes de desinformação no WhatsApp, especialmente os bolsonaristas. Em dezembro do ano passado, teve que sair de São Paulo e voltar às pressas para os Estados Unidos, onde mora, por causa disso. Recebeu um email anônimo recomendando que tivesse "cuidado", junto com uma fotografia sua no parque onde tinha ido dias antes.

Ontem, Nemer foi destinatário de outra mensagem ameaçadora, dessa vez pelo Instagram. "O esquerdista tem família no Brasil, né?", perguntou um usuário, junto a duas fotos de armas. O motivo da intimidação teria sido a entrevista que Nemer deu ao UOL , onde falou que o Twitter é uma plataforma mais equilibrada em comparação ao Parler, rede que é a nova febre entre os conservadores.

Ele registrou BO online na polícia do Espírito Santo e foi a uma agência do FBI denunciar a ameaça.

Nessa entrevista, o professor diz que a intolerância mesmo com comentários banais foi incentivada pelo presidente do Brasil. "Tudo o que vai contra, eles ameaçam. Isso é tudo dentro do ambiente que o próprio Bolsonaro cultiva", acredita.


UOL - Como recebeu a ameaça e qual você acha que foi o motivo?

David Nemer - Recebi ontem a ameaça no Instagram. A pessoa diz: "O esquerdista tem família no Brasil, né?" Aí coloca duas fotos das armas. O que causou a ameaça foi a entrevista que eu dei ao UOL sobre o Parler, em que digo que o Twitter tenta ser mais neutro e tira igualmente conteúdo de desinformação de qualquer corrente ideológica.

A pessoa que ameaçou questiona isso e me manda uma entrevista do Jack Dorsey, CEO do Twitter, em que ele diz que a rede tem um viés mais à esquerda. Eu acredito que ele leu a entrevista e isso o motivou a vir falar comigo.

Lógico, a gente sabe que ele não tem essas armas, porque nem são vendidas no Brasil. Mas se já mandou um recado violento, para pegar uma faca e fazer uma loucura não custa. Fiquei preocupado. Moro nos Estados Unidos, mas tenho família no Brasil.

Além de mim, há três outros amigos, que eu prefiro não falar quem são que estão na linha de frente, escrevem colunas na imprensa, para quem ele também mandou. Em comum, essas pessoas fizeram críticas a Bolsonaro.

Parece que atualmente o ambiente está propício para esse tipo de mensagem agressiva...

Acho que esse é o modus operandi deles, virou uma reação. Tudo o que vai contra, eles ameaçam. Isso é tudo dentro do ambiente que o próprio Bolsonaro cultiva. Desde as eleições ele fala em metralhar petralhas, fala que o erro da ditadura foi não ter matado o Fernando Henrique, que deveria ter matado 30 mil.

Então, ele cria esse ambiente de guerra, de eliminação do oponente. Como ele é um líder moral para muita gente, essa é a moralidade que eles absorvem e agem de acordo. Isso não é surpresa: quem tem o Bolsonaro como ídolo, vai se comportar igual. Esse pessoal que estava reprimido, hoje se vê emponderado para tomar essas atitudes, porque acha justificável. É o gatilho.

Quais as providências que tomou com relação às ameaças?

Fiz o BO online na Polícia Civil do Espírito Santo, minha residência no Brasil e onde está minha família. E fiz aqui, onde o FBI tem uma agência própria para tratar de ameaças virtuais. Mandei também para os americanos a conta do rapaz no Instagram. O próximo passo é mandar a denúncia para a Polícia Federal brasileira, que tem o aparato adequado de tecnologia para fazer essa investigação.

Acha que o inquérito do Supremo Tribunal Federal contra as redes de fake news pode reduzir esse conteúdo tóxico nas redes sociais?

Vejo isso na minha pesquisa. O volume de mensagens de desinformação caiu de 30% a 35% depois das ações policiais do STF. Isso ajuda muito a conter o conteúdo de ódio. As pessoas engajam menos e tem um efeito direto.